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01 fevereiro 2013

BEM DURÁVEL COM DEFEITO DEVE SER LOGO SUBSTITUÍDO

O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.

Hoje a questão versa sobre direito do consumidor referente à aquisição de bem durável, nos termos abaixo:

RECURSO INOMINADO Nº 7.468/05
ACÓRDÃO
EMENTA: RECURSO INOMINADO. AQUISIÇÃO DE BEM DE CONSUMO DURÁVEL. DEFEITO NA INSTALAÇÃO DO PRODUTO. ENCAMINHAMENTO À ASSISTÊNCIA TÉCNICA. PRÁTICA CONDENÁVEL NOS TERMOS DO CDC.
1.- SE O BEM ADQUIRIDO APRESENTOU DEFEITO QUANDO DE SUA INSTALAÇÃO, DEVERIA A EMPRESA TROCAR POR OUTRO DE IGUAL QUALIDADE E NÃO ENCAMINHAR O CONSUMIDOR PARA ASSISTÊNCIA TÉCNICA, SOMENTE EFETUANDO A TROCA OITO DIAS DEPOIS.
2.-ALÉM DISSO, SE O GERENTE DA EMPRESA LIGA PARA O CONSUMIDOR SUPONDO QUE O MESMO FICOU COM O PRODUTO DEFEITUOSO E O NOVO PRODUTO, ACUSANDO-O DE PRÁTICA DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA E TAL FATO NÃO OCORREU, RESPONDE A EMPRESA POR ESTA ILICITUDE, QUE CARACTERIZA DANO MORAL.
3.-NÃO MERECE REDUÇÃO O VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL QUANDO ARBITRADO COM PONDERAÇÃO, TENDO EM CONTA O PORTE ECONÔMICO DAS PARTES, A SITUAÇÃO RETRATADA NOS AUTOS E O CARÁTER PUNITIVO/PEDAGÓGICO DO INSTITUTO. 
4. RECURSO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, à unanimidade, conhecer do recurso e negar provimento, para manter a sentença impugnada, nos termos do voto do Relator que deste passa a fazer parte integrante.
Vitória, ES,       de novembro de 2005.

RELATÓRIO
 
O autor compareceu pessoalmente perante o 2º Juizado Especial de Vitória alegando que adquiriu um aparelho de ar refrigerado numa das filiais da rede de lojas da empresa requerida, porém ao ligar o aparelho em sua casa percebeu que o mesmo estava com defeito, tendo levado à assistência técnica e lá emitido um laudo e encaminhado a loja. Dirigiu-se à loja e recebeu outro aparelho de igual marca e modelo, porém, alguns dias depois um funcionário da requerida ligou para sua residência alegando que ele havia retirado mercadoria da loja e isso seria apropriação indébita constituindo caso de polícia. Requereu indenização por danos morais, atribuindo à causa o valor de R$ 5.200,00.
Regularmente instruído o feito, sobreveio a r. sentença de fls. 14/16, que julgou procedente o pedido, condenando a requerida ao pagamento de R$ 1.000,00, a título de danos morais.
Irresignada, a empresa requerida interpôs recurso inominado a fls. 40/48, pretendendo a reforma da sentença para afastar a condenação em danos morais ou que seja arbitrado um novo valor indenizatório, inferior ao já arbitrado.
O recorrido apresentou singelas contra-razões a fls. 53/54, requerendo seja negado provimento ao recurso.
É o relatório.
 
V O T O
              
Trata-se de evidente relação de consumo, dispondo a respeito o Código de Defesa do Consumidor:
“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo    duráveis ou não duráveis respondem solidariamente         pelos vícios de qualidade ou quantidade que os        tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que       se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a          indicações constantes do recipiente, da       embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária,     respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a         substituição das partes viciadas.” 
 
Portanto, quando o produto adquirido apresenta defeito e tal defeito não é solucionado, a lei faculta ao consumidor exigir do fornecedor a substituição do produto, a devolução da importância paga ou o abatimento proporcional do preço.
 
Numa sociedade de consumo como a que vivemos a psicologia explica que ao adquirir um produto novo o consumidor sente a sensação agradável de haver satisfeito um desejo, muitas vezes aguardado por muito tempo.
 
Obviamente que há enorme frustração quando o produto adquirido apresenta defeito, que se agrava quando o vendedor não procura imediatamente solucionar o problema, trocando o produto por outro com as mesmas qualidades.
 
Ninguém em sã consciência vai se sentir confortável em adquirir um produto novo e ser encaminhado à assistência técnica porque o produto não funcionou adequadamente. É inaceitável tal prática, caracterizando verdadeiro abuso econômico.
 
Mais grave ainda, quando o consumidor é surpreendido com telefonemas por funcionário da loja afirmando que houve apropriação indébita e que isso é caso de polícia. Tal situação causa evidente transtorno e constrangimento ao consumidor, caracterizando dano moral indenizável, nos termos do Código de Defesa do Consumidor que assegura efetiva reparação, “verbis”:
 
            Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
            ...
           VI - a efetiva prevenção e reparação de danos   patrimoniais e morais, individuais, coletivos e  difusos;
No caso dos autos restou comprovado que o consumidor adquiriu um aparelho de ar condicionado novo que apresentou defeito e a recorrente em vez de promover a imediata troca, o encaminhou para a assistência técnica, tendo o consumidor ficado privado de seu uso por oito dias.

Ficou demonstrado, ainda, que houve a troca por outro produto, porém, por desorganização administrativa da requerida, o então gerente ligou para o recorrido afirmando que o mesmo praticou o crime de apropriação indébita, sendo caso de polícia,  por supor que o recorrido tivesse ficado com o aparelho que estava na assistência técnica e com o outro que retirou posteriormente da loja. Essa situação é evidentemente geradora de dano moral.
 
O valor arbitrado é razoável, tendo em conta o porte econômico da recorrente e o caráter punitivo/pedagógico do instituto, estando em consonância com as circunstâncias descritas nos autos, não havendo qualquer razão plausível para reduzi-lo.
 
Nesses termos, correta a sentença impugnada, que deve ser prestigiada também por seus próprios fundamentos.
 
A recorrente pagará as custas processuais e honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, em face da singeleza das contra-razões, nos termos do art. 55 da LJE.
 
É como voto.

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