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03 novembro 2009

ABORDAGEM FREUDIANA COMO FERRAMENTA PARA CLASSIFICAÇÃO DO DANO MORAL


Parte 1/2

Eduardo Cesar Elias de Amorim

-Advogado; Especializado em Direito Empresarial pela USJT; Pós-graduando em Economia Urbana e Gestão Pública – pela PUC-SP; Professor em Técnicas de Redação e Mercado de Trabalho

1. introdução

Neste pequeno relato, pretendemos tratar dos conceitos de dano moral em suas esferas objetiva e subjetiva a partir da comparação com critérios e conceitos da psicanálise que vemos autorizada ante ao tema, vez que na sua grande maioria das demandas judiciais que ensejam pedidos de indenizações por danos morais causados por terceiros.

2. Objetivo

Trazer à tona diferenciação entre o chamado mero aborrecimento, muito difundido entre doutrinadores e magistrados que tem neste instituto o princípio basilar para decidir se o acontecimento trazido à juízo teve o condão de lesar moralmente o indivíduo ou trouxe a este apenas um dissabor passageiro ou uma frustração de meras expectativas relacionadas a fatos do quotidiano do homem médio.

Objetivo principal, ainda mais que o acima exposto, fui buscar o conceito Freudiano que divide a psique do ser em pelo menos dois hemisférios muito tênues, mas que são sensivelmente diferenciados pela sua própria natureza, falamos do Ego e do Id. Duas essências do pensamento humano que divergem em tese e em comportamento, pois tratam-se de superficialidades versus sentimentos intrínsecos e que analisados do ponto de vista jurídico que compõe qualquer esfera do relacionamento humano, pode demonstrar até que ponto uma lesão de direito pode ter afetado o ser em sua profundidade ou a modo raso a meio de merecer ou não ser indenizado pelo dano efetivo.


3. História e evolução

Pontes de Miranda conceitua a expressão dano moral de modo muito prático ao estabelecer que "A expressão dano moral tem concorrido para graves confusões, bem como a expressão alemã Schmerzengeld (dinheiro de dor). Às vezes, os escritores e juízes empregam a expressão dano moral em sentido amplíssimo (dano à normalidade da vida de relação, dano moral estrito, que é o dano à reputação, dano que não é qualquer dos anteriores mas também não ofende o patrimônio, como o de dor sofrida, o de destruição de bem sem qualquer valor patrimonial ou de valor patrimonial ínfimo). Aí, dano moral seria dano não patrimonial. Outros tem como dano moral o dano à normalidade da vida de relação, o dano que faz baixar o moral da pessoa, e o dano à reputação. Finalmente, há o senso estrito de dano moral: o dano à reputação"(1)

Gostaria que tal respeitosa definição realmente abrangesse todas as dimensões que o conceito de dano moral precisa para se perpetuar e integrar o ordenamento jurídico nacional como fonte de real justiça e não de enriquecimento ilícito como ocorrera no passado recente, nem como ato de "desvaloração" (2) da moral humana como temos visto nos tribunais e decisórios brasileiros.

No início, tínhamos a indústria do dano moral, onde qualquer dor era levada a apreciação do judiciário como fonte de renda fácil e possíveis acordos mirabolantes, normalmente intentados contra pessoas jurídicas que não desejavam ver seus nomes e marcas de valor associadas a políticas de descaso ou lesão da esfera moral, quer fosse em relação a clientes consumidores, quer fosse em relação a terceiros do meio social e econômico em que estivessem inseridos.

Foi um período certamente difícil, mormente aos magistrados que se viam tentados a não utilizar a figura indenizatória como máquina de fazer dinheiro para beneficiar partes que se movimentavam por interesses escusos e patrimonialistas valendo-se do judiciário para enriquecer, ante vítimas reais que ali buscavam a verdadeira reparação da lesão moral evidenciada com o intuito de ver amenizada a dor causada por seus algozes.

Em seguida, como em todo ciclo social, pudemos observar a retração da Justiça, mostrando-se temerosa em conceder aos lesados gordas indenizações que certamente iriam fazer com que aquele que provocara a lesão, no dito popular, pensasse duas vezes antes de repetir a conduta. Política esta, vista também pouco eficiente, pois ao invés do imaginado, veio a abarrotar o terceiro poder de ações demandadas quase que aleatoriamente, através da liberdade concedida pela via indireta da AJG -Assistência judiciária gratuita que quando mal usada, facilita o exercício da aventura jurídica.

Atualmente o que vemos é a busca incessante de encontrar um mecanismo judicial para contendo as demandas despojadas de realidade subjetiva e aquelas nas quais o dano moral, a ofensa real deixe de ser reparada, possamos utilizar todos nós operadores do direito comprometidos com a própria Justiça, do binômio - reparação e desincentivo - para que além de reparar o dano causado, o causador abstenha-se de repetir o feito, ao tempo em que o lesionado reparado, sinta o calor da justiça corando sua face.

4. Breve comparativo

Em todo o mundo e desde o direito romano, a moral do ser é protegida de acordo com os costumes, ao início, dando espaço maior para interpretações de líderes e poderosos que a cada tempo atribuíam um valor à lesão da subjetividade do homem e de seus princípios de acordo com critérios pouco democráticos, vinculando o "ter" e afastando da Justiça e após muito tempo buscando a reaproximação que defendemos. Alguns ordenamentos jurídicos mais avançados já comportam facilmente medidas de contenção da violação moral do ser humano, quer seja como cidadão, como integrante social e agente integrador da sociedade, ou até mesmo quando seus instintos mais íntimos são alvejados.

Nos ordenamentos jurídicos mais avançados podemos encontrar legislações aprimoradas a cada critério donde compilamos trecho de comparação de Cristiano Carrilho:

No direito Chileno

O Código Civil chileno, em seu artigo 2.314 permite amplamente a reparação dos danos morais. No que pertine às imputações injuriosas, como a honra e o crédito de uma pessoa, a reparação somente caberia se ficasse suficientemente provado o dano emergente (CARMO,1996:300). A Constituição chilena (Decreto n. 1.345, de 08/10/81) em seu artigo 19 assegurou a honra como um verdadeiro direito subjetivo, ao dispor que: "La Constituición assegura a todas las personas: (...) 4º El respeto y protección a la vida provada y pública y a la honra de la persona y de sua família."

No direito Espanhol

O Código Civil Espanhol de 1890, devido ao seu laconismo, consagrava a irreparabilidade do dano moral. A partir de 1912 os espanhóis inclinaram-se à reparabilidade. Reprisando o art. 1.382 do Código Civil Francês, a legislação espanhola assim dispõe em seu Código Civil de 1890: "El que por accion causa daño a outro, interveniendo culpa o negligencia, está obligado a reparar el daño causado." A partir de 1912 os espanhóis passaram a agasalhar o entendimento da reparabilidade do dano moral, muito embora a Suprema Corte de Justiça, em precedente jurisprudencial memorável, não tenha se apoiado na interpretação do artigo 1.902 do Código Civil, tendo antes se decidido por eqüidade, abeberando-se nas vetustas Partidas para dar suporte jurídico ao entendimento jurisprudencial.(Gubern apud Carmo, 1996:300)

No direito Inglês

Conforme analisado por Eduardo Gabriel Saad (1997:702), na Inglaterra, o critério legal (exemplary damages) de indenização de danos morais tem grande abrangência, pois, alcança até aqueles de somenos importância, o que denota exemplar respeito pelos atributos da pessoa humana. De salientar-se, porém, que, no Direito Inglês, o dano de caráter patrimonial é o pressuposto do dano moral. Sem aquele, este não se configura.

No direito Libanês

O Código do Líbano, de 1932, traz expressivas disposições nos artigos 134, 2ª parte e 136: "Art. 134, 2ª parte. Le dommage moral entre en ligne de compte aussi bien que le dommage matériel." "Art. 136. En pricipe, la réparation revêt une forme pecuniaire; elle este allouée en dommages - intérêts mais il appartiente au juge de lui donner une forme plus aproprié aut intérêts de la victime; elle intervient alors en nature; elle peut consister notamment dans insertions par la voie de la presse."

São apenas ilustrativas, pois em maioria, o Dano Moral é protegido e sua reparação exigível e lembrando que a este trabalho nos inferimos apenas a trazer linhas da psicanálise para servir de instrumento capaz de alinhar o decisório judicial ao caso concreto.

Extraído de: Unique Asses. Jurídica Desportiva, 23 de Outubro de 2009, por JusBrasil, de onde foi retirado pelo blog.

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