Translate

23 setembro 2011

INICIADA A EXECUÇÃO, INCABÍVEL EXTINGUÍ-LA POR SUPOSTA ILEGITIMIDADE ATIVA






O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados, até mesmo por questão de espaço, e nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.

Hoje o caso tratado refere-se a incidente de execução nos juizados especiais, como segue:

RECURSO INOMINADO Nº 7.235/05

ACÓRDÃO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. SENTENÇA EXTINTIVA DE EXECUÇÃO COM PRELIMINAR DE OFÍCIO POR SUPOSTA ILEGITIMIDADE ATIVA. IMPOSSIBILIDADE. SEGUNDA SENTENÇA NULA DE PLENO DIREITO. 
1.- EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL DECORRENTE DE AÇÃO DE COBRANÇA DE QUOTAS CONDOMINIAIS MOVIDA POR CONDOMÍNIO CONTRA CONDÔMINO.
2.-NO CURSO DA EXECUÇÃO, POR INICIATIVA DA PRÓPRIA JUÍZA, NOVA SENTENÇA É PROFERIDA EXTINGUINDO A EXECUÇÃO, SOB FUNDAMENTO DE ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM.
3.-SEGUNDA SENTENÇA NULA DE PLENO DIREITO POR MALFERIMENTO DAS CLARAS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NO ARTIGO 463 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E DA FARTA E INDISCREPANTE JURISPRUDÊNCIA PÁTRIA.
4.- RECURSO PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais, à unanimidade, conhecer do recurso para dar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator que deste passa a fazer parte integrante.
Vitória, ES,  de novembro de 2005.

 R E L A T Ó R I O

O Condomínio, devidamente individualizado e representado por suas ilustradas patronas, ajuizou ação de cobrança de cota-parte condominial e taxa de promoção em face de condômino nos termos da peça inicial.
Através da sentença de fls. 51 o pedido foi julgado procedente, tendo sido requerida a execução da sentença pela petição de fls. 52. Pelo despacho de fls. 54 foi determinada a expedição de mandado executório.
Entrementes, conclusos os autos, sobreveio nova sentença a fls. 66/67, com preliminar de ilegitimidade de parte ativa ad causam ex officio e julgou extinto o processo sem julgamento de mérito, na forma do art. 8º,§ 1º, da lei 9.099/95 e art. 257, VI, § 3º, do CPC c/c art. 598 por aplicação subsidiária.
Inconformado, o Condomínio interpôs recurso inominado a fls. 70/72, aduzindo que a sentença guerreada ignorou outra já transitada em julgado, devendo ser declarada sua nulidade, sendo infundada também a argumentação expendida de ser o recursante parte ilegítima para postular em Juizado Especial. Acostou pertinentes arestos às teses esposadas.
Regularmente intimado, conforme certificado a fls. 78 e verso, o recorrido deixou transcorrer “in albis” o prazo para apresentar contra-razões.
É o relatório.

                                               V O T O
Verificando que foram atendidos os pressupostos de admissibilidade, sobremodo diante da certidão de fls.70, entendo que o recurso deve ser conhecido.                   
                                                                       
A quaestio iuris versa sobre a possibilidade ou não da prolatação de sentença em sede de execução por suposta ilegitimidade da parte autora.

Há doutrinadores que sustentam que em sede de Juizados Especiais a execução se faz como um prolongamento do próprio processo de conhecimento.

Oportuna, na hipótese, a lição de SÉRGIO TORRES TEIXEIRA em seu interessante trabalho sob o título “Processo de Execução no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis”, quando assevera:

“A lei nº 9.099/95 adotou sistemática distinta, tratando-se de execução   fundada em  sentença condenatória proferida       por Juizado Especial Cível.
Novamente seguindo a linha da simplicidade procedimental, o legislador     estabeleceu   no inciso IV do art. 52 da Lei nº 9.099/95 que não cumprida           voluntariamente a sentença transitada em julgado, e tendo havido solicitação do      interessado, que poderá ser verbal, proceder-se-á desde logo à execução,       dispensando nova citação.
Uma vez caracterizada a falta de cumprimento voluntário da decisão após esta ter passado em julgado, basta a solicitação escrita ou verbal do interessado   para ter início a execução da sentença, sem necessidade de promover nova        citação.
A execução forçada fundada em sentença condenatória perante os Juizados           Especiais Cíveis, assim, assume materialmente a posição de fase processual     complementar à de cognição, dentro de uma mesma relação processual.    Inexiste, pois, a plena autonomia característica do processo de execução        tradicional, nos moldes previstos no CPC.” (IN “Procedimentos especiais cíveis : legislação extravagante”, Cristiano            Chaves de      Farias, Fredie Didier Jr.,      coordenadores. – São Paulo :     Saraiva, 2003, p. 570).

Nessa conceituação, inadmissível que após a sentença proferida no processo de conhecimento, que outra, de forma diversa, seja prolatada no procedimento de execução, porquanto não podem coexistir nesse prisma duas sentenças antagônicas no mesmo processo.

Por outro lado, considerando-se, como a maioria, que embora com procedimento diferenciado em alguns aspectos daquele traçado pelo Código de Processo Civil, a execução nos juizados especiais tem sua própria autonomia, também aí não se concebendo que a sentença exarada no processo de conhecimento seja anulada, pelo próprio juízo de onde se originou, pois atentaria contra o princípio da coisa julgada.

Discorrendo sobre “COISA JULGADA E AÇÃO ANULATÓRIA”, afiança JOSÉ ARNALDO VITAGLIANO:

Podemos concluir, assim, que resolvidos os recursos interpostos ou preclusos    os prazos para a interposição de qualquer impugnação contra a sentença, opera-       se o primeiro fenômeno que marca a sentença, ou seja, faz-se a coisa julgada formal.
Com a sua formação, a sentença adquire uma qualidade: a imutabilidade como      ato processual. Isto quer dizer que o mesmo Juiz que prolatou a sentença não a   pode mais modificar, visto que ela adquiriu os contornos de ato processual            imutável, inimpugnável, incontestável, portanto definido.
Com a ocorrência de tal fenômeno, todas as questões que constituem o cerne do   litígio, não só as que foram efetivamente deduzidas, como as que poderiam ter            sido alegadas mas não o foram, não podem mais ser objeto de argüição e de       apreciação. Neste sentido, soa o art. 474 do CPC.
Opera-se com as questões não argüidas, embora pudessem tê-lo sido, o fenômeno da preclusão, ou seja, a perda de um direito ou faculdade processual de alegar novamente aquelas questões.”
Enfim, constituída a coisa julgada formal, o Juiz cumpre e acaba o ofício jurisdicional ou, em outras palavras, o Estado entrega ao particular a prestação     jurisdicional que foi invocada, resultando, daí, que o litígio resta definitivamente composto, com a aplicação da vontade da Lei ao caso concreto”. (VITAGLIANO, José Arnaldo. Coisa julgada e ação anulatória . Jus         Navigandi, Teresina, a. 7, n. 72, 13 set. 2003). 

A jurisprudência sobre o tema é farta e indiscrepante no mesmo sentido, como se constata dos arestos abaixo:

Processo REsp 248805 / SP ; RECURSO ESPECIAL 2000/0014981-0
Relator(a) Ministra LAURITA VAZ (1120)
Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA
Data do Julgamento 02/03/2004
Data da Publicação/Fonte DJ 05.04.2004 p. 303
Ementa
RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA PUBLICADA. RECONSIDERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 
ART. 463 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA DE INEXATIDÕES MATERIAIS, ERROS DE CÁLCULOS 
OU OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1. Cuida-se do princípio da inalterabilidade da sentença balizado pelo art. 463, 
do Código de Processo Civil, que preconiza o encerramento do ofício jurisdicional 
do magistrado com a publicação da sentença, podendo ocorrer alterações, de ofício 
ou a requerimento da parte, desde que se verifique inexatidões materiais ou para 
retificar erros de cálculos; ou, ainda, por meio de embargos de declaração.

No mesmo sentido, confira-se o acórdão abaixo, observando-se que nem por 
provocação da parte seria possível a modificação do julgado, quanto mais 
por iniciativa do próprio juiz:

Processo AgRg no Ag 270917 / SP ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 1999/0101623-1
Relator(a) Ministro VICENTE LEAL (1103)
Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA
Data do Julgamento 18/06/2002
Data da Publicação/Fonte DJ 05.08.2002 p. 417
Ementa
PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ILEGITIMIDADE 
DE PARTE. EXCLUSÃO NA FASE DE EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. IMPUGNAÇÃO OPORTUNA. 
AUSÊNCIA. COISA JULGADA.
A legitimidade processual das partes é pressuposto de desenvolvimento válido e regular do 
processo, podendo ser causa de sua extinção sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, 
VI, CPC.
Incabível, na fase executória, a alegação de ilegitimidade passiva ad causam, em razão da 
ausência de oportuna impugnação.
Matéria que se encontra preclusa é inatacável porque protegida pelo manto da coisa julgada.
Agravo Regimental desprovido.
 
Portanto, uma vez proferida sentença o juiz cumpre exaure seu ofício jurisdicional não podendo mais inovar, salvo as hipóteses de erro material o que não é a hipótese dos autos.

Desnecessária qualquer perquirição sobre a motivação contida na sentença, eis que nenhum motivo autoriza a prolatação de duas sentenças no mesmo processo e no mesmo grau de jurisdição.

Assim, cumpre decretar a nulidade da sentença hostilizada por malferir expressa disposição legal, ou seja, o artigo 463 do Código de Processo Civil, que assim dispõe:

            Art. 463.  Ao publicar a sentença de mérito, o juiz cumpre e acaba o ofício   jurisdicional, só podendo alterá-la:
I - para Ihe corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais,   ou Ihe retificar erros de cálculo;
            II - por meio de embargos de declaração.

Por tais razões, dou provimento ao recurso, devendo os autos retornarem ao juízo de origem para que se prossiga regularmente na execução.

Sem ônus sucumbenciais.

É como voto.

Nenhum comentário: