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18 agosto 2009

ADVOCACIA APÓS A REFORMA DO CPC - HONORÁRIOS


O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA ADVOCACIA APÓS A REFORMA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL:
A VALORIZAÇÃO DO CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS* - Parte 1

Rodrigo Afonso Machado

Advogado em São Paulo; Pós-Graduando, Lato Sensu, em Direito Processual pela UNISUL/LFG.

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 O Contrato de Prestação de Serviços Advocatícios; 2.1 Elementos do Contrato de Prestação de Serviços e Honorários Advocatícios; 3 A Reforma do Código de Processo Civil; 3.1 O Fim do Processo Autônomo de Execução e a Questão das Intimações para a Prática de Atos Processuais; 4 Novas Cláusulas Contratuais Face às Novas Disposições do CPC; 5 Conclusão; 6 Bibliografia.

1 Introdução

As constantes transformações, as quais a sociedade contemporânea tem presenciado, produzem reflexos nos mais diversos segmentos, em especial quanto às normas cogentes que regulam os atos e fatos jurídicos. No que tange às regras que disciplinam o Processo Civil brasileiro, destaca-se a ocorrência de recentes alterações legislativas que visaram sobretudo à atualização do CPC em face da atual realidade vivenciada pelas empresas, profissionais liberais e demais pessoas na celebração dos atos e negócios jurídicos. Por meio da publicação de leis esparsas, o legislador introduziu, na sistemática processual civil, importantes alterações na forma de execução de títulos judiciais (sentenças, acórdãos) e extrajudiciais (contratos, títulos de crédito), entre outras, tendo em vista otimizar o procedimento de cobrança de dívidas dos devedores e, principalmente, tornar efetiva a tutela jurisdicional prestada pelo Estado, satisfazendo o interesse do credor de receber seu crédito.

Por outro lado, foram introduzidos novos procedimentos e atribuições a serem observados e seguidos pelos membros do Poder Judiciário e demais operadores do direito, sobremaneira os advogados, cuja implementação tem sido objeto de profundas discussões e questionamentos, haja vista as implicações no âmbito da responsabilidade profissional dos patronos constituídos, decorrentes da própria realização dos serviços contratados pelos clientes.

O presente trabalho tem por finalidade abordar a reforma no Direito Processual Civil, realizada pelo legislador, sob a ótica dos efeitos provocados ao exercício profissional da advocacia e à contratação do advogado para a defesa dos interesses do credor ou do devedor nos procedimentos de execução, a partir da análise dos requisitos e elementos necessários para a celebração de contrato de prestação de serviços e honorários advocatícios.

2 O Contrato de Prestação de Serviços Advocatícios

Segundo a doutrina pátria, contrato é "acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial" (1). É um negócio jurídico com previsão legal (arts. 104 e ss. do CC/02) que provoca efeitos e comportamentos entre as partes e no próprio meio social, podendo ser revestido ou não de elementos essenciais.

A relação jurídica surgida entre o advogado e o cliente que lhe procura é de natureza contratual e revela-se de dois modos distintos: por um lado consubstancia-se pela elaboração do contrato de mandato, pelo qual o cliente outorga ao advogado os poderes necessários para atuar na lide, constituindo-lhe como seu defensor. Instrumentaliza-se pela procuração outorgada pelo cliente, com cláusula ad judicia. Além disso, há a celebração do contrato de prestação de serviços advocatícios e honorários profissionais, no qual o advogado (contratado) compromete-se a prestar os serviços de natureza advocatícia e o cliente (contratante) compromete-se a pagar ao profissional certo valor, a título de honorários advocatícios.

A outorga e a confecção do instrumento do mandato são procedimentos necessários para que o advogado possa comprovar os poderes que lhe foram conferidos pelo mandatário e, assim, desenvolver sua atividade profissional. Já o contrato de honorários é instrumento que formaliza a contratação dos serviços advocatícios pelo cliente, sendo, portanto, necessário para o estabelecimento dos parâmetros que regerão a relação jurídico-contratual.

O contrato de prestação de serviços advocatícios é regido principalmente pelo CC/02 e pelo Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906/94). Assemelha-se ao contrato de prestação de serviços previsto nos arts. 593 e seguintes do CC/02, contudo, possui características próprias que o distinguem daquele. Assim, é um contrato bilateral, por gerar deveres para ambos os contraentes, oneroso, haja vista as vantagens originadas para ambos, advogado e cliente, consensual, pois se aperfeiçoa pelo simples acordo entre as partes, e não solene, uma vez que a lei não prevê forma especial para tal espécie de contrato.

Todavia, o contrato de prestação de serviços advocatícios distingue-se pela finalidade a que se destina, por se tratar de obrigação de meio assumida pelo advogado por ocasião da celebração contratual. "Diz-se que a obrigação é de meio quando o devedor promete empregar seus conhecimentos, meios e técnicas para a obtenção de determinado resultado, sem, no entanto, responsabilizar-se por ele". (2)

O advogado não pode prometer ao cliente sucesso na demanda que patrocina, uma vez que não detém o poder decisório sobre a causa, tão-somente o poder postulatório, que lhe permite provocar e apresentar ao Poder Judiciário teses jurídicas fundamentadas, com o intuito de convencer os julgadores pelos argumentos apresentados. Desse modo, ainda que não obtenha êxito na lide, se atuar corretamente e com a diligência habitual que se lhe espera, terá direito ao recebimento dos honorários contratados ou exigir-lhe o pagamento dos mesmos.

Além disso, o contrato de prestação de serviços advocatícios é considerado título executivo extrajudicial e constitui-se em crédito privilegiado nas hipóteses de falência, recuperação judicial e extrajudicial, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial como dispõe o art. 24 da Lei nº 8.906/94. É que os honorários advocatícios têm natureza alimentar e, por isso, não podem ser preteridos em relação aos demais créditos concorrentes (3). Ademais, o advogado pode fazer juntar aos autos o contrato de honorários celebrado com o cliente, devendo o juiz da causa determinar que lhe sejam pagos os honorários diretamente, para dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou (art. 22, § 4º, da Lei nº 8.906/94). Por fim, há um prazo prescricional de 5 (cinco) anos para o ajuizamento da ação de cobrança de honorários pelo advogado, contados do vencimento do contrato, se houver, do trânsito em julgado da decisão que os fixar, da ultimação do serviço extrajudicial, da desistência ou transação na lide, da renúncia ou revogação do mandato, tal como previsto no art. 25 e alíneas do Estatuto da OAB.

2.1 Elementos do Contrato de Prestação de Serviços e Honorários Advocatícios

Constituem-se elementos essenciais do contrato de prestação de serviços e honorários advocatícios:

a) Sujeitos: os contratantes podem ser pessoas físicas, desde que capazes, ou jurídicas, devidamente representadas pelos seus sócios e/ou administradores. Devem figurar como contratantes todos aqueles aos quais o advogado prestará seus serviços profissionais, de acordo com a extensão do direito a ser defendido ou postulado. Assim, se a lide versar sobre direitos reais e o proprietário for casado pelo regime da comunhão de bens, importante que ambos os cônjuges celebrem o contrato de honorários, uma vez que o instrumento de procuração também deverá ser outorgado pelo casal ao patrono da causa.
Os contratados poderão ser um ou mais advogados, ou mesmo a sociedade de advogados, desde que a procuração seja outorgada individualmente aos advogados e indicar a sociedade de que façam parte. É a norma contida no art. 15, § 3º, do Estatuto da OAB. No caso da contratação de dois ou mais advogados, todos assumirão iguais obrigações e poderes, salvo disposição em contrário.

b) Objeto: o objeto do contrato de prestação de serviços advocatícios é uma obrigação de fazer, constante no ingresso de medida judicial ou extrajudicial cabível pelo advogado constituído para defesas dos interesses do cliente. A obrigação pode consistir também na elaboração de parecer jurídico ou minuta de instrumento particular de negócio jurídico, como um contrato de compra e venda, por exemplo. Como já salientado acima, a obrigação assumida pelo advogado é de meio, não se comprometendo o patrono pelo êxito na demanda. Segundo Lourenço Prunes, o objeto deve informar também a natureza e extensão dos serviços prestados, ou seja, "se abrangem todo o ciclo judicial ou não, se alcançam ou não a área recursal (podem se limitar a serviços em segunda instância ou em instância extraordinária)". (4)

c) Preço: são os honorários cobrados pelo advogado. É indispensável que o contrato de serviços advocatícios contenha cláusula estabelecendo o valor, a forma e o meio de pagamento dos honorários contratados, ainda que se trate de advocacia pro Bono.(5). Desse modo, o valor dos honorários pode ser contratado de forma fixa, balizando-se pelos parâmetros fixados na tabela de honorários fixada pela OAB, ou pode ser fixado um percentual, geralmente de 20% (vinte por cento), incidente sobre o valor da condenação ou sobre o que advier do cliente. É possível, ainda, o estabelecimento de cláusula mista, que preveja estas duas espécies de fixação de honorários. (6)

Importante frisar que os honorários de sucumbência, isto é, aqueles fixados pelo julgador por ocasião de prolação de sentença ou acórdão, pertencem ao advogado, por força do art. 23 do Estatuto da Advocacia e da OAB, e não se confundem com os honorários contratados entre cliente e advogado. Assim mesmo, é aconselhável que haja cláusula expressa dispondo sobre a verba sucumbencial.

A forma de pagamento dos honorários pode ser livremente estabelecida entre advogado e cliente, mas o § 3º do art. 22 dispõe que "salvo estipulação em contrário, um terço dos honorários é devido no início do serviço, outro terço até a decisão de primeira instância e o restante no final".

d) Despesas processuais: faz-se necessária a presença de cláusula contratual que determine qual parte arcará com as despesas relacionadas ao serviço contratado, como custas processuais, preparo, cópias de documentos, envio de correspondências e demais gastos de natureza diversa da verba honorária. Na maior parte dos casos, estabelece-se que o contratante arcará com todas as despesas processuais, devendo repassar ao advogado todos os valores solicitados e reembolsando o contratado pelos gastos que porventura possa ter realizado em razão da urgência.

e) Foro: geralmente o foro estabelecido para se dirimir eventuais questões relacionadas ao contrato de prestação de serviços advocatícios é o do domicílio profissional do advogado, não se aplicando, neste caso, as disposições previstas no CDC. (7)

Em suma, estes são os elementos principais que devem constar de todo contrato de prestação de serviços advocatícios, sem prejuízo de outras disposições convencionadas entre os contratantes, desde que lícitas ou não defesas em lei.

Entretanto, com o advento das leis que reformaram o CPC e as alterações realizadas em dispositivos que se referem diretamente à relação contratual entre advogado e cliente, surgiu a necessidade de previsão de certas cláusulas contratuais que, embora não se refiram à essência do contrato de honorários, têm ganhado relevância, a ponto de tornarem-se imprescindíveis, sobretudo, para fins de proteção do advogado frente às suas responsabilidades profissionais.

Notas do autor:

1. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, v. 3, p. 24.
2. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro: teoria geral das obrigações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 2, p. 174.
3. Nas palavras de Carlos Roberto Faleiros Diniz, "as três espécies de honorários advocatícios que existem - contratuais, de sucumbência e arbitrados pelo juiz -, conquanto não sejam considerados salário propriamente dito, apresentam-se como verba de natureza salarial, na medida em que representam a principal forma de remuneração do advogado" (Vivência jurídica contemporânea. Franca: Lemos e Cruz, 2006, p. 86).
4. Honorários de advogado. São Paulo: Sugestões Literárias, 1975, p. 19.
5. Segundo Carlos Roberto Faleiros Diniz (A subsecção da OAB e a advocacia. 2. ed. rev. amp. e atual. Ribeirão Preto: Nacional de Direito, 2006), "também se diferencia a Advocacia Pro Bono da Assistência Judiciária e Advocacia Popular. Aquela consiste na prestação de serviços de advocacia pelos escritórios de maneira solidária - e isso encerra a gratuidade do serviço - a pequenos grupos e movimentos populares. Assim, a Advocacia Pro Bono está ligada à benemerência, à solidariedade e à prestação de serviços aos mais necessitados, sem qualquer contraprestação" (p. 159). Esclarece, ainda, que a Advocacia Pro Bono "lida apenas com o terceiro setor, e seu exercício está ligado aos fins sociais da Advocacia e ao ideal maior de Justiça" (p. 159).
6. No exercício da advocacia, pode ocorrer também a prestação dos serviços profissionais através da chamada Advocacia de Partido, pela qual o advogado serve a uma empresa, firma ou entidade privada, possuindo liberdade e independência muito relativas, confundindo-se, por vezes, com um verdadeiro empregado. O advogado de partido recebe um salário certo ou variável pelos encargos que habitualmente cumpre.
7. Nesse sentido, importante destacar o voto proferido pela então Conselheira Federal da OAB, na Consulta 1/04, na qual deixa claro que "entre advogado e cliente não se estabelece uma relação de consumo, seja porque a advocacia constitui-se em um múnus público, disciplinada por lei especial, seja porque, em última análise, não encontramos nela os elementos subjetivos e objetivos capazes de inseri-la no mercado de consumo". Assim também já decidiu o STJ, como se depreende do acórdão proferido no REsp 532.377-5/RJ.

*Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil nº 23 - Março/Abr de 2008 e reproduzido no CD Magister n. 27 - Jun/Jul de 2009, de onde foi extraído.

Um comentário:

PEDRO PINTO ADVOGADO disse...

MUITO BOM O ARTIGO PUBLICADO. PARABENS PELO TRABALHO QUE DEVERÁ SERVIR DE ESCLARECIMENTO PARA MUITOS QUE MILITAM NA JUSTIÇA.