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14 abril 2010

AOS PÉS DA LIBERDADE: UM ENSAIO SOBRE O USO DE ALGEMAS A PARTIR DA FILOSOFIA-3

Parte 3-Final




Bruno Rotta Almeida
Mestrando em Ciências Criminais pela PUC-RS. Advogado.


Considerações finais



A liberdade, desde sua interpretação jurídica (como direito fundamental) ou ainda filosófica, é demasiado importante para a aferição do ser humano. O direito à liberdade e a sua, por consequência, inviolabilidade decorrente da Constituição, é, talvez, posterior à noção de liberdade filosófica colocado aqui e trabalhado durante muito tempo por grandes pensadores pretéritos e também contemporâneos.

O uso de algemas, sem dúvida, afeta diretamente a liberdade do cidadão. Ainda mais quando injusta ou, também pior, quando destinada a um vexame desnecessário e improcedente. A liberdade de agir conforme sua vontade é inerente ao indivíduo, a partir da sua condição de ser um ‘ser humano’, com o perdão da redundância.

Podemos, além disso, trazer o fundamento da liberdade em razão da responsabilidade. A noção de algemas, neste caso, estará relacionada a uma concepção da ‘liberdade não livre’; da liberdade sem o chamado livre-arbítrio.

Em todo o caso, há de se ter, de qualquer forma, uma maior observação à ideia de liberdade, mesmo que condicionada e limitada na interface entre o ‘eu mesmo’ e o ‘outro’. Nas palavras de Kant, "temos que atribuir a todo o ser dotado de razão e vontade esta propriedade de se determinar a agir sob a ideia da sua liberdade". 18

Assim, indaga-se: em que medida uma intervenção na autonomia da vontade do ser humano não prejudica sua condição própria de ser um ‘ser humano’?

Se, na esteira do que já fora comentado neste ensaio, a liberdade caminha junto ao entendimento de ser humano, não podemos, de maneira alguma, extraí-la deste. Por outro lado, também não é defensável a concepção de levantarmos a liberdade em picos dos quais seria impossível permitir um andamento mais equilibrado da sociedade.

Temos, dessa forma, dois extremos, cujas funduras não devem ser exploradas. O entremundo desses extremos é o lugar onde a liberdade deve se colocar em razão do ser humano. Ou seja, este não poderá ter nem uma total e exclusiva ‘liberdade livre’, como também esta não pode ficar especialmente condicionada a um limite. Portanto, independente das situações, a noção de liberdade não pode ser abandonada, pois ela é senão o fundamento da condição do ser humano.

In fine, no caso em tela neste breve exame, as algemas, ao mesmo tempo, não podem ser direcionadas ao exclusivo fim de prejudicar e condicionar a liberdade da pessoa, como também deve respeitar a autonomia da vontade do ser humano. E é nesta autonomia, justamente, onde o conceito da liberdade se coloca como chave de toda a explicação.

Notas do Autor:


18 - KANT. Op. cit, p. 97.


Referências bibliográficas


BUENO, Francisco da Silveira. Grande dicionário etimológico – prosódico da língua portuguesa. Vocábulos, expressões da língua geral tupi-guarani. São Paulo: Saraiva,1974
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001
HERBELLA, Fernanda. Algemas e a dignidade da pessoa humana. São Paulo: Lex Editora, 2008,KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Trad. Paulo Quintela. Lisboa: Edições 70, 2004
SOUZA, Ricardo Timm de. Em torno à diferença: aventuras da alteridade na complexidade da cultura contemporânea. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008
______. Razoes plurais: itinerários da racionalidade ética no século xx. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004, p. 167 ss.

Extraído de Newsletter magister 1111,de 09/04/2010

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