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08 fevereiro 2010

O MP E O ABUSO DO PODER DE ACIONAR

Sob o título MP acusa Fernando Miranda de vender sentença, o Conjur publicou ontem (7/2/10) a seguinte matéria:

"Um feirante". É assim que o Ministério Público Estadual classificou a conduta do juiz Fernando Miranda Rocha, acusado de venda de sentença, em uma denúncia protocolada pelo procurador de Justiça Paulo Ferreira Rocha. A representação foi feita ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que negou o recebimento da ação. O MPE recorreu e aguarda nova decisão do Superior Tribunal de Justiça. A informação é do Media News.
A denúncia foi apresentada em 2005. De acordo com o MPE, o juiz participou de um esquema para garantir a permuta de um apartamento, localizado no bairro Jardim das Américas, em Cuiabá, que estava em nome de um menor de idade. O caso envolve a esposa do juiz, Elizabete Lima Miranda Rocha, que é advogada. A denúncia relata que a mãe do menor, Alcione Caso Zeferino, representada por Elizabete, tentou, sem sucesso, trocar o imóvel que estava no nome do filho, por um casa de propriedade do comerciante Renato de Freitas Santana, localizada no bairro Shangri-la.
Segundo o Ministério Público, Alcione e Renato tentaram, por diversas vezes, autorização da Justiça de Cuiabá para conseguir concretizar o negócio, já que o imóvel estava em nome de um menor. Entretanto, não coneguiram sucesso nas investidas. As investigações apontaram que Alcione era dependente química e queria fazer a permuta com o imóvel de menor valor, para usar o dinheiro que pegaria para comprar drogas.
Depois de não conseguir posicionamento favorável do promotor de Justiça de Cuiabá, o MP narra que os denunciados forjaram um endereço falso para Alcione, em Várzea Grande. A partir daí, tentariam conseguir a decisão favorável na comarca da cidade, onde atua o juiz Fernando Miranda. Em outra representação assinada pelo advogado Elarmin Miranda que, segundo o procurador de Justiça, seria "compradre" do juiz, eles protocolaram o pedido na Comarca de Várzea Grande.
Para o representante do Ministério Público Estadual, o ato criminoso é flagrante, já que a mesma petição que havia sido protocolada na Comarca de Cuiabá foi apresentada à Justiça de Várzea Grande. "Os denunciados, sem sequer se darem ao trabalho de formular outra inicial, copiaram na íntegra a anterior, preservando, inclusive, a formatação e o tipo de letra ali utilizados e interpuseram "nova" ação de alvará judicial, desta feita na Comarca de Várzea Grande, na qual sabiam, desde o princípio, que lograriam êxito, já que contavam com a atuação ilícita do magistrado, que aderira à inescrupulosa trama", relatou o procurador Paulo Rocha.
Depois disso, o próprio juiz Fernando Miranda Rocha teria sido responsável em distribuir o processo para si mesmo, bem como determinado que o Ministério Público Estadual se manifestasse sobre o pedido. Desta vez, o então promotor José Zuquetti deu parecer favorável aos acusados.
De acordo com a denúncia, a permuta dos imóveis teria rendido a Alcione R$ 40 mil. Desse valor, R$ 20 mil teriam sido repassados à esposa do juiz, a título de honorários advocatícios, mesmo que a peça protocolada na Justiça de Várzea Grande tenha sido assinada por outro advogado.

Relata, ainda, que a denúncia foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça de MT e há recurso pendente de julgamento no STJ.

Embora o fato possa merecer investigação, desde logo ressalta a gravidade da acusação em pechar de “feirante” um juiz de direito que tenha deferido um pedido de alvará para venda ou permuta de bem de menor – em processo judicial que contou com o prévio parecer favorável do promotor de justiça que oficia no juízo denunciado – sem que qualquer medida tenha sido adotada também quanto ao referido promotor.

Parece à toda evidência tratar-se de uma denúncia temerária que remete à questão do abuso do poder ministerial de acionar e peticionar.

A propósito, o jornal O Estado de São Paulo, publicou também ontem, o seguinte editorial:

Numa iniciativa inusitada na história da instituição, a Advocacia-Geral da União (AGU) anunciou a decisão de processar por improbidade administrativa procuradores da República e promotores do Ministério Público (MP) do Estado do Pará que, no exercício de suas funções, entrarem com medidas judiciais para tentar impedir a construção da Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu. A medida foi decidida numa reunião entre o presidente Lula e o chefe da AGU, Luís Inácio Lucena Adams, e a justificativa é que promotores e procuradores, que não levarem em conta a licença ambiental prévia dada pelo Ibama para a realização da obra, estariam procurando "impor seu entendimento pessoal aos demais agentes do Estado".
Para Adams, em vez de se ater à função de zelar pela ordem jurídica, que lhes é atribuída pela Constituição, esses promotores e procuradores estariam abusando de suas prerrogativas "por meio de ações sem fundamento, destinadas exclusivamente a tumultuar a consecução de políticas públicas relevantes para o País". Segundo o chefe da AGU, alguns setores do Ministério Público Federal e paraense estariam agindo de forma "preconceituosa e desprovida de análises técnica e jurídica consistentes", criando "embaraços a empreendimentos governamentais".
A rigor, o caso é idêntico ao que aconteceu na época do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, quando alguns procuradores simpatizantes do PT não mediram esforços para tentar inviabilizar a privatização de bancos e empresas estatais. A diferença é que, naquela época, o governo conseguiu derrubar judicialmente as liminares concedidas pelos tribunais, enquanto agora ele optou pela intimidação do Ministério Público. A estratégia é tão autoritária quanto as pressões que têm sido feitas pelo presidente Lula sobre o Tribunal de Contas da União, para levar o órgão a ser mais leniente na fiscalização das obras do PAC.
Como era de esperar, as entidades que defendem os interesses corporativos dos promotores, a cúpula do Ministério Público paraense e o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, manifestaram-se imediatamente contra a iniciativa da AGU. Eles acusaram o governo de estar recorrendo à coerção para acuar órgãos de controle e fiscalização, afirmaram que a licença ambiental concedida pelo Ibama carece de fundamentação jurídica e, com apoio do Conselho Indigenista Missionário, prometeram ajuizar mais ações contra a construção da Hidrelétrica de Belo Monte. O embate esquentou ainda mais depois que Gurgel distribuiu nota lembrando a autonomia funcional que foi concedida pela Carta de 88 ao Ministério Público. A instituição tem a missão de impugnar atos do poder público que afrontem dispositivos constitucionais, diz a nota.
Todos esses argumentos seriam irretorquíveis se a Procuradoria-Geral da República e os Ministérios Públicos estaduais exercessem de modo absolutamente isento e objetivo a função de zelar pela ordem jurídica e defender os chamados "direitos indisponíveis". Não é o que acontece. Continuam ocorrendo nos Estados abusos semelhantes aos praticados por alguns procuradores da República na década de 1990, quando fizeram sucessivas denúncias infundadas contra o governo federal para macular a imagem de seus dirigentes e criar fatos políticos que favorecessem eleitoralmente determinadas agremiações partidárias.
Desde que a Constituição de 88 converteu o Ministério Público num poder autônomo, vários promotores e procuradores estaduais passaram a se imiscuir abertamente nas disputas políticas locais e regionais. O comprometimento da isenção e imparcialidade da instituição chegou a ser reconhecido implicitamente em 2007, quando o Conselho Nacional do Ministério Público, órgão encarregado do controle externo da instituição, suspendeu o procurador Luis Francisco Souza e aplicou pena de censura ao procurador Guilherme Schelb, por abuso de poder.
Na realidade, nenhuma das partes está com a razão nesse entrevero sobre a Usina de Belo Monte. De um lado, é evidente que a AGU está tentando coagir o Ministério Público. De outro, a cúpula desta instituição está sofrendo as consequências de não ter agido com rigor, no passado, contra seus integrantes que usaram as prerrogativas funcionais com objetivos políticos ou ideológicos.

Há muita gente arrependida dos poderes concedidos ao M.P.
 
Se a instituição continuar permitindo que seus membros desviem de suas atividades constitucionais ou delas abusem para se imiscuir na política e em perseguições pessoais outra alternativa não restará senão corrigir os desmandos por uma reforma constitucional como fizeram com a Reforma do Judiciário, uma vez que o Conselho Nacional do MP tem sido um órgão absolutamente apagado.
 
E se reforma houver, obviamente, será para restringir sua atuação e quem sabe até mesmo sua autonomia. Vale lembrar o velho adágio popular:"Quem nunca comeu melado, quando come se lambusa. E, ao que tudo indica, estão lambusando demais.

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