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12 setembro 2014

ANIMAL EM AUTO-ATENDIMENTO BANCÁRIO E DANOS MORAIS















O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.


Hoje a questão versa sobre auto-atendimento bancário, nos termos abaixo:





RECURSO INOMINADO Nº 7.193/05

ACÓRDÃO



EMENTA: RECURSO INOMINADO. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESENÇA DE ANIMAL DENTRO DE INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. DESCABIMENTO.



1.-CLIENTE QUE INGRESSOU COM CACHORRO NO SERVIÇO DE AUTO-ATENDIMENTO ANEXO À AGÊNCIA BANCÁRIA SENDO INSTADA A RETIRAR O ANIMAL POR FUNCIONÁRIO DO BANCO, DE FORMA POLIDA E A PEDIDO DE OUTRO CLIENTE, NÃO PODE POR ISSO, PLEITEAR INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

2.-A ALEGAÇÃO DE SUPOSTAS AGRESSÕES VERBAIS QUE TERIAM SIDO PRATICADAS POR OUTRO CLIENTE INCOMODADO COM A PRESENÇA DO CÃO EM NADA VINCULA O BANCO, SOBREMODO QUANDO NÃO COMPROVADAS – ART. 333, I, CPC.

3.-O INGRESSO E PERMANÊNCIA DE CÃES EM ESTABELECIMENTOS COLETIVOS PÚBLICOS OU PRIVADOS APENAS JUSTIFICA-SE NO CASO DE CÃO-GUIA NO AUXÍLIO DE DEFICIENTES VISUAIS, NOS TERMOS DA LEI 11.126/2005.

4.-MERO DISSABOR NÃO CONFIGURA DANOS MORAIS INDENIZÁVEIS, MORMENTE QUANDO PROVOCADO PELA PRÓPRIA AUTORA.

5.- RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.



RELATÓRIO



A autora, compareceu, pessoalmente, ao 2º Juizado Especial Cível de Vitória onde alegou que no dia 16/12/2004 se dirigiu até a agência do Banco do Brasil, juntamente com seu cachorro, visando fazer um depósito no posto de auto-atendimento, contudo, percebeu que outro cliente do banco estava incomodado com a presença do animal, razão pela qual reclamou com o funcionário e, posteriormente, com o gerente da agência bancária. Asseverou, ainda, que o gerente pediu para que a requerente saísse junto com seu cachorro do posto de auto-atendimento, bem como afirma que foi agredida verbalmente pelo cliente que sentiu-se incomodado com a presença do cachorro. Por tais motivos, pleiteou indenização por danos morais correspondente a R$ 5.200,00.

A r. sentença de fls. julgou improcedente o pedido autoral.

Inconformada, a autora-recorrente interpôs recurso inominado, afirmando a existência de procedimento constrangedor do banco no trato com clientes portando pequenos animais, bem como a responsabilidade civil do fornecedor do serviço bancário. Desse modo, requereu seja reformada totalmente a sentença, acolhendo as razões de mérito trazidas para que seja julgado procedente os danos morais pleiteados no valor de 20 salários mínimos, bem como honorários advocatícios, consoante as razões acima aduzidas, com a aplicação do ônus da sucumbência e conseqüente condenação do recorrido às custas e demais gravames legais, por ser de direito e de justiça.

O recorrido apresentou contra-razões a fls., pugnando seja negado provimento ao apelo, mantendo-se incólume a r. sentença “a quo”, por medida de direito e da mais lídima justiça.



É o relatório.




V O T O




Considerando presentes os pressupostos de admissibilidade, sobremodo diante da certidão de fls., conheço do recurso.



Analisando os autos, elementos e documentos acostados, verifica-se que a recorrente esteve no setor de auto-atendimento da agência bancária do recorrido, na companhia do seu cachorro; porém, após uma reclamação feita por outro cliente incomodado com a presença do animal, alegou ter sofrido constrangimentos com a situação causada.




O banco-recorrido afirmou a inexistência da prática de qualquer ato ilícito por parte de seus funcionários, vez que apenas solicitaram que a autora retirasse o seu animal da agência bancária, ante o incômodo demonstrado por outro cliente. Esclareceu, ainda, por intermédio de sua patrona na assentada de fls. que é permitida a entrada de pessoas com animais de pequeno porte no auto-atendimento da instituição financeira desde que não haja reclamação por outro cliente do banco. Quando isso ocorre, um funcionário do banco solicita que a pessoa que esteja com seu animal o deixe de lado de fora.




A conduta adotada pela instituição financeira, portanto, deu-se no exercício regular de direito, não gerando indenização por dano moral, eis que seus funcionários tão somente tomaram as medidas cabíveis para minorar os efeitos da ocorrência provocada pela própria autora, que passou a discutir com o cliente que reclamou da inconveniência de sua presença em companhia do cachorro.



Ademais, a autora-recorrente não comprovou as agressões verbais sofridas, muito menos que tivessem sido praticadas pelos funcionários do banco. Dessa forma, não se desincumbiu de comprovar suas alegações, como era sua obrigação processual, consoante exige o CPC:




Art. 333: O ônus da prova incumbe:



I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito.




Logo, resta incomprovada qualquer configuração de nexo causal entre as alegações de supostas agressões verbais e a conduta do banco recorrido. Os fatos narrados nos autos revelam contornos de mero dissabor vivenciados pela autora em decorrência das relações cotidianas da vida em sociedade e de sua falta de bom senso.
A versão apresentada no recurso de afronta ao Código de Defesa do Consumidor pelo banco não se coaduna com o pleito inicial nem com as provas contidas nos autos.


De conseguinte, a proprietária do animal não agiu corretamente ao levar seu cachorro à agência bancária. Tal fato só se justificaria se fosse um cão guia, no auxílio a uma pessoa portadora de deficiência visual (cegueira ou baixa visão).
Isso porque o cão guia é o único animal que possui passaporte legal para ingressar e permanecer nos veículos e estabelecimentos públicos e privados de uso coletivo, de acordo com a LEI Nº 11.126, DE 27 DE JUNHO DE 2005. (Art. 1o É assegurado à pessoa portadora de deficiência visual usuária de cão-guia o direito de ingressar e permanecer com o animal nos veículos e nos estabelecimentos públicos e privados de uso coletivo, desde que observadas as condições impostas por esta Lei).

Entretanto, esse não é o caso dos autos.
Nesse contexto, pois, correta a sentença que não acolheu o pedido de dano moral constante da peça inicial, vez que totalmente descabido.
Por todo o exposto, nego provimento ao recurso, mantendo íntegra a r. sentença recorrida, condenando a recorrente no pagamento das custas processuais, bem como honorários advocatícios no importe de 15% sobre o valor atribuído à causa, nos termos do art. 55 da LJE.



É como voto.