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11 novembro 2011

CESSÃO DE CRÉDITO EXIGE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO RESTRITIVO. DANO MORAL.






O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.

Hoje o caso tratado refere-se à inscrição indevida em cadastros restritivos de crédito por empresa de fatoring, como segue:

RECURSO INOMINADO Nº 6.472/05
ACÓRDÃO
EMENTA: RECURSO INOMINADO. INSCRIÇÃO DE NOME DE ALUNO NO SPC E SERASA FEITA POR EMPRESA DE FACTORING POR MENSALIDADE ESCOLAR JÁ PAGA À FACULDADE. DANO MORAL CARACTERIZADO. 
1.-A CESSÃO DE CRÉDITO FEITA PELA FACULDADE A EMPRESA DE FACTORING  NÃO TEM EFICÁCIA PERANTE O ALUNO VEZ QUE FEITA SEM SUA ANUÊNCIA E CIÊNCIA POR ESCRITO, NOS TERMOS DO ARTIGO 290 DO CÓDIGO CIVIL.  
2.-A INSCRIÇÃO INDEVIDA DE NOME DO CONSUMIDOR EM CADASTROS NEGATIVOS DE CRÉDITO (SPC,SERASA,ETC) GERA DANO MORAL INDENIZÁVEL. 
3.-O VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS QUANDO ARBITRADO ARBITRADO COM PONDERAÇÃO E TENDO EM CONTA AS ORIENTAÇÕES DA DOUTRINA E DA JURISPRUDÊNCIA MERECE SER MANTIDO.
4.- RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais, à unanimidade, conhecer do recurso para negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator que deste passa a fazer parte integrante.
Vitória, ES,       de junho de 2005.

RELATÓRIO

O autor compareceu pessoalmente perante o Primeiro Juizado Especial Cível de Cariacica, alegando que firmou contrato de prestação de serviços educacionais com a Faculdade e esta negociou as mensalidades de seus alunos com empresa de factoring. Aduziu, mais, que a Faculdade solicitou que o último pagamento da semestralidade fosse pago em sua tesouraria, o que foi feito. Entretanto, recebeu cobranças da empresa de factoring que inclusive colocou seu nome no SPC e SERASA, razão pela qual requereu indenização por danos morais.
Regularmente instruído o feito, sobreveio a r. sentença de fls. 35/37, que julgou procedente em parte o pedido, para condenar as requeridas a pagar a quantia de R$ 800,00 (oitocentos reais) a título de indenização por danos morais, corrigidas a partir do ajuizamento da ação e com juros legais a partir da citação e julgou improcedente o pedido contraposto formulado pela empresa de factoring.
Inconformada, a empresa de factoring, interpôs recurso inominado a fls. 55/60, sustentando que, em face da revelia, apenas a primeira requerida deveria ter sido condenada, que os registros nos órgãos de proteção ao crédito foram legais, que agiu de boa fé, inexistindo responsabilidade solidária, propugnando pela reforma da r.sentença atacada para isentar a ora recorrente de toda a condenação a ela imposta, bem como para condenar o recorrido no pagamento do débito, na forma do pedido contraposto ou seja reduzido o valor arbitrado a título de danos morais.
O recorrido foi intimado por telefone (certidão de fls.64), mas não apresentou contra-razões.
É o relatório.

V O T O
        
Verificando que foram atendidos os pressupostos de admissibilidade, sobremodo diante das certidões de fls. 61 e 64, conheço do recurso.                  
                                                                        
O recorrido, na qualidade de aluno da Faculdade, firmou com ela “Contrato de Prestação de Serviços Educacionais” (fls. 05), referente ao primeiro semestre do ano de 2004 do Curso de Administração.

Referido contrato, a meu ver, encontra-se eivado de abusividade, como a cláusula segunda que exigiu a assinatura de duplicatas e a posterior concordância com a cessão do crédito para instituições financeiras, bem como a que determina o pagamento de metade do valor contratado em caso de rescisão. Tais imposições não encontram amparo legal, são draconianamente abusivas e, portanto, sem qualquer valor jurídico.

Ainda assim, a Faculdade “negociou” tais duplicatas com a segunda requerida , empresa de factoring, através de contrato em que o recorrido não anuiu e, portanto, dele não faz parte e não pode ser penalizado em decorrência de seu eventual inadimplemento.

Tendo sido solicitado pela Faculdade para pagar a última mensalidade do semestre em sua Tesouraria, o aluno, como qualquer outro na mesma situação, atendeu a tal solicitação, em face do contrato firmado com tal instituição, conforme comprovado pelo documento de fls.07.

Não se pode olvidar que a cessão de crédito somente pode ter eficácia em relação ao devedor quanto o mesmo declara expressamente ter ciência da cessão, consoante dispõe a legislação civil codificada em seu artigo 290,  “verbis”:

Art. 290 – A cessão de crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quanto a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.”

Inexistindo manifestação escrita do recorrido, a este não pode ser imputada dívida de mensalidade escolar que, no vencimento, promoveu o pagamento perante a secretaria Faculdade.

A revelia da primeira requerida em nada abona ou i8senta a recorrente de sua responsabilidade.

A recorrente, ao invés de acionar a Faculdade, preferiu lançar o nome do recorrido no SERASA e no SPC (fls. 08 e 09), por dívida já quitada perante a Faculdade. Evidente que tal fato causou ao recorrido enorme dano consistente em abalo psíquico, além de manchar seu bom nome, sendo tal fato, por si só, capaz de gerar indenização por dano moral, nos termos da pacificada jurisprudência sobre a matéria, especialmente do STJ:

Processo RESP 720364 / AL ; RECURSO ESPECIAL 2005/0013527-4
RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES.

“A jurisprudência do STJ é no sentido de que a indevida inscrição em cadastro de inadimplentes gera dano moral suscetível de indenização, dano que se presume ocorrido com a prova da referida inscrição.”

Com respeito ao “quantum” arbitrado, entendo que guarda proporcionalidade/razoabilidade com o caso “sub judice”, desmerecendo qualquer decote.

Por fim, importa consignar que, analisando processo semelhante, esta Turma adotou o mesmo posicionamento no RI 6.439/05.

A recorrente pagará as custas processuais. Sem condenação em verba honorária porquanto não houve apresentação de contra-razões. 

É como voto.

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