O blog publica às sextas-feiras
decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de
Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele
dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos
julgados, até mesmo por questão de espaço, e nem com a identificação das
partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são
debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma
nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são
ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era
especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o
sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar
ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de
litígio.
Hoje o caso tratado é sobre avaria de produto em transporte
aéreo, como segue:
RECURSO INOMINADO Nº 7.569/05
ACÓRDÃO
EMENTA: RECURSO
INOMINADO. TRANSPORTE AÉREO. AVARIA EM MERCADORIA. DANO MORAL E MATERIAL
CARACTERIZADOS.
1.-A COMPANHIA DE AVIAÇÃO É
CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO DE
TRANSPORTE AÉREO E COMO TAL SUA RESPONSABILIDADE É OBJETIVA, NOS TERMOS DO
ART.37,§ 6º, CF, SUBSUMINDO-SE, AINDA, AS NORMAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR.
2.-CABÍVEL, PORTANTO, A
INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL QUANDO A BAGAGEM DE PASSAGEIRO DEVIDAMENTE
DESPACHADA SOFRE AVARIAS, NO VALOR CORRESPONDENTE AS MESMA.
3.-EM RAZÃO DO DANO EM SUA
BAGAGEM, O AUTOR TEVE QUE PERMANECER NO AEROPORTO DURANTE ALGUMAS HORAS DA
MADRUGADA TENDO EM VISTA A NECESSIDADE DOS TRÂMITES BUROCRÁTICOS, SEM OBTER
SOLUÇÃO PARA O PROBLEMA.
4.-SITUAÇÃO CONSTRANGEDORA
DEMONSTRANDO MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO E GERADORA DE DANO MORAL.
5.- REAJUSTE DO VALOR ARBITRADO A
TÍTULO DE DANOS MORAIS, EIS QUE O MESMO DEVE GUARDAR PROPORCIONALIDADE E
RAZOABILIDADE COM OS FATOS CONSTANTES DOS AUTOS E AJUSTADO AO PRINCÍPIO
PEDAGÓGICO/PUNITIVO DO INSTITUTO.
6.- RECURSOS CONHECIDOS E
IMPROVIDOS.
Vistos, relatados e discutidos
estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal
dos Juizados Especiais, à unanimidade, conhecer dos recursos para negar-lhes
provimento, nos termos do voto do Relator, que deste passa a fazer parte
integrante.
Vitória, ES, de fevereiro de 2006.
R E L A T Ó R I O
LUIZ GUSTAVO BUMACHAR BROTTO,
devidamente qualificado e representado por sua ilustre patrono, ajuizou Ação de
Reparação de Danos Morais e Danos Materiais em face de LINHAS AÉREAS S/A, alegando que, ao chegar no
aeroporto de Vitória, procedente de uma viagem internacional, verificou que uma
das garrafas de whisky compradas no “Free Shop” havia se quebrado, danificando
todas as demais garrafas que estavam dentro da caixa, num total de 12. Por tal
motivo, requereu indenização por danos morais a ser arbitrado pelo juízo, bem
como danos materiais com valor correspondente a nota de venda expedida no “Free
Shop”, correspondente a US$ 155,00.
Pela r. sentença de fls. 67/68,
restou acolhido o pedido formulado na inicial para condenar a empresa aérea ao
pagamento de danos morais no valor de R$ 3.000,00, bem como danos materiais no
importe de R$ 35,39.
Inconformadas, ambas as partes interpuseram recurso
inominado.
A companhia de aviação interpôs
recurso inominado a fls. 72/83, pugnando que a decisão combatida seja reformada
para excluir totalmente a condenação por danos morais, eis que incabível, não
se opondo, todavia, em reembolsar ao autor do valor correspondente à garrafa de
whisky quebrada, como consta da mesma decisão “a quo”, condenando o autor ao
pagamento de custas e honorários advocatícios na forma da lei, tudo como medida
de justiça.
De sua vez, o autor, a fls.
97/109, recorreu pretendendo seja reformada parcialmente a r. sentença de piso
majorando o valor condenatório, tanto a indenização por dano material quanto o
valor atribuído a título de danos morais, seguindo os ditames exarados na
presente peça processual. Ademais, pleiteou seja determinada a aplicação da
correção monetária sobre o valor total da condenação, utilizando-se como índice
correcional o INPC-IBGE, bem como juros moratórios a incidir a partir da data
do efetivo prejuízo.
Em contra-razões a fls. 110/127 o
autor requereu seja inalterada a r. sentença no que concerne ao presente
recurso, sem qualquer prejuízo ao pedido do recurso inominado apresentado pelo
ora recorrido concomitantemente à presente peça.
Contra-razões da empresa aérea a
fls. 203/215, pugnando seja negado provimento ao recurso interposto pelo autor,
para que não seja reformada a decisão “a quo” para elevar o valor da
indenização, devendo, pois, ser somente provido o recurso interposto pela ré,
pra reformar a sentença e excluir a condenação por dano moral nela imposta,
tudo como medida de justiça.
É o relatório.
V O T O
Ao exame dos autos, elementos e
documentos acostados, sobressai de forma clara e translúcida a falha na
prestação de serviço por parte da empresa aérea, geradora de dano material, em
razão da avaria causada na bagagem do autor (caixa de whisky).
O autor comprovou a fls. 19, que
adquiriu 12 caixas de whisky J Walker Red Label, conforme a nota de venda do
Free Shop do Aeroporto Internacional de São Paulo.
Há, ainda, comprovante de
reclamação efetivada pelo mesmo perante o DAC (Departamento de Aviação Civil),
segundo fls. 24.
Com efeito, é cediço na doutrina
e na jurisprudência que a relação estabelecida entre a pessoa que adquire um
bilhete de passagem e a empresa aérea é de consumo, sendo assim, aplicam-se as
regras estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor.
Desse modo, é dever da empresa
aérea fornecer serviços adequados, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa
do Consumidor, sob pena de responsabilidade pela reparação dos danos causados,
independentemente de culpa. Cuida-se, pois, de responsabilidade objetiva.
Logo, verifico que assiste razão
ao autor em relação ao dano material pleiteado, visto que restou devidamente
comprovada a avaria em uma das garrafas de whisky.
Entrementes, com respeito ao
valor da condenação em danos morais no valor de R$ 3.000,00, entendo que não
guarda proporcionalidade/razoabilidade com o caso sub júdice.
No caso dos autos, o passageiro
embarcou em São Paulo em 15/08/2004, às 22h15, procedente de viagem
internacional, com previsão de desembarque em Vitória, por volta de 23h45.
Contudo, em razão do dano em sua
mercadoria, o autor teve que permanecer no aeroporto durante algumas horas da
madrugada, em razão da exigência dos trâmites burocráticos a serem adotados.
Ademais, os fatos narrados
provocaram a necessidade de contratação de advogado para providências
necessárias, contatos com a companhia aérea, ajuizamento da ação, etc.
Tudo isso causa evidente
perturbação ao indivíduo, além da decepção com a quebra do produto
transportado, causando constrangimento, desgaste, ansiedade e sofrimento no
passageiro, elementos caracterizadores de dano moral indenizável.
Com base nessas considerações,
uma vez não requerida a minoração do valor da indenização quanto aos danos materiais
e, tendo em vista a evidente proporcionalidade do valor a ser ressarcido e o
valor aplicado na sentença, mantenho a condenação tal como fixado na decisão
monocrática, apenas reajustando o valor da indenização por danos morais para R$
1.000,00.
Portanto, nego provimento a ambos
os recursos, vez que a modificação do valor dos danos morais não implica em
modificação do julgado para efeito de sucumbência.
Custas “pro rata”, devendo cada
parte arcar com os honorários advocatícios do seu patrono.
Tais valores devem ser corrigidos
monetariamente a partir do ajuizamento da ação na forma da Lei nº 6.899/1981 e
com juros a contar da citação, nos termos do artigo 406 do Código Civil.
É como voto.
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