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26 outubro 2009

MENINO ALEMÃO VAI SER RESTITUÍDO AO PAI - CONFIRMA O TRF-5 – CAP. 2


Foto meramente ilustrativa

Veja como relatou os autos o ilustre desembargador-relator da Terceira Turma do TRF-5, que decidiu pela restituição do menino alemão J. Küstel ao seu país de origem:

RELATÓRIO

O SR. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA (RELATOR):


Cuida-se de apelações (três) interpostas contra sentença que, em ação de busca e apreensão1, apreciou os pedidos postos às fls. 25 e 26, consubstanciados na “busca, apreensão e restituição do menor João Lukas Konrad Kübel, para que, com as cautelas necessárias (acompanhamento psicológico e do pai ou de parente próximo) seja entregue à Autoridade Central brasileira e, ato contínuo, à Autoridade Central estrangeira, para fins de restituição ao Estado alemão, tudo conforme prevê a Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças”.

A causa, em resumo: defende-se que a criança mencionada, nascida em 11 de março de 2004, na cidade de Würzburg, Alemanha, era domiciliada, junto com pai e mãe, naquela edilidade germânica; teria vindo de férias para o Brasil com sua genitora (período de 02 de junho de 2007 e 1º de julho de 2007), contando – somente até aí – com a autorização do genitor; sucedeu, então, que, como não retornaram no momento ajustado, este, por insistência feita por intermédio de reiterados contatos telefônicos, teria obtido informações de que o regresso fora postergado; porque infrutíferas, assim, as tentativas virtuais de instá-la (à mãe) a voltar (junto com o seu filho), o pai teria vindo ao país pessoalmente, vez em que marcou a volta, agora do trio, para a data de 29 de agosto de 2007; nada obstante tudo isso, teria sido informado horas antes do embarque (segundo diz) que Camila (a mãe) decidira permanecer no Brasil com a criança, e de maneira definitiva, donde todo o imbróglio consubstanciado nestes autos2.


A inicial3 narra, ainda (fls. 04), que houve uma ação de guarda manejada na Justiça Estadual de Pernambuco4, a qual, no fim de contas, teria sido extinta sem resolução do mérito, mormente em face do reconhecimento de que a lide deveria ser resolvida perante a justiça alemã, dada a incidência, que se entendeu presente e inevitável, das disposições encartadas na já tantas vezes referida Convenção de Haia.

O decisum objurgado (de procedência das postulações), inserido em sentença alentada de 96 folhas, foi prolatado, naquilo quanto agora interessa, nos termos seguintes (fls. 789 e ss.):

“DETERMINO: 1) Seja imediatamente devolvido o menor J.L.K.K. à República Federal da Alemanha, apreendendo-o de quem injustamente o possua, inclusive com seu passaporte, procedendo-se, na pronta decorrência, a restituição devida, mediante autuações próprias e sob encargo de dois Oficiais de Justiça deste Juízo (arts. 842/843, do CPC)....; 2) Adicionalmente e tendo em vista a situação irregular do infante J.L.K.K., nacional alemão, no território brasileiro e à luz do Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6815, de 15 de agosto de 1980), recomende-se à autoridade competente, na forma do Art. 99, do Decreto nº 86.715... e dos fundamentos especialmente estimados no item V, desta decisão, sob as expensas do Estado brasileiro (art. 26, da Convenção de Haia)...; 3)... requisite-se, de acordo com o Art. 5º, inc. II, do Código de Processo Penal, à Interpol, ou ao órgão da Polícia Judiciária que lhe faça as vezes, a abertura de Inquérito Policial Federal para apurar as circunstâncias e responsabilidades acerca dos delitos descritos neste julgamento, particularmente no item V...;4) Invalide-se, por extemporâneo, o Registro de Traslado de Assento de Nascimento de J.L.K.K., passado aos 18 de dezembro de 2007, sob o nº 32.573, às fls. 67, do Livro nº E-83, de Emancipações, Interdições e Ausências do 1º Distrito Judiciário do Recife (Cartório Porto Virgínio), e as certidões que em sua decorrência foram extraídas pelo mesmo Serviço Cartorário, comunicando-se acerca do fato à douta Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Pernambuco para a adoção das providências administrativas e correicionais.... , informando-se também ao MM Desembargador Cândido José da Fonte Saraiva de Moraes, relator de recurso a propósito dos mesmos fatos, para os devidos fins...”.

Irresignada, Camila Fernanda Pinheiro, mãe do menor, interpôs a primeira das três irresignações lançadas. Nela, discute a) suposta nulidade da sentença em face do julgamento antecipado da lide (feito, ademais, no dizer do recurso, às escondidas); b) nulidade parcial do comando fustigado, porquanto incorrera em extrapetição censurável; e, no mérito, que c) razões materiais (detectáveis pelos relacionamentos pai-mãe e pai-filho) impediriam o retorno da criança, sobretudo pelos riscos a que findaria submetida; defendeu-se a licitude da sua manutenção em território nacional, forte na interpretação que a Constituição Federal obrigaria fosse dada à Convenção de Haia, bem assim na já propositura de ação de guarda (perante a justiça estadual), no bojo da qual fora obtida uma decisão liminar favorável a si; mais que isso, destaca que a criança já estaria adaptada à vida no Brasil, e daí que o retorno, também por esta motivação, não estaria respaldado legalmente; alude, ainda, à suposta erronia conceitual entre domicílio e residência (levada a efeito na sentença), bem como ao fato de ser, a criança, não exatamente estrangeira, mas binacional (brasileira também), assim não podendo ser compelida a retornar.

Às fls. 1037 e ss., consta apelo do próprio menor, representado por curador especialmente designado (a Defensoria Pública da União); nele, discute, basicamente, a suposta nulidade da sentença por falta de instrução (pericial e testemunhal) sobre os pontos alegados em defesa, bem assim – e muito de passagem – o fato de que as normas de convenção poderiam ser contrastadas até com a Constituição Federal (fls. 1042).

Há, ainda, às fls. 1160 e ss., apelo manejado pelo MPF, tratando: a) da pretensa suspeição do magistrado prolator da decisão impugnada; b) da nulidade da sentença por errores in procedendo (conversão irregular de rito; falta de intimação quanto ao propósito de se julgar a lide de forma antecipada; falta de intimação do MPF para pronunciar-se sobre o mérito da causa; necessidade de instrução do feito); e c) e equívoco quanto à parte dispositiva da sentença.

Houve a apresentação de várias contrarrazões (fls. 1049 e ss.; 1073 e ss; fls. 1127 e ss.; fls. 1148 e ss.; fls. 1206 e ss.; fls. 1312 e ss.).

Nesta instância, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria Regional da República, de onde voltam com pronunciamento dado no sentido da anulação da sentença para regular instrução, que se entendeu necessária.

Dispensada a revisão regimentalmente; de todo modo, pela relevância da causa, encaminhei cópia das principais peças dos autos aos demais Desembargadores Federais que compõe a Turma de Julgamento.

É o relatório, tão resumido quanto a controvérsia permite.

NOTAS DO RELATOR:

1 A ação seria originalmente de conhecimento; o rito, ordinário (fls. 03). Sem embargo, o juízo a quo, pouco antes da sentença, houve por bem transformá-la em cautelar; há irresignação quanto ao ponto, conforme será visto.
2 A Autoridade Central alemã entrou em contato com a Autoridade Central brasileira; esta, provocou a AGU para fins de realização dos comandos encartados na Convenção de Haia; daí, finalmente, a ação de busca e apreensão sob descortino.
3 A ação foi interposta pela União (AGU), dado que o órgão encarregado de diligenciar o retorno de menores em condições como a narrada, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (Autoridade Central Brasileira, para usar terminologia da Convenção de Haia), dada a sua própria condição (órgão, e não Pessoa), sequer possuiria capacidade de ser parte processual; outro dado significativo: a demandante desfruta, hoje, da assistência litisconsorcial do pai da criança; relevante destacar, ainda, que foi concedida antecipação de tutela pelo juízo a quo, a qual não restou cumprida, porquanto suspensa a tempo (uma vez pelo Presidente desta Corte e duas pela Terceira Turma, sendo uma delas antes da sentença, outra depois).
4 Número 001.2007.052765-3, originada na 4ª Vara de Família e Registro Civil da Comarca da Capital (Recife/PE).

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