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20 novembro 2009

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A VERDADE E A POLÍTICA


Parte 2- Final


Michelle Sanches Barbosa
Advogada; Assistente Técnica da Defensoria Pública-Geral do Estado de SP; Mestranda em Direitos Difusos e Coletivos.

5. Fatos e Verdade




Na realidade que conhecemos, o passado não está aberto à ação, o futuro sim, porém, normalmente podemos perceber que os políticos, ao proclamarem "verdades", acabam por controlar não somente as pessoas, mas também suas possibilidades de ação, de reação, assim como modificação de fatos, controlando desse modo, toda a história, todavia, a mensagem que nos é transmitida é de segurança e proteção, pelo menos em época de propaganda eleitoral.



"Fatos não estão seguros nas mãos do poder". Fatos são inflexíveis, portanto, deveriam ser superiores ao poder, que pode reunir homens com iguais intenções e depois de realizado pode ser abandonado, esta instabilidade faz com que o poder tenha caráter pouco confiável, fazendo com que os fatos e a verdade estejam inseguros nas mãos de homens que buscam constantemente o poder.



Atualmente, recebemos diariamente informações, justificativas pelas atitudes contrárias daqueles que detêm o poder, mas somos pacíficos e pouco questionadores.



Os políticos continuam a iludir com a falsa imagem de segurança e proteção, a sociedade parece ter memória curta, o que torna mais fácil a concretização dos objetivos políticos daqueles que elegemos, nos revoltamos por um instante, depois tudo permanece igual.



As atitudes políticas podem frear o desenvolvimento dos fatos, assim como negá-los, de maneira como se nunca tivessem existido.



"A verdade, posto que imponente e sempre perdedora em um choque frontal com o poder, possui uma força que lhe é própria: o que quer que possam idear aqueles que detêm o poder, eles são incapazes de descobrir ou excogitar um substituto viável para ela".



"A verdade fatual entra em conflito com o político apenas a esse baixíssimo nível dos negócios humanos, exatamente como a verdade filosófica de Platão conflitava com o político ao nível consideravelmente mais elevado da opinião e da concórdia. Dessa perspectiva, continuamos inconscientes do verdadeiro conteúdo da vida política".



6. Liberdade de pensamento



"Spinoza defendia que todo homem era senhor de seus pensamentos, de seus entendimentos e que os cérebros humanos eram muito distintos uns dos outros, assim como as preferências dos homens. Era contra as leis que limitavam o livre pensamento, pois elas acabariam por fazer os homens pensarem uma coisa e dizerem algo diferente".



A idéia política atual parece ter a intenção de transmitir à sociedade proteção e bem-estar, inconscientemente fazendo com que as pessoas acreditem que cada homem não é capaz de zelar por si próprio, como também não é possível que cada um seja senhor de seus pensamentos e de sua vida.



Liberdade e igualdade são transmitidas como realidade, mas na verdade não são reais.



Igualdade entre os homens é relativa, a assertiva "Todos os homens são criados iguais", não é evidente por si mesma. A igualdade pode ser questão de opinião.



Desse modo, a liberdade e verdade de uns pode constituir a manipulação de outros.



Ademais, nos parece que igualdade entre a sociedade e os membros políticos constitui uma utopia, já que todo o demonstrado através das atitudes dos integrantes da seara política, vivemos em mundos distintos, pertencemos a diferentes categorias de pessoas, embora estejamos todos vivendo em uma democracia.



"A liberdade só é possível entre iguais, e as alegrias e recompensas de uma convivência livre são preferíveis aos prazeres duvidosos da detenção do domínio".



Uma convivência livre tem como pressuposto o respeito à liberdade do outro, contrariamente ao domínio que escraviza não somente os atos, mas a mente de outras pessoas.



Talvez, sejamos livres em nossas próprias prisões. A mentira acaba por ser um dado objetivo da realidade humana, assim como a liberdade. Temos a opção de condenar ou aprovar a nós mesmos e aos outros.



Somos livres para mentir ou falar a verdade e, se mentimos diante da liberdade que está à nossa disposição, porque razão condenamos a mentira livre apresentada pelo outro?



A sociedade parece ter se acostumado à violação e não às garantidas.



"As pessoas simplesmente não percebem o sistema de poder que as pune".



É comum que cada cidadão cumpra o papel social para o qual foi designado, mesmo que inconscientemente, diante disso, o Estado e aqueles que têm o poder em suas mãos, possuem a facilidade de controlar as pessoas, já que não precisam exatamente saber quem é quem, mas simplesmente quem está fazendo o quê.



Existe uma crença no comportamento em função do aspecto objetivo do papel social, há uma observação do comportamento, sem uma necessidade real de compreensão da escolha subjetiva, assim o papel social se torna uma espécie de prisão inconsciente, mesmo que o cidadão tenha a liberdade à sua disposição.



Liberdade, verdade e igualdade se completam.



Manipulação, alienação e poder se confundem.



Direito, política e fatos se unem.



Sonho, utopia e mudanças se apresentam.



Homem: criatura capaz de feitos dignos de deuses e de atitudes típicas dos demônios.



Diante de nós está o bem e o mal. Estendamos as mãos para aquilo que desejamos.



"Conceitualmente, podemos chamar de verdade aquilo que não podemos modificar: metaforicamente, ela é o solo sobre o qual nos colocamos de pé e o céu que se estende acima de nós".



7. Conclusão



Ao longo da história da humanidade, inúmeras foram e ainda são as tentativas dos homens de controlarem o seu semelhante. O desejo de poder que a manipulação oferece já corrompeu os ideais de muitas nações, prejudicando milhares de pessoas que tiveram não somente suas vidas modificadas pela manipulação e mentiras, assim como já mudou para pior o destino de sociedades que foram impedidas de acreditarem em si mesmas, em seus pensamentos, sonhos e verdades.



A mentira, ao que tudo indica, continua sendo largamente utilizada como alicerce para aqueles que buscam alcançar seus ideais de poder sem limites, não importando as conseqüências e os estragos que podem ser causados na vida do seu semelhante.



Em muitos setores, a falta de interesse no conhecimento contribui para que os homens se tornem um alvo fácil da manipulação daqueles que perceberam a ignorância dos menos favorecidos, assim como a falta de consciência de que mesmo constituindo uma parcela considerada menos abastada, ainda assim são detentores de força e poder.



Desse modo, faz-se necessário que o homem seja o seu principal instrumento de poder, a fim de administrar a própria existência, não entregando sua verdade, sua liberdade e seus pensamentos nas mãos de outrem.



O homem deve caminhar rumo à sua evolução, buscando constantemente aprimorar a si mesmo, com leituras, pesquisas, estudos, descobertas, participações em diversos segmentos da sociedade e acreditando naquilo que tem de melhor dentro de si.



A sabedoria adquirida por um homem constitui um bem intangível, que ninguém pode furtar. E somente assim, o caminho rumo à solidificação de sua verdade será possível. Quando um homem acredita em seu poder, não há quem o detenha. E quando uma sociedade consegue pautar-se pela segurança que cada um adquire em si mesmo, não há quem a controle.



Bibliografia



ARENDT, Hannah. A Dignidade da Política – Ensaios e Conferências. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993.
_____. Entre o Passado e o Futuro, 5ª. ed. São Paulo: Perspectiva, 2001.

_____. Crises da República. São Paulo: Perspectiva, 2006.

CHOMSKY, Noam. Segredos, Mentiras e Democracia. Brasília: Universidade de Brasília, 1999.

NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Manual de Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva. 2004.




Extraído de Newsletter Magister 985

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