Translate

02 dezembro 2009

CONTEÚDO JURÍDICO DO MEIO DE PROVA MORALMENTE LEGÍTIMO-3/5


Parte 3/5


CONTEÚDO JURÍDICO DO MEIO DE PROVA MORALMENTE LEGÍTIMO PREVISTO NO ARTIGO 332 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL:  O USO DO SÊMEN COLETADO NA REPRODUÇÃO ASSISTIDA

Andrea Carla Veras Lins
Advogada da União. Pós-graduanda em processo civil pela Faculdade de Negócios de Sergipe, integrante da comissão de advocacia pública da Ordem dos Advogados do Brasil/SE.

2 DIREITO À IDENTIDADE GENÉTICA COMO EXPRESSÃO DO DIREITO DA PERSONALIDADE

Por certo que nas últimas décadas houve uma mudança na concepção e objetivos de vida das pessoas, especialmente das mulheres, que passaram a colocar o sucesso e realização profissional em primeiro lugar, não mais existindo, tão somente, a idéia da dona-de-casa exclusiva.

Mas não só para as mulheres houve sensível rompimento de paradigmas e tabus. Os homens passaram a aceitar a idéia da contribuição da mulher na economia doméstica, sem contar a verdadeira invasão na vida do cidadão da internet e sites de busca, com uma quantidade infinita de informações.

Por óbvio que o desenvolvimento tecnológico, e em especial as técnicas de reprodução assistida, só tem razão de ser se voltadas para o bem-estar humano.

Como bem esclarece Uadi Lâmego Bulos(9), a biociência e a sucessão de filhos gerados por inseminação artificial fazem parte dos direitos fundamentais de quarta geração, portanto merecem e impõem um tratamento específico de todas as esferas de Poder, inclusive do Poder Legislativo.

Essas questões são de suma importância para entender-se quão relevante tornou-se a discussão do direito à identidade genética, como efetivação do direito da personalidade, cuja disciplina consta explicitamente nos artigos 11 a 22 do Código Civil. Isso porque, a Constituição Federal e o Código Civil asseguram o direito ao nome e à intimidade. Por conta disso, o doador de sêmen fica anônimo, constando, tão somente, seus dados e características, que viabilizarão a escolha.

É uma forma de proteger aquele que doa e não quer ser identificado, quanto aquele ser gerado, que criará um vínculo de afeto com os pais com os quais conviverá.

Entretanto, há uma diferença sensível entre “o não poder saber” e o “não querer saber”, como lembra Selma Rodrigues Peterlle(10). Há de se questionar se o fato da criança, que posteriormente venha a ter conhecimento da sua origem biológica por meio de reprodução assistida, querer saber quem foi o doador, ou seja, seu pai biológico, não desnatura, nem destrói (em tese) a relação de afeto estabelecida. Novamente nos valemos da citada autora:

[...] A identidade pessoal é noção bem mais complexa e abrangente, com dois componentes, um referencial biológico, que é o código genético do indivíduo (identidade genérica), e um referencial social, este construído ao longo da vida, na relação com os outros.(11)

Por outro lado, há os que não aceitam a quebra do anonimato, por não haver certeza alguma de que o fato de a criança conhecer o pai biológico não afetará, efetivamente, uma relação de paternidade socioafetiva. Segundo a Resolução 1358/92 do Conselho Federal de Medicina, que instituiu normas éticas para a utilização da reprodução assistida, os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa.

Todas essas reflexões e questionamentos, que gravitam na ordem ética, influem para se pensar acerca da efetivação de um direito à identidade genética como direito à personalidade, garantido desde a concepção (art. 2° do Código Civil), inobstante existam os direitos à intimidade e privacidade, que seriam parcialmente afastados para permitir o uso do sêmen doado na comprovação do vínculo biológico.

Notas da Autora:

[9] BULOS, op.cit., p. 404
[10] PETTERLE, Selma Rodrigues. O direito fundamental à identidade genética na Constituição brasileira, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 118
[11] PETTERLE. op.cit., 2007, p. 111

Extraído da Revista Virtual da AGU, Ano IX nº 90, julho de 2009

Nenhum comentário: