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30 abril 2010

AUTODEFESA: POR UM NOVO MODELO


Parte 4 - Final


Paulo José Freire Teotônio

Promotor de Justiça em Ribeirão Preto. Professor de Direito Penal do Unicoc.

Rogério Luiz Adolfo Cury
Advogado e Professor.

Silvio Henrique Freire Teotônio
Advogado. Especialista em Direito Penal e Direito Público - Diretor da OAB/Cajuru.


Da participação efetiva de Advogado


Atualmente, é obrigatória a presença do defensor no interrogatório, prevendo a legislação processual penal, a seguir, o direito de entrevista prévia entre réu e defensor, rezando, ademais, a possibilidade de indicação pelas partes de fato que deva ser indagado ao réu.

Com a nova redação do CPP, destarte, ficaram afastadas quaisquer dúvidas sobre a necessidade de comparecimento do defensor ao interrogatório, pois se torna obrigatória sua presença, não podendo o juiz realizar o ato sem que o réu esteja acompanhado de sua defesa técnica, sob pena de nulidade.

Isso não representa, contudo, que o Advogado, principalmente os dativos, efetivamente estejam presentes quando do interrogatório, em razão de práticas já enraizadas e difíceis de serem modificadas.

Quanto à entrevista prévia, não exige a lei que a mesma seja realizada, tratando-se, em verdade, de direito (e não dever) do réu a possibilidade de entrevistar-se reservadamente com seu patrono, antes da realização do ato. Se já tiverem conversado em data pretérita ou se não quiser o réu exercer esse direito, nada obsta que o interrogatório seja realizado sem a entrevista imediatamente anterior à sua oitiva.

Ao contrário, sendo desejo do réu, deve o juiz assegurar local reservado para o referido encontro. De se observar, porém, que alguns acusados, por sua condição sócio-econômica ou cultural, não tem a menor idéia da garantia de tal direito, fator de aniquilamento da possibilidade e de minoração de suas prerrogativas processuais, as quais, por certo, estariam garantidas no caso de adoção do modelo proposto.

Considerações finais

O interrogatório judicial do acusado é tema bastante complexo e amplo no processo penal, não sendo possível esgotar o tema em trabalho que se pretendeu objetivo, razão pela qual optamos pela descrição das características e procedimentos desse ato, bem como de algumas inovações sobre o tema, como, verbi gratia, o disposto nos artigos 185 a 196 do CPP.

Nosso objetivo foi estudar, conhecer e assim abordar a natureza jurídica do interrogatório, podendo, a partir de então, expor a nossa tese sobre a possibilidade de modificação legislativa, que possa agasalhar a hipótese da apresentação da versão do réu por seu Advogado, constituído ou dativo, por escrito, quando da apresentação da defesa prévia, hipótese que se amolda aos princípios processuais referidos.

O interrogatório pessoal, face a face, a nosso ver, só seria necessário quando assim o entendesse o Magistrado, em casos excepcionalíssimos, quando entendesse relevante e pertinente a coleta de versão oral do réu, em face de eventuais peculiaridades do caso concreto submetido a julgamento.

A adoção do sistema proposto, ao contrário do que se poderia imaginar, conforme ficou sublinhado, caminha de encontro aos postulados mais basilares esculpidos na Constituição, no que pertine ao direito de defesa, a igualdade, o contraditório, servindo, ainda, para agasalhar o princípio da economia processual, descongestionando a pauta de audiências, diminuindo a necessidade da prática de inúmeros atos processuais irrelevantes à formação da convicção do Magistrado, afastando as confissões indevidas e o uso da mera confissão para aplicação de sanções penais.

Para tanto, concluímos que o ato processual em referência é exclusivo ato de defesa, muito embora previsto no capítulo da prova, posto que ao réu, principalmente, é facultado o direito de silêncio ou mesmo o direito de mentir.

De se observar, contudo, que a pesquisa realizada demonstrou uma divisão na doutrina sobre essa conceituação, uma vez que, para alguns, o interrogatório é meio de prova, enquanto que, para outros, meio de defesa, havendo, ainda, uma terceira corrente, que o qualifica como misto, sendo, portanto, meio de prova e de defesa.

Com o direito ao silêncio elevado à garantia fundamental do acusado pela CF/88, os defensores da tese de que se trata de meio de defesa, no entanto, ficaram bastante fortalecidos. Esse direito ao silêncio é a garantia de enfoque do interrogatório como meio de defesa. O interrogando pode calar-se sem que isso possa ser usado em desfavor da sua defesa.

Acreditamos que, para ser mais bem exercido como meio de defesa, o interrogatório convencional deveria ser descartado, permitindo-se que a versão do acusado sobre os fatos fosse fornecida por pessoa habilitada, com formação teórica e experiência prática para tanto, de forma escrita, desde que precedida de entrevista pessoal obrigatória com o imputado, propiciando o integral resguardo dos princípios constitucionais atinentes ao processo, além de possibilitar economia de recursos, diminuição da pauta de audiências criminais, bem como garantindo a efetividade da defesa e, portanto, a efetividade da Justiça, dogma tão propalado no mundo atual.

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Extraído de Magister/doutrina

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