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20 agosto 2010

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - POSSIBILIDADES DE PROTEÇÃO DO PROMITENTE COMPRADOR-3

Parte 3- Final



Vinícius Garcia Vieira

Acadêmico do 7º semestre do Curso de Direito da UFSM, RS 


5 – Ação Condenatória de Obrigação de Fazer. Tutela Diferenciada.

A ciência processual encontra-se num tempo de reaproximação com o direito material, na tentativa de superar a idéia de que existe uma única ação processual capaz de servir de instrumento processual a tutelar todos os direitos subjetivos imagináveis. Esta antiga concepção de ação processual esteve ligada a necessidade de afirmação da ação ordinária processual, ao mesmo tempo em que se negava o conceito de ação de direito material.

Nesse novo contexto do direito processual, as tutelas diferenciadas representam demonstrações práticas da aproximação entre direito material e direito processual. Através delas, o processo procura cumprir a sua função de instrumentalidade, buscando atingir uma maior efetividade na tutela dos direitos materiais, com o nítido propósito de adequar os procedimentos às necessidades de situações particulares do direito material e propiciar meios mais eficientes de tutela processual.

Permeado por esse espírito, foram trazidas inovações quanto à tutela das obrigações de fazer e não fazer, estabelecendo o legislador uma tutela diferenciada a elas, através do art. 461 do CPC, com a redação dada pela Lei nº 8.952/94. Nesse caso,várias e importantes inovações no âmbito do direito processual foram introduzidas, tanto para reforçar a teoria do cabimento da execução específica, sempre que possível, como para protegê-la por variados mecanismos de antecipação de tutela, de coerção e de sub-rogação.

O caput do art. 461, coloca em último plano a conversão em perdas e danos, e dá garantia ostensiva ao direito do credor de exigir, em juízo, o cumprimento in natura da prestação devida, ou de algo que praticamente a ela equivalha. Assim a regra tornou-se a execução específica, sendo, em último caso, resolvida por perdas e danos.

Antes da reforma do art. 461, o promitente comprador tinha dificuldade em alcançar a execução, in natura, pelos motivos já supramencionados, pois a possibilidade que se abria era através do art. 639 e ss do CPC, de utilização “subsidiária” com o intuito de não deixar sem proteção o promitente comprador que não tivesse seu contrato registrado.

Agora, após a reforma, encontra-se prevista no art. 461 do CPC, como afirma Nelson Nery Jr., uma ação de natureza condenatória, ou seja de conhecimento, o que anteriormente não havia. Porém, lembra ele, tem eficácia executivo-mandamental, pois abre ensejo à antecipação de tutela, autorizando a emissão de mandado específico e provisório da tutela de mérito ou de seus efeitos. [xiii]

Há que se lembrar ter sido implementada tal mudança, juntamente com a antecipação de tutela, prevista no art. 273 do CPC, com redação dada pela Lei nº 8.952/94, mesma lei que estabeleceu a tutela diferenciada do art. 461. Porém, não se instituiu dois regimes de antecipação de tutela, como a primeira vista possa parecer. Humberto Theodoro Júnior argumenta que, na verdade as condições para a concessão da tutela antecipada fundamentada, seja no art. 273 ou no 461, são as mesmas.

Afirma ele que “de fato, no art. 273 exige-se que a parte apresente prova inequívoca conducente à verossimilhança do alegado, comprove perigo de dano de difícil reparação e que os efeitos da providência a ser antecipada não sejam irreversíveis.” [xiv]

Continua ele dizendo que “no art. 461 a lei reclama, como condição da tutela antecipada, a relevância do fundamento da demanda e o justificado receio de ineficácia do provimento final, caso não se adiante a prestação jurisdicional provisoriamente. Ora, falar-se em relevância do fundamento não é outra coisa que exigir-se a verossimilhança de tudo o que arrola o autor para pretender a tutela jurisdicional. Não há, portanto, diferença profunda, no aspecto do fumus boni iuris, entre o art. 273 e o art. 461.” [xv]

Quanto ao periculum in mora, há que se concordar com a semelhança, posto que o haver justificado receio de ineficácia do provimento final, previsto no § 1º do art. 461, corresponde ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, conforme estabelece o inc. I do art. 273 do CPC.

A antecipação de tutela envolve medidas executivas lato sensu, possíveis no mesmo processo de conhecimento já instaurado. Disso decorre a implementação da execução específica como regra e a indenização por perdas e danos como exceção, no caso do compromisso de compra e venda.

Assim, de grande relevância se reveste o § 1º do art. 461, pois possibilita a execução in natura da obrigação devida, evitando que a ação de condenatória de obrigação de fazer se limitasse a ser um meio de atingir a execução forçada dos arts. 639 e ss. do CPC, no caso da obrigação de transmitir escritura definitiva, decorrente do contrato de promessa de compra e venda. Pela antecipação de tutela, na ação condenatória de obrigação de fazer, o promitente comprador pode conseguir, ainda no processo de conhecimento, medidas que possam garantir a outorga da escritura definitiva do imóvel.

Porém, não se pretende com isso afirmar que a execução forçada do art. 639 e ss., foi suprimida pelo art. 461, pois haverá vezes em que a tutela antecipada não será concedida, e a sentença da ação de conhecimento, com a qualidade de coisa julgada, servirá de título hábil à execução forçada do art. 639 do CPC. Ocorrerá também de a execução forçada tradicional ficar afastada pelo deferimento da antecipação de tutela, quando tornada definitiva pela sentença definitiva.

Nesse sentido se posiciona Humberto Theodoro Júnior, para quem “muitas vezes, porém, acolhida a antecipação de tutela em moldes de maior amplitude, pelas características do caso concreto - como, por exemplo, no caso de demolição autorizada antecipadamente, ou de conclusão de obra, em igual conjuntura - totalmente afastada ficará a observância posterior da execução forçada tradicional. Aliás, a feição interdital do processo de conhecimento autorizada genericamente pelo art. 273, e não apenas especificamente pelo art. 461, traz como conseqüência a possibilidade de as duas funções jurisdicionais - conhecimento e execução - fundirem-se num mesmo processo. Numa só relação processual o juiz acerta o direito da parte e o realiza, de sorte que a sentença, diante da tutela executiva antecipada, em sendo procedente a demanda, se limitará a tornar definitiva a providência satisfativa já tomada em favor do autor.” [xvi]

Do exposto, verifica-se que o art. 461 não se limita apenas à atividade cognitiva, ocorrendo casos em que os provimentos antecipatórios se tornarão definitivos pela sentença do processo de conhecimento, evitando a necessidade da utilização da ação de execução prevista no art. 639 do CPC. Porém, haverá vezes em que ficará apenas na cognição, ensejando a posterior ação de execução, baseada na sentença transitada em julgado.

6 – Considerações finais.

A controvérsia em torno do tema desenvolvido, vem de longa data. Porém, com base nos dispositivos que tutelam a obrigação de fazer decorrente do contrato de promessa de compra e venda, seja ele registrado ou não, buscam dar mais efetividade à prestação jurisdicional, de forma a não deixar sem amparo o promitente comprador.

Pelas argumentações que durante este trabalho foram apresentadas, pode-se concluir que:

a) a ação de adjudicação compulsória, fundamentada nos arts. 15, 16 e 22 do Decreto-lei nº 58/37, ainda encontra certas ressalvas quanto ao seu cabimento, no caso de contratos não registrados. Dessa maneira, torna-se mais conveniente ao promitente comprador cujo contrato esteja registrado;

b) ao promitente comprador que não possua seu contrato registrado, abrem-se duas possibilidades, sendo a primeira a ação de execução forçada, do art. 639 e ss. do CPC, e a segunda a ação condenatória de obrigação de fazer, com fulcro no art. 461 do CPC;

c) para utilizar-se da ação de execução tradicional do art. 639, seu contrato necessita preencher os requisitos do art. 585, inc. II do CPC, para poder constituir título executivo extrajudicial, ou seja, título hábil ao processo de execução;

d) surge como mais adequado, o uso da tutela diferenciada, prevista no art. 461, pois nesse dispositivo está prevista a ação condenatória de obrigação de fazer, mas que pode ter eficácia executivo-mandamental, através da antecipação de tutela. Cabe lembrar que este dispositivo estabelece a tutela específica às obrigações de fazer e não fazer, revelando, assim a implementação da execução específica como regra, e somente como exceção se recorre a indenização por perdas e danos.

Notas do Autor:
[xiii] NERY JR., Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. op. cit. (nota 11), p. 897-898.
[xiv] THEODORO JÚNIOR, Humberto. op. cit. (nota 9).
[xv] Idem.
[xvi] THEODORO JÚNIOR, Humberto. op. cit. (nota 9).


7 – Bibliografia

NEGRÃO, Theotonio. Código Civil e legislação civil em vigor. São Paulo: Saraiva, 1997.
NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. São Paulo: Saraiva, 2000.
NERY JR., Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 5ª ed., 2001.
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. Rio de Janeiro: Aide, 1988.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela específica das obrigações de fazer e não fazer . Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em: . Acesso em: 28 jun. 2003.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Contratos em Espécie. São Paulo, Atlas, 3ª ed., 2003.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. São Paulo, Atlas, 3ª ed., 2003.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. São Paulo, Atlas, 2ª ed., 2003.

Extraído do site da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul.

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