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02 março 2009

SEAN UMA CRIANÇA NORTE-AMERICANA EM DISPUTA (CAP. 10)

Na última quinta-feira (26/02) o UOL transcreveu reportagem do jornalista Kirk Semple, do NEW YORK TIMES, sobre o caso SEAN, como possível de gerar um incidente diplomático entre Brasil e Estados Unidos em razão da não definição da situação da criança que permanece no Brasil desde 2004.

A justiça brasileira não vem aplicando corretamente a Convenção de Haia, conforme já me referi em post anterior e a prova disso foi a reunião ocorrida no Supremo Tribunal Federal com todos os que tem participação no cumprimento da Convenção de Haia para o combate de Seqüestros de Crianças.

Quando penso no caso desse menino me dá a impressão que a coisa vai se encaminhando no Brasil “mutatis mutandis” como se desenrolou na Turquia no famoso caso que resultou no filme “O Expresso da Meia Noite”. Pela via da “socio-afetividade” podem cassar a cidadania e até a ancestralidade do menino, o que seria um crime contra os direitos humanos do menor. Ora, nem a Constituição Federal e nem o Código Civil do Brasil estabelecem qualquer proteção para a filiação por afeto. É fruto meramente de forte corrente doutrinária e jurisprudencial.

De outro lado, tenho receio dessa nova moda brasileira da “paternidade sócio-afetiva”, que, a meu juízo, somente pode ser admitida em caso de comprovada rejeição e recusa do pai biológico em reconhecer ou cuidar do filho. Jamais para se opor ao pai biológico que cumpre com seus deveres paternos.

Enfim, quatro anos e meio já se passaram. Enquanto se discute daqui e dali, muita coisa aconteceu. A mãe casou de novo, faleceu no parto, deixando uma filha, com quase seis meses de idade. Sean ganhou uma meia irmã brasileira. Ele já vive no Brasil mais tempo do que viveu nos Estados Unidos. Tem amigos e vive em outro ambiente. Tudo isso com a proteção da lei brasileira. Interessante que a Convenção de Haia foi criada justamente para evitar essas situações. Os casos devem ser resolvidos no máximo em seis meses. E não se discute guarda ou qualquer outra coisa. Apenas a devolução da criança que saiu ilegalmente ou permaneceu ilegalmente em país diverso daquele que residia.

A verdade é que quanto mais tempo passa, as coisas se tornam mais delicadas. Só prolonga sofrimentos. (E quando esse menino crescer e souber de tudo, como reagirá? Só Freud para responder, e olhe lá).

O jornal “A Tribuna”, ES, de ontem (01/03) traz reportagem de página inteira (fls. 24) intitulada “Criança causa crise diplomática” destacando que o caso ganhou repercussão nacional nos Estados Unidos e se transformou em saia-justa diplomática para o Brasil.

Ressalta, ainda, que já foi tema de reportagem no programa Dateline, da NBC, no The New York Times e vai ao ar em breve na CNN, que esteve com Goldman na quinta-feira (26/02). Também já foi objeto de conversações entre a Secretária Hillary Clinton com o ministro das Relações Exteriores Celso Amorim na quarta-feira (25/02) e deverá entrar na pauta do encontro de Lula e barack Obama, dia 17/03, em Washington.

Tudo isso causado pela justiça macunaímica brasileira que não tratou o caso com a necessária brevidade nem de acordo com a Convenção de Haia.

O problema é muito sério e requer uma solução mais do que urgente!

Veja a reportagem abaixo:


The New York Times
26/02/2009 - 00h01

Batalha legal por uma criança abala laços entre duas nações

Kirk Semple*

Quando a mulher de David Goldman, Bruna, e seu filho de quatro anos, Sean, embarcaram em um avião no Aeroporto Internacional de Newark Liberty em junho de 2004, David Goldman planejava unir-se a eles uma semana depois, no Rio de Janeiro. Vários dias depois, Bruna Goldman ligou e disse que queria o divórcio. Ela estava no Brasil, seu país natal, assim como o menino, segundo ela.

Com o telefonema, a família de Goldman entrou em um caso notório de sequestro internacional e custódia que continua em tribunais americanos e brasileiros e agora chegou ao seu mais alto nível no governo Obama.

Desde que o menino entrou naquele avião, David Goldman só viu seu filho, hoje com 8 anos, uma vez em um rápido encontro no Rio neste mês. E nunca mais viu sua mulher, que morreu de complicações do parto da filha de seu segundo marido, o advogado que a representou contra David Goldman.

O caso tornou-se um ponto delicado no relacionamento entre os Estados Unidos e o Brasil e pode estar na agenda da secretária de Estado Hillary Rodham Clinton quando reunir-se com Celson Amorim, ministro de relações exteriores do Brasil, preparar o encontro marcado para o próximo mês entre o presidente Barack Obama e o presidente brasileiro Luis Inácio Lula da Silva, dizem antigos e atuais membros do Departamento de Estado.

O centro do problema diplomático está na forma como Brasil lidou com o caso, previsto por um tratado internacional que trata de sequestro de crianças.

"Se esta fosse uma disputa sobre a recuperação de um artefato ou de um documento da história dos EUA, então seria infeliz, mas aceitável permitir que anos se passassem enquanto o caso fosse julgado em cortes locais. Mas se você está lidando com uma criança que foi privada do contato com o pai por quatro anos e meio, o tempo é o inimigo", disse Bernard W. Aronson, ex-subsecretário de Estado para assuntos interamericanos que vem aconselhando Goldman.

O caso gerou considerável atenção da mídia. Uma série de páginas de Facebook e MySpace e um site da Web, BringSeanHome.org, foram criados para apoiar Goldman. Duas resoluções estão pendentes no Congresso americano exigindo que o Brasil repatrie Sean.

David Goldman conheceu Bruna Ribeiro quando era modelo em Milão, Itália, em 1997; ela estava estudando moda. Eles se casaram em 1999 e se mudaram para Tinton Falls, Nova Jersey. Bruna Goldman deu à luz a Sean em 2000.

David Goldman, 42, que agora trabalha como capitão de barco de pesca, agente imobiliário e modelo, disse que não tinha idéia que sua mulher estava infeliz até o dia 20 de junho de 2004, quando ela ligou pedindo o divórcio e a custódia definitiva de Sean. "Não tinha a menor idéia", disse ele em entrevista telefônica na semana passada. Em agosto de 2004, um juiz da Suprema Corte de Nova Jersey concluiu que os esforços de Bruna Goldman para manter Sean no Brasil eram "criminosos" e determinou a imediata repatriação do menino.

No início de setembro, depois que Bruna Goldman não cumpriu a ordem do juiz, o advogado de David Goldman notificou o Escritório de Questões da Criança no Departamento de Estado que ajuda os americanos em casos de sequestro de crianças. Os EUA e o Brasil estão entre 68 países que assinaram um tratado, chamado Convenção de Sequestro de Haia, que fornece um mecanismo para os países signatários resolverem casos de sequestros internacionais de crianças.

Sob a convenção, os países concordam que uma criança que foi removida por um dos pais de um país signatário e retida em outro país signatário em violação dos direitos custodiais do outro pai deve ser prontamente devolvida. Depois que a criança é devolvida, a disputa pela custódia pode ser resolvida nos tribunais daquele país. O tratado determina onde casos de custódia devem ser ouvidos, mas não tenta determinar quem deve ficar com a custódia.

O Departamento de Estado submeteu o caso ao governo brasileiro, em busca de cooperação para o retorno de Sean.

David Goldman também moveu uma ação no Brasil para a repatriação de Sean, citando a Convenção de Haia. Em outubro de 2005, um juiz federal no Rio, Fabio Tenenblat, escreveu em uma decisão que a "transferência ou retenção de Sean no Brasil ocorrera ilegalmente" sob as leis de Nova Jersey.

Entretanto, Tenenblat citou uma cláusula no tratado que permite que uma autoridade judicial mantenha a criança no segundo país se "for demonstrado que a criança agora está estabelecida em seu novo ambiente" e se mais de um ano se passou desde o sequestro e o início da ação legal no segundo país.

Sean frequentava uma das melhores escolas do Rio, tinha muitos amigos e era uma "criança normal e feliz", disse Tenenblat.

Os advogados de David Goldman moveram recursos até a Suprema Corte Federal do Brasil, argumentando, entre outros pontos, que sua moção sob a Convenção de Haia tinha começado dentro de um ano do sequestro de Sean, disse Patrícia E. Apy, sua advogada em Nova Jersey.

Com o desdobramento da batalha legal, Bruna Godlman conseguiu o divórcio no Brasil e casou-se com seu advogado, João Paulo Lins e Silva, filho de um famoso advogado de família do Rio. Em agosto de 2008, com o caso pendendo na Suprema Corte, ela morreu no parto da filha.

Dias depois, Goldman voou para o Brasil para pedir a custódia do filho, mas um juiz de família deu a guarda e a custódia de Sean para Lins e Silva para "garantir plenamente o desenvolvimento pessoal e emocional" de Sean. A corte também negou o pedido de Goldman para visitar o filho.

Goldman disse que foi ao Brasil oito vezes. "Toda vez, basicamente, sou chutado e enviado para casa", disse ele.

Lins e Silva disse em mensagem eletrônica que a lei brasileira o proíbe de comentar o caso e transferiu todas as perguntas aos seus advogados. Autoridades americanas estão cada vez mais frustradas com o Brasil pela forma que está lidando com o caso e acreditam que Sean há muito deveria ter sido repatriado aos EUA

Várias autoridades americanas em Washington e no Brasil -inclusive congressistas, membros de alto nível do Departamento de Estado e o embaixador americano em Brasília- reuniram-se com Goldman nos últimos meses para orientá-lo e expressar seu apoio.

O Departamento de Estado denunciou o Brasil pelos últimos três anos por não cumprir o tratado de abdução. O departamento culpou os tribunais brasileiros por tratarem casos de Haia erroneamente como disputas de custódia, desnecessariamente atrasando os processos e demonstrando injusta parcialidade em benefício dos cidadãos brasileiros, especialmente de mães

"Os juízes não entendem o que é pedido deles, que é garantir o tratado internacional", disse uma autoridade do Departamento de Estado que pediu anonimato, porque as regras do departamento a proíbem de falar à imprensa.

Há atualmente cerca de 50 casos da Convenção de Haia não resolvidos envolvendo crianças sequestradas dos EUA e mantidas no Brasil, disse o Departamento de Estado. No dia 9 e 10 de fevereiro, Goldman teve permissão para visitar Sean por um total de 12 horas.

Os encontros ocorreram nas áreas comuns do complexo residencial onde mora Lins e Silva. Membros do consulado americano observaram os encontros à distância; a cada dia, Sean foi acompanhado por um psicólogo e um homem de 30 e poucos anos que se descrevia como "amigo" de Sean, disse Goldman.

"Depois de quatro anos de separação, nosso laço não estava rompido, mesmo sob circunstâncias extremamente tensas", disse Goldman, acrescentando que os dois jogaram basquete, nadaram e viram fotografias de família dos anos de Sean em Nova Jersey.

Neste mês, o caso voltou para a corte federal brasileira onde, segundo advogados de Goldman, será tratado como assunto da Convenção de Haia e não um caso de custódia.

Goldman, contudo, disse que estava se preparando para mais desapontamentos. "Já desci essa rua -ou subi essa montanha", disse ele, esgotado. "Ainda acordo todos os dias em casa, e meu filho não está dormindo na cama dele."

* Alexei Barrionuevo contribuiu do Rio de Janeiro, Brasil.

Tradução: Deborah Weinberg

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