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06 outubro 2009

DIREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO-2-Final


Parte 2 - Final

Humberto Theodoro Júnior

Advogado; Desembargador Aposentado do TJMG; Professor.



* Estudo em homenagem ao Prof. Ovídio Baptista da Silva.



5 Delimitação da "Duração Razoável" do Processo



A garantia de duração razoável do processo está enunciada como cláusula geral, já que o inciso LXXVIII da CF não fornece textualmente dados certos para determinar quando, de forma objetiva, a duração deixaria de ser razoável. No entanto, não é difícil, caso a caso, detectar a irrazoabilidade das delongas procedimentais implantadas pela conduta maliciosa da parte, ou pela desídia das autoridades responsáveis pela marcha do feito, ou, ainda, pela burocracia inconveniente derivada de procedimentos e incidentes racionalmente injustificáveis e, não obstante, conservados pelo direito positivo.



Como as garantias fundamentais são de aplicação imediata e independem de regulamentação por leis ordinárias, geram elas, de plano, direito subjetivo para os destinatários, os quais, no caso em apreciação, podem exigir dos juízes e tribunais que façam com que a duração razoável seja cumprida, caso a caso.



Antes de tudo, a duração que ultrapassa o razoável é um problema que somente pode ser enfrentado e dirimido em face de dados concretos, os quais variam enormemente de um processo para outro. É impossível, ou pelo menos impraticável, a pretensão de reduzi-la a uma única e exata proposição. O enfrentamento tem de ser feito empiricamente e seu objeto há de ser a causa concreta da demora do encerramento do processo. São os motivos da sua real duração os fatos decisivos para se aferir se a duração foi justa ou injusta in concreto.



O Tribunal dos Direitos do Homem, de Estrasburgo, a quem compete fazer observar, na Comunidade Europeia, a garantia fundamental em exame, inclusive mediante punição aos Estados que a transgridem, adota alguns critérios básicos para mensurar o que seria um prazo razoável para o encerramento de um processo judicial. Essa mensuração haveria de levar em conta dados concretos como: a) a complexidade do caso; b) o comportamento das partes; e c) a atuação dos juízes e dos auxiliares da justiça 15. É claro que esses critérios não demarcam, desde logo, um tempo preciso para a vida do processo, e somente se revelam aplicáveis caso a caso. São úteis, todavia, pelos resultados práticos obtidos pelo mais importante tribunal que tem se incumbido de tornar efetiva a questionada garantia fundamental 16.



A teorização, portanto, da duração razoável do processo tem de ser feita dentro do quadro maior do devido processo legal, onde atua como subprincípio. Portanto, é, de início, imperioso destacar que o grande princípio se acha comprometido, antes de tudo, com o procedimento (forma) (CF, art. 5º, LIV) e, teleologicamente, com a adequação do esquema procedimental ao objetivo de acesso à justiça, no sentido material de tutela adequada ao direito lesado ou ameaçado (CF, art. 5º, XXXV).



Para os juízes e tribunais, o ponto de partida para resguardar a garantia de duração razoável do processo é a aferição de como se cumpriu, ou não, o procedimento. Se o tempo gasto, ainda que longo, foi aquele traçado pelas leis procedimentais para caso como o dos autos, não haverá lugar para ter como violado o direito fundamental contemplado no art. 5º, LXXVIII, da CF.



Quando o processo houver durado muito mais do que o tempo reclamado pela observância dos trâmites previstos na lei processual, é que se passará ao exame concreto das causas do excesso temporal. É nessa quadra que irão atuar aqueles critérios preconizados pelo Tribunal dos Direitos do Homem de Estrasburgo para avaliar se foi justa (razoável), ou não, a demora concretamente ocorrida.



Se foi a complexidade da causa que levou a diligências especiais fora dos padrões normais do procedimento ou se foram os próprios litigantes que tumultuaram a marcha do feito com incidentes e recursos abusivos, não cabe imputar ao juízo a culpa pela maior demora na conclusão do processo. Mas, se os atos e diligências a cargo do órgão julgador e seus auxiliares não respeitaram os prazos legais e se a autoridade judiciária não policiou o comportamento das partes e permitiu que provas e diligências inúteis e tumultuárias fossem praticadas impunemente, o Poder Judiciário se tornou responsável pela duração excessiva e, consequentemente, injusta da prestação da tutela jurisdicional 17.



Não se escusa o Estado invocando o volume excessivo de demandas, já que se acha constitucionalmente obrigado a aparelhar o serviço público de modo a cumprir, e fazer cumprir, todos os direitos fundamentais, inclusive o de garantir o acesso à justiça, dentro dos parâmetros do devido processo legal. Afastar-se dos parâmetros formais e temporais do devido processo legal corresponde a negar vigência às garantias fundamentais dos incisos XXXV e LIV da CF. Equivale, ainda, a violar o dever fundamental de prestar os serviços públicos segundo a legalidade e de maneira eficiente (CF, art. 37, caput).



É, aliás, de sabença universal que a denominada "crise da justiça", que é antiga e crônica, não só entre nós, mas em grande número de países, não é um fenômeno de ordem legal, ou de raízes situadas apenas no terreno dos códigos de procedimento.



Se é certo que procedimentos antigos e pouco razoáveis às vezes persistem no bojo das normas processuais, e por isso reclamam reformas legislativas para expurgá-los (o que, aliás, tem sido feito em profusão nos últimos tempos, aqui e alhures), não menos certo é que os procedimentos atualmente em vigor são, em sua maioria, singelos e despidos de formalismo doentio. Se respeitados, com fidelidade, dificilmente conduziriam a uma demora excessiva ou não razoável da solução definitiva das causas.



É claro que o combate à protelação desarrazoada da tutela jurisdicional efetiva passa, algumas vezes, pelo aprimoramento do procedimento legal. Mas a injustiça mais constante e mais real, no campo da denegação de justiça pela demora excessiva e intolerável, deriva da má funcionalidade dos serviços judiciais. É no gerenciamento da máquina estatal que se registram as causas mais evidentes do desrespeito à garantia do devido processo legal, pelo sistemático descompasso ocorrido entre os procedimentos legais e a tramitação real das causas perante o Poder Judiciário 18.



Se o que se exige, para que a duração processual seja razoável, é o respeito ao devido processo legal, e se o procedimento traçado pelo direito positivo se afeiçoa ao contraditório e ampla defesa, não se pode criticar a tese da economia processual como se ela representasse uma contradição com a segurança jurídica também valorizada pela CF. Todos os princípios e valores consagrados constitucionalmente devem ser conciliados e harmonizados para que um não anule os outros e, pelo critério da razoabilidade, todos coexistam e vigorem, na medida do possível.



Se o procedimento não é inconstitucional, deduz-se que os predicamentos do devido processo legal (especialmente o contraditório e a ampla defesa) tenham sido respeitados. Daí que, mantida a duração do processo dentro dos parâmetros das leis procedimentais, estaria, em princípio, respeitada a duração razoável. De outro lado, suplantada a duração imposta pelo procedimento legal, em princípio, estar-se-ia incorrendo em ofensa à garantia de razoável duração do feito, assegurada pelo inciso LXXVIII da CF.



Não é difícil, pois, na ordem prática implantar uma política gerencial de aprimoramento dos serviços judiciários, inspirada no programa traçado pela CF com vistas a tornar realidade o processo de duração razoável. Mais uma vez é preciso afastar a doutrina processual do campo estéril da pura conceituação teorética do que seria a duração razoável erigida à categoria de direito fundamental em estreita consonância com as garantias maiores do devido processo legal e do acesso pleno à tutela jurisdicional efetiva.



Antes de qualquer esforço acadêmico conceitual é preciso dar conteúdo prático e imediato ao novo direito fundamental, concebido que foi numa conjuntura de crise da justiça caracterizada basicamente pela excessiva e intolerável demora com que os processos concluem os provimentos destinados a realizar a definitiva composição dos litígios. O que, então, se pode exigir, de imediato, para tornar realidade o preceito fundamental proclamado no inciso LXXVIII do art. 5º da CF? É algo muito simples e que dispensa grandes reformas da legislação e mesmo maiores elucubrações teóricas da doutrina. Basta que os serviços judiciários e os seus operadores sejam revistos, reorganizados e preparados para cumprir, com fidelidade, os procedimentos, prazos e diligências tal como os disciplinam os Códigos e leis processuais em vigor. No direito positivo já se acham previstos poderes que, uma vez exercitados pelos agentes do Poder Judiciário, são mais do que suficientes para que os processos, de uma maneira geral, tramitem e se encerrem dentro dos ditames da duração razoável e sob os desígnios do princípio da economia processual, tal como preconiza o art. 5º, LXXVIII, da Constituição.



Urge conscientizar o Estado de seu dever constitucional de gerir o serviço público de maneira eficiente e sob estrita sujeição à legalidade (CF, art. 37). Isto, no campo da prestação jurisdicional, faz com que a garantia de duração razoável dos processos não seja, de imediato, nada mais do que a eliminação do gravíssimo vício dos prazos impróprios que, na verdade, elimina o dever dos agentes do Poder Judiciário de procederem na estrita observância da legalidade procedimental 19. É justamente pela indiferença dos agentes judiciários aos prazos e ditames das leis procedimentais que se criam as conhecidas "etapas mortas" (tempo em que o processo "dorme" nos escaninhos dos cartórios, secretarias e gabinetes), causa imediata da longa e triste duração inadmissível dos feitos judiciais.



6 Conclusões



a) A garantia constitucional de duração razoável para a conclusão dos processos não corresponde a uma norma programática, mas a um preceito implantado com definitividade e eficácia plena e imediata, como, aliás, se passa com todas as garantias e direitos fundamentais (CF, art. 5º, § 1º);



b) O movimento reformista do CPC, em curso nos três últimos lustros, está comprometido, sem sombra de dúvida, com a política de desburocratizar a tramitação dos processos judiciais e de reduzir sua duração, o que o põe em consonância com os modernos tratados internacionais de defesa dos direitos do homem firmados pelo Brasil e com a garantia fundamental insculpida no inciso LXXVIII do art. 5º de nossa Constituição;



c) Muito se tem discutido e controvertido em torno do que seria, teoricamente, a duração razoável de um processo, e como se trata de uma cláusula geral (ou um conceito indeterminado) é muito difícil reduzi-la a uma definição capaz de apontar-lhe limites ou dimensões temporais precisos: só o exame in concreto é capaz de definir, caso a caso, se ocorreu, ou não, ultrapassagem da duração razoável, tantos são os fatores que influem sobre a maior ou menor demora na resposta jurisdicional 20;



d) Na ordem prática, todavia, o primeiro parâmetro a se utilizar na aferição da razoabilidade da duração de um processo situa-se no terreno comandado pelo princípio do devido processo legal e pelo princípio da legalidade: o atraso decorrente da inobservância dos prazos legais impostos aos juízes, tribunais e órgãos auxiliares; assim como o retardamento derivado de produção de provas descabidas ou de diligências inúteis; ou, ainda, de anulação tardia do processo, acarretando sua onerosa repetição, quando era possível, no nascedouro, sanar o defeito; ou a longa suspensão da marcha processual para realizar audiência de instrução e julgamento, quando o caso é, legalmente, de julgamento antecipado da lide; todos esses eventos, e muitos outros de afastamento desarrazoado do procedimento traçado pela lei processual, são exemplos de evidente desrespeito à garantia constitucional de duração razoável do processo, com grave comprometimento da efetividade do acesso à justiça 21;



e) O princípio da duração razoável do processo – como se passa com todos os princípios – não é absoluto, nem pode pretender uma aplicação isolada e indiferente aos demais princípios que informam o sistema constitucional de garantia da tutela jurisdicional 22;



f) O Estado não pode permanecer impune pela demora injusta no cumprimento da tutela efetiva a que faz jus o titular do direito subjetivo lesado ou ameaçado (CF, art. 5º, XXXV); a ineficiência do serviço judiciário descumpre os princípios da legalidade e eficiência impostos à Administração Pública pelo art. 37 da CF, violando gravemente o direito fundamental da parte a um processo justo e de duração razoável (CF, art. 5º, LIV e LXXVIII); portanto, os prejuízos derivados dessa grave falta, operada no plano dos direitos e garantias, redundam em responsabilidade civil (dever de indenizar) para o Estado 23;



g) A visão que exige dolo ou culpa grave do juiz para que se considere violada a garantia da duração razoável do processo, e que torna a responsabilidade do Estado, na matéria, subjetiva, não é benemérita de aplausos. Seu fundamento é a teoria da falta omissiva do serviço, que só justifica o dever de indenizar quando o agente que se omitiu, assim o fez por descumprimento de seus deveres funcionais 24. Acontece que as garantias fundamentais (direitos do homem) não podem ficar na dependência da análise subjetiva do comportamento do juiz. Ademais, a falha, independentemente do procedimento do juiz ou do tribunal, é do serviço judiciário. Não é simplesmente uma omissão, é, na verdade, uma violação positiva do dever de conduzir o processo de modo a não ultrapassar o prazo razoável de duração garantido pela Constituição. A teoria da responsabilidade subjetiva, criada pelo direito administrativo, tem cabimento quando a Administração não age nas circunstâncias concretas, e o dano, na verdade, é causado por terceiro, como ocorre, por exemplo, na falta de policiamento que deixa as pessoas desprotegidas e facilita a prática contra elas de crimes ou agressões 25. Aí, sim, se há de verificar se havia, in concreto, o dever atual de evitar o delito, e, se a ausência do poder público se deu quando era obrigatória sua atuação contra a prática criminosa. Não é o caso da autoridade policial presente que age ineficientemente na repressão do delito cometido, e do dano consumado graças à inadequada atuação policial. Assim, também, não há omissão quando o processo corre sob o comando e a responsabilidade atual do juiz ou do tribunal, e estes, concretamente, não cumprem o dever constitucional de encerrá-lo dentro de prazo razoável. O juiz e o tribunal podem ter até razões práticas para demonstrar que, materialmente, não lhes foi possível cumprir o prazo determinado pela Constituição. Mas, o Estado não tem como fugir do dever de cumprir e fazer cumprir uma garantia fundamental, ainda mais quando tal descumprimento seja consequência imediata do desaparelhamento material e humano do serviço judiciário 26;



h) Diante da ultrapassagem da duração razoável do processo, sem justificativa plausível para o descumprimento dos prazos e procedimentos legais, é importante reconhecer que apenas o acúmulo de processos "não é suficiente para que se afaste a responsabilidade objetiva do Estado" 27 pela violação cometida contra um direito fundamental do litigante 28.



Os direitos fundamentais, quaisquer que sejam, não podem ser negados ou violados pelo próprio Estado a quem a Constituição incumbiu a função não só de proclamá-los, mas sobretudo de implementá-los 29.



Os males da duração normal (ou razoável) do processo, quando graves e iminentes, se evitam ou se reparam pelos remédios da tutela de urgência; os prejuízos da duração não razoável, como falha ou deficiência do serviço judiciário, se sanam pela responsabilidade civil objetiva do Estado, prevista no art. 37, § 6º, da Constituição.



NOTAS DO AUTOR :



15 - Esses mesmos dados têm sido utilizados pela doutrina brasileira recente na análise da garantia fundamental do art. 5º, LXXVIII, da CF (CARVALHO, Fabiano. EC 45. Reafirmação da garantia da razoável duração do processo. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do Judiciário. São Paulo: RT, 2005, p. 219; TUCCI, José Rogério Cruz e. Tempo e Processo. São Paulo: RT, 1997, p. 68; NOTARIANO Jr., Antonio de Pádua. A garantia da razoável duração do processo. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do Judiciário cit., p. 60; BEZERRA, Márcia Fernandes. O direito à razoável duração do processo e a responsabilidade do Estado pela demora na outorga da prestação jurisdicional. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do Judiciário cit., p. 469; HOFFMAN, Paulo. O direito à razoável duração do processo e a experiência italiana. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do Judiciário cit., p. 586).
16 - TAVARES, Fernando Horta. Acesso ao direito. Duração razoável do procedimento e tutela jurisdicional efetiva nas Constituições brasileira e portuguesa. In: MACHADO, Felipe Daniel Amorim; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de (Coords.). Constituição e Processo. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 272.
17 - O direito fundamental (ou direito do homem) à duração razoável do processo, institucionalizado pela Emenda Constitucional nº 45/04, "representa o processo sem dilações indevidas, em que o magistrado como ator principal deve agir imediatamente, não ser omisso e interpretar a lei, buscando sempre o sentido mais econômico, adaptando o procedimento, quando viável. Esse é o alicerce sobre o qual deve estar assentado o processo civil brasileiro" (GÓES, Gisele Santos Fernandes. Razoável duração do processo. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. (Coord.). Reforma do Judiciário. São Paulo: RT, 2005, p. 267).
18 - "Falar de ‘operacionalidade e gerenciamento da máquina estatal’ é se bater pela melhoria dos serviços judiciários, como o direito do cidadão a ter uma ‘boa administração’ elevada a categoria de Direito Fundamental pelo art. 41º da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia, vale dizer, uma administração judiciária ‘aberta’ e ‘eficiente’ como exigência de um Estado de Direito que se funda na Democracia, de igual sorte prevista no art. 37 da Constituição Brasileira" (TAVARES, Fernando Horta. Acesso ao direito cit., p. 274-275). Valiosa é a lição e advertência de Giuseppe Tarzia: "Di fronte alla persistente, normalmente eccessiva durata del processo civile, occorre rendersi conto che nessuna riforma processuale – forse pure la migliore possibile – è in grado di incidere sull’efficienza della giustizia civile – o meglio di combatterne la normale inefficienza sotto il profilo temporale – se non accompagnata da profonde riforme di struttura, che attengano all’ordinamento giudiziario, all’organico dei giudici, al personale ausiliario, agli strumenti materiali che costituiscono l’indispensabile supporto per l’esercizio della giurisdizione" (Lineamenti del processo civile di cognizione, 2. ed., Milano, Giuffrè, 2002, p. 84).
19 - "A almejada celeridade de tramitação em tempo adequado passa, pois, pelo aspecto da estrita legalidade dos próprios Códigos de Processo, isto é, a Administração Judiciária deve, como as demais pessoas a ela equiparadas pelo Princípio da Isonomia, cumprir e praticar os atos processuais segundo a moldura definida pela norma procedimental..." (TAVARES, Fernando Horta. Acesso ao direito cit., p. 275)
20 - "Em termos pragmáticos, é impossível fixar a priori uma regra específica, determinante do que representaria prazo razoável. Trata-se de um conceito indeterminado ou aberto, que deve ser dotado de um conteúdo concreto em cada caso, atendendo-se a critérios objetivos congruentes", dentre eles: "a) a complexidade da causa; b) o comportamento dos litigantes e de seus procuradores; e c) a atuação do órgão jurisdicional" (ROSITO, Francisco. O princípio da duração razoável do processo sob a perspectiva axiológica. Revista de Processo, v. 161, p. 36).
21 - "A seu turno, Efetividade do Direito e do Processo passa, também, por uma ideia bem mais simples e que esta à nossa mão, neste momento: a de se respeitar o Princípio da Legalidade Democrática (Brasil e Portugal), já há muito previsto em nossas Constituições e Códigos de Processo, isto é, estrito cumprimento dos prazos codificados não só pelos sujeitos processuais litigantes, como comumente se exige, mas também e principalmente pelos órgãos judiciários e administrativos" (TAVARES, Fernando Horta. Acesso ao direito cit., p. 278).
22 - "Resta a seguinte advertência final: à luz do princípio da duração razoável, sob o adequado perfil axiológico, o processo deve demorar exatamente o tempo necessário para atender a sua finalidade de resolver o conflito com justiça, outorgando-se o direito material a quem efetivamente o tem, sem deixar de respeitar o contraditório, a ampla defesa, a igualdade entre as partes e o dever de adequada fundamentação, sob pena de violarmos garantias transcendentais do nosso sistema" (ROSITO, Francisco. O princípio da duração razoável cit., p. 36). Como adverte Barbosa Moreira, "a Constituição também confere aos litigantes a garantia do contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, inciso LV). A norma introduzida pela Emenda Constitucional nº 45 terá de conviver com essa e não poderá fazer dela tábua rasa" (Temas de Direito Processual – Nona Série, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 377). "Em síntese, a garantia constitucional do devido processo legal deve ser uma realidade durante as múltiplas etapas do processo judicial, de sorte que ninguém seja privado de seus direitos, a não ser que no procedimento em que este se materializa se constatem todas as formalidades e exigências em lei previstas. Desdobram-se estas nas garantias: a) de acesso à justiça; b) do juiz natural ou preconstituído; c) de tratamento paritário dos sujeitos parciais do processo; d) da plenitude de defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes; e) da publicidade dos atos processuais e da motivação das decisões jurisdicionais; e f) da tutela jurisdicional dentro de um lapso temporal razoável. Conclui-se, portanto, que, também em nosso país, o direito ao processo sem dilações indevidas, como corolário do devido processo legal, vem expressamente assegurado ao membro da comunhão social por norma de aplicação imediata (art. 5º, § 1º, CF)" (TUCCI, José Rogério Cruz e. Duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal). In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; JOBIM, Eduardo. O processo na Constituição. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 342).
23 - "Para não reduzir a bem intencionada disposição (da EC nº 45/04) à reles condição de mera regra programática, sem impacto real na vida do foro, é preciso atribuir-lhe, quando nada, a virtude de conferir ao prejudicado pela demora excessiva da prestação jurisdicional o direito ao ressarcimento dos danos sofridos" (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Temas de Direito Processual cit., p. 373). É claro que podem existir motivos justificáveis para demora do processo, como a complexidade da causa e a necessidade de provas técnicas e diligências fora da sede do juízo e até fora do país. Mas, se a duração excessiva resultou simplesmente de inobservância de prazos e diligências legais por parte do juízo e seus auxiliares, revela-se ela inaceitável, e o Estado terá de ser "diretamente responsabilizado" pelas ações e omissões de seus agentes (Cf. BEZERRA, Márcia Fernandes. O direito à razoável duração do processo cit., p. 478). Incide, in casu, o art. 37, § 6º, da CF.
24 - STOCO, Rui. Razoável duração do processo (responsabilidade do Estado pela demora na prestação jurisdicional). In: MARTINS, Ives Gandra; REZEK, Francisco. Constituição Federal: avanços, contribuições e modificações no processo democrático brasileiro. São Paulo: RT, 2008, p. 508-509.
25 - Ao defender a responsabilidade subjetiva do Estado nos casos de omissão danosa para o particular, esclarece Celso Antônio Bandeira de Mello que "se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu o dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo. (...) Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva" (Ato administrativo e direitos dos administrados. São Paulo: RT, 1981, p. 144-145). Como se vê, a doutrina de Bandeira de Mello pressupõe expressamente que o dano sofrido pelo particular não provenha diretamente do Estado, mas de outro particular, cuja conduta ilícita competia ao serviço público impedir. Se, portanto, o dano está ligado em nexo causal imediato ao próprio serviço público, é claro que a responsabilidade do Estado é objetiva plenamente (CF, art. 37, § 6º), não havendo como aplicar à espécie, a teoria excepcional criada doutrinariamente para estender-lhe, com fundamento na culpa, o dever de reparar um dano que diretamente não produziu.
26 - Se o Estado não se aparelha adequadamente para cumprir sua obrigação constitucional, está à evidência violando um direito subjetivo da parte. Não está apenas se omitindo, está descumprindo um dever positivo imposto pela Constituição. É clara, em tal circunstância, a falta cometida pelo serviço público, de sorte a tornar irrecusável a sua responsabilidade pelo dano que esse mesmo serviço causou injustamente ao jurisdicionado.
27 - BEZERRA, Márcia Fernandes. Direito à razoável duração do processo cit., p. 477.
28 - "É certo, também, que o grande volume de trabalho que pesa sobre determinados órgãos do Poder Judiciário pode servir para escusar juízes e tribunais de toda a responsabilidade pessoal decorrente do atraso no proferimento das decisões, mas não suprime a responsabilidade objetiva do Estado pelo anormal funcionamento do serviço judiciário" (TUCCI, José Rogério Cruz e. Tempo e processo cit., p. 139).
29 - Uma vez erigida a garantia de duração razoável do processo à categoria de direito fundamental, não há como evitar a responsabilidade do Estado pelo seu descumprimento por meio de "ações e omissões tanto de juízes quanto de auxiliares que atuem no exercício da função jurisdicional" (BEZERRA, Márcia Fernandes, op. cit., p. 478).

Extraído de Newsletter Magister 980, 29-09-09

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