O blog publica às sextas-feiras
decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de
Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele
dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos
julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar
alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados
Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário
brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências.
Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que
faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns,
onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê
resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.
Hoje o caso versa sobre a prática
comercial abusiva consistente na chamada “venda casada”, como segue:
RECURSO
INOMINADO Nº 5.618/04
ACÓRDÃO
EMENTA: RECURSO
INOMINADO. VENDA CASADA. PRÁTICA ABUSIVA VEDADA PELO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR.
1.-AQUISIÇÃO
DE AUTOMÓVEL CONDICIONADA À ACEITAÇÃO DE SERVIÇO DE DESPACHANTE VINCULADO À
CONCESSIONÁRIA PARA TRANSFERÊNCIA DO VEÍCULO.
2.-PRÁTICA
ABUSIVA NOS TERMOS DO ARTIGO 39, INCISO I, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR,
GERANDO OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR O VALOR RELATIVO A COBRANÇA A MAIOR E
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
3.-MERECE
SER MANTIDO O VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS QUANDO ARBITRADO COM
PONDERAÇÃO, OBSERVANDO AS ORIENTAÇÕES DA DOUTRINA E DA JURISPRUDÊNCIA E OS
PRINCÍPIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
4.-
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Vistos,
relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma
Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória-ES, à
unanimidade, conhecer do recurso para negar-lhe provimento, nos termos do voto
do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.
Vitória,
ES, de junho de 2005.
R E L A T Ó R I O
Regularmente
instruído o feito, sobreveio a r. sentença de fls. 25/28 que julgou procedente
em parte a pretensão autoral para o fim de condenar a requerida a título de
dano material na importância de R$ 227,00, bem como danos morais no importe de
R$ 1.500,00.
Inconformada,
a vencida interpôs recurso inominado a fls. 41/50, e requereu a improcedência dos
pedidos contidos na inicial, em relação aos danos materiais e danos morais,
dado a inexistência de qualquer conduta ilícita da recorrente, ou seja ponderado
além do caráter punitivo, a condição do recorrido, a fim de se evitar o
enriquecimento ilícito.
Em
contra-razões de fls. 59/68 o recorrido espera que, se conhecido for o recurso
interposto pela ré, no mérito há de ser-lhe negado provimento, mantendo-se
incólume a r. decisão recorrida, por medida de direito e de justiça.
É
o relatório.
V
O T O
No
caso concreto, constatou-se que o recorrido comprou um automóvel, modelo Gol
1.0, modelo 2004, placa indicada, junto à recorrente, conforme demonstram os
documentos de fls. 05/06. Entretanto, afirmou que houve “venda casada”, eis que
foi informado pela funcionária da recorrente que a venda do veículo era
condicionada que o serviço de despachante fosse realizado por pessoa por ela credenciada.
Além
da prova documental em favor do recorrido, verifico termo de depoimento
testemunhal trazido pelo autor a fls. 29, consubstanciando as assertivas
inaugurais, demonstrando que o mesmo se desincumbiu da melhor forma do disposto
no art. 333,I, do CPC:
Art. 333, I, CPC: O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito.
O Código de Defesa do Consumidor elenca os comportamentos definidos como práticas abusivas, conforme disposto no art. 39, a saber:
Art. 39 – É
vedado ao fornecedor de produtos ou serviços:
I – condicionar
o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou
serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos.
A
recorrente não poderia ter se negado a vender isoladamente o automóvel, obrigando
o consumidor a adquirir o serviço de despachante junto a uma empresa
credenciada junto à concessionária, cometendo, portanto, conduta vedada por lei
e, conseqüentemente, deve responder pelos danos causados.
O
entendimento acima é corroborado pelo Código de Defesa do Consumidor, art. 6º,
VI:
Art. 6º - São
direitos básicos do consumidor:
VI – a efetiva
prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e
difusos.
As
justificativas apresentadas pela recorrente não elidem a responsabilidade da
mesma em relação ao procedimento adotado, vez que não desincumbiu de provar o
que alegou. Ademais, constato que o valor cobrado pelos serviços de despachante
foi no importe de R$ 497,00, conforme documento de fls. 07. Todavia, o
documento emitido pelo Detran demonstra a importância paga ao referido órgão
conforme fls. 09. Logo, não se justifica que o consumidor, já escolhendo uma
empresa sólida para adquirir um veículo, tenha que pagar um valor mais elevado
junto ao Detran para fins de emplacamento do automóvel. O serviço de
despachante pode ser oferecido ou indicado, mas não pode ser imposto como
condição para realização do negócio.
Desse
modo, entendo que a r. sentença impugnada deu desate adequado aos fatos
narrados nos autos, merecendo ser mantida.
No
que tange ao valor da condenação, este não merece qualquer reparo por ater-se à
mera devolução de importância referente ao dano patrimonial sofrido e o valor
do dano moral arbitrado pelo digno magistrado sentenciante não destoa da razoabilidade
e proporcionalidade, merecendo ser prestigiado.
Por
todo o exposto, nego provimento ao recurso, mantendo íntegra a r. sentença
recorrida e firme no princípio insculpido no artigo 55 da Lei nº 9.099/95,
condeno a recorrente no pagamento das custas processuais e na verba honorária
que fixo em 15 % (quinze por cento) sobre o valor da condenação.
É
como voto.
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