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19 agosto 2010

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - POSSIBILIDADES DE PROTEÇÃO DO PROMITENTE COMPRADOR-2

Parte 2/3




Vinícius Garcia Vieira
Acadêmico do 7º semestre do Curso de Direito da UFSM,RS


3 – Adjudicação Compulsória. Características.

Ocorrendo a negação do compromitente-vendedor em transmitir a escritura definitiva, pode o compromissário-comprador valer-se da ação de adjudicação compulsória para obter a outorga da escritura definitiva. Segundo Arnaldo Rizzardo, “o Estado deve socorrê-lo, como de fato acontece. Chamado a intervir, com sua autoridade impõe o cumprimento da obrigação, mediante uma sentença constitutiva, suprindo a manifestação espontânea do consentimento do inadimplente.” [v]

Inicialmente, entendia a doutrina e a jurisprudência que tal ação só era possível caso houvesse o registro do contrato, pois faltaria interesse de agir ao autor da ação, no caso o compromitente-comprador, se o contrato não fosse registrado. A matéria passou por longa evolução durante os anos de vigência da legislação.

Esse entendimento inicial, baseava-se em considerar a pretensão, na ação de adjudicação compulsória, como de natureza real. Por esse entendimento, o registro do contrato criava a obrigação ao promitente vendedor de transmitir a escritura definitiva do imóvel. Porém, sabe-se que tal obrigação surge da relação pessoal existente entre as partes contratantes, que revelam a intenção de concluir o contrato “principal”, ou seja, a escritura definitiva. Assim, não há como entender pela necessidade do registro do contrato condição à propositura da ação de adjudicação compulsória, pois a pretensão que sustenta tal instituto processual é de natureza pessoal, eis que surge da relação inter partes, e não do registro do contrato.

Atualmente está superada tal concepção inicial, pois as decisões mais recentes têm permitido a adjudicação compulsória mesmo sem o registro. Sílvio Venosa afirma que a jurisprudência homogênea do Superior Tribunal de Justiça admite prescindir o compromisso de compra e venda do registro imobiliário para possibilitar a adjudicação compulsória. [vi] Tanto é assim, que a Súmula nº 239 do STJ traz o entendimento pacífico deste Tribunal no sentido de permitir a ação de adjudicação compulsória baseada no contrato sem o registro cartorial.

Caracteriza-se tal ação pelo rito sumaríssimo, atualmente sumário, conforme prescrito no art. 16 do Decreto-lei nº 58/37. Nos parágrafos do referido artigo, estão estabelecidas as condições de admissibilidade da ação, entre eles o cumprimento das obrigações. Como condição primeira para esta ação, o preço deve estar, evidentemente integralizado. A outra condição seria o registro do contrato, que já foi superada, conforme demonstrado pelo entendimento do STJ, expresso na Súmula nº 239. Cabe ressaltar que a sentença valerá como título hábil para o registro.

No art. 22 do referido Decreto-lei, assim está estabelecido: “Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e venda e cessão de direito de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago no ato de sua constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações, desde que inscritos a qualquer tempo, atribuem aos compromissários direito real oponível a terceiros, e lhes conferem o direito de adjudicação compulsória nos termos do art. 16 desta lei, 640 e 641 do Código de Processo Civil.”

Por essa disposição, estendeu-se aos contratos de imóveis não loteados, desde que não haja cláusula de arrependimento, a possibilidade de ação de adjudicação compulsória. De outra banda, esclarece Arnaldo Rizzardo que “os arts. 640 e 641 fazem parte da regulamentação do processo de execução de obrigação de fazer, que tenha como objeto um contrato e este vise a transferência da propriedade de coisa determinada.” [vii]

Dessa maneira, a execução prevista no art. 640, surge como alternativa ao promitente comprador que não tem seu contrato registrado, na tentativa de evitar toda a discussão quanto ao cabimento da ação de adjudicação compulsória baseada em contrato não registrado. Por essa opção, ressalta o caráter de instrumentalidade do processo, garantindo uma efetiva prestação jurisdicional, ao mesmo tempo que disponibiliza ao promitente comprador a satisfação de seu direito.

4 – Ação de Execução de Obrigação de Fazer. Possibilidade ao promitente comprador

Em virtude de persistirem resquícios da concepção arcaica que considera necessário o registro do contrato de promessa de compra e venda, para o ajuizamento da ação de adjudicação compulsória, a jurisprudência tem utilizado os arts. 639 e ss do CPC, para possibilitar a tutela jurisdicional ao promitente comprador não investido em direito real, agora positivado no Novo Código Civil em seus arts. 1.225, inc. VII, 1.417 e 1.418.

Tal ação está prevista no Título II do CPC, que trata das várias espécies de execução no processo civil brasileiro. Em seu Capítulo III, Seção II, trata especificamente da ação de execução da obrigação de fazer. No art. 639, estabelece o seguinte: “se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado.”

Por esse dispositivo, o autor obtém uma sentença que substitui a declaração de vontade da parte compromissada, sendo documento hábil para o registro da escritura definitiva. Nesse sentido, Sílvio Venosa argumenta que a execução específica mune a parte de um título jurídico com os mesmos efeitos da declaração, quando isto for possível, ou determina o pagamento de indenização substitutiva. [viii]

Execução específica é aquela que se faz mediante a entrega do bem devido, in natura, espécie de execução própria, pois visa resultados materiais satisfativos diretamente por obra dos agentes executivos estatais. Porém, há que se atentar para a observação de Humberto Theodoro Júnior, segundo o qual “os atos de satisfação específica, porém, nem sempre são praticáveis pelos agentes do judiciário. Por isso, às vezes, os atos da execução forçada se limitam a realizar a prestação.” [ix] Porém, prossegue o autor, dizendo que na execução própria, outrossim, pode acontecer a execução sub-rogatória, quando se proporciona algo diverso ao credor, mas que equivalha, em sentido prático, à prestação devida, ou que, pelo menos, indenize a falta da prestação específica. [x]

Em termos práticos pela execução sub-rogatória o juiz irá tomar medidas que, independentemente da colaboração do devedor, levarão resultado prático desejado. Dessa forma, com a sentença do procedimento previsto nos arts. 639 a 641 do CPC, o credor obtém, portanto, execução específica da obrigação de fazer contida na promessa de contratar. Por expediente diverso do contrato prometido chega-se a efeito jurídico e prático a ele equivalente.

Nelson Nery Jr., observa que “os arts. 639 e 641 passaram a disciplinar, de forma ampla e bem delimitada, as hipóteses em que é viável a execução direta, com a substituição da manifestação de vontade do devedor renitente pela sentença, que produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.” [xi] Dessa forma torna-se possível a ação de execução de obrigação de fazer para garantir o acesso à jurisdição pelo promitente comprador sem contrato registrado.

Porém, como observa Arnaldo Rizzardo, se a parte ingressar com a adjudicação compulsória, será admissível o atendimento baseado em tais normas, pois estas se aplicam a quaisquer execuções de contratos, abrangendo também a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de compra e venda, que é uma forma, sendo irrelevante o nomen juris dado. [xii]

Através dessa ação de execução, acabaram por ser infundados os argumentos daqueles que defendem ser a adjudicação compulsória uma ação à disposição somente dos que possuem o seu contrato registrado, pois não há essa exigência no caso da execução específica. Mas, por ser essa ação regulada no processo de execução, o contrato necessita constituir título executivo extrajudicial, preenchendo os requisitos do art. 585, inc. II do CPC, para poder embasar a ação de execução de obrigação de fazer.

Notas do Autor:
[v] RIZZARDO. Arnaldo. op. cit. (nota 1), p. 381.

[vi] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Contratos em Espécie. São Paulo: Atlas, 2003. p. 531.
[vii] RIZZARDO, Arnaldo. op. cit. (nota 1), p. 382.
[viii] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. São Paulo: Atlas, 2003. p. 422.
[ix] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela específica das obrigações de fazer e não fazer . Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 56, abr. 2002.
[x] Idem.
[xi] NERY JR., Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 1137.
[xii] RIZZARDO, Arnaldo. op. cit. (nota 1), p. 385.

Extraído do site da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul.

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