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16 novembro 2012

SUBSTABELECIMENTO DE MANDATO E SUAS CONSEQUÊNCIAS


 
O blog publica às sextas-feiras decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências. Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns, onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.

Hoje a questão versa sobre irregularidade no substabelecimento de mandato e rejeição de embargos, como segue:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RI. Nº 5.707/04
ACÓRDÃO
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO.
1.- ADVOGADA QUE SUBSTABELECE PODERES ALÉM DO PERMITIDO RESPONDE PERANTE O MANDANTE OS EVENTUAIS EXCESSOS, E SE TAL SUBSTABELECIMENTO É FEITO SEM RESERVAS DE PODERES, CONSIDERA-SE QUE RENUNCIOU OS PODERES RECEBIDOS,SENDO SUA OBRIGAÇÃO ÉTICA COMUNICAR AO CLIENTE NOS TERMOS DO CÓDIGO DE ÉTICA DA OAB.
2.- ADVOGADA SUBSTABELECIDA NÃO PODE RENUNCIAR AO MANDATO SEM OBSERVAR OS DITAMES DO ARTIGO 45 DO CPC NEM PODE PRETENDER REPRISTINAR OS PODERES RECEBIDOS PARA A ADVOGADA SUBSTABELECENTE.
3.-INADMISSÍVEL A TENTATIVA DE TRANSFERIR SUAS RESPONSABILIDADES PARA O CARTÓRIO.
4.- COMUNICAÇÃO À ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL PARA OS FINS DE DIREITO.
5.- EMBARGOS NÃO CONHECIDOS POR DUPLO MOTIVO: INTEMPESTIVIDADE E AUSÊNCIA DE REGULAR REPRESENTAÇÃO DO EMBARGANTE.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória,ES, à unanimidade, não conhecer dos embargos de declaração, nos termos do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.
Vitória, ES,       de  abril de 2005.

R E L A T Ó R I O

O recorrente interpõe Embargos de Declaração no RI nº 5.707/04, com fundamento no artigo 535 do CPC, alegando equívoco quanto à contagem do prazo recursal e condenação do recorrido em honorários advocatícios, pretendendo a reforma do acórdão, por ser medida de inteira justiça.
É o breve relatório.

V O T O

É de sabença geral que os embargos de declaração, como o próprio nome sugere, destinam-se a aclarar obscuridade, eliminar contradição ou sanar omissão ou dúvida, nos termos do artigo 48 da LJE.

Não se prestam, evidentemente, para o reexame de matéria sobre a qual a decisão embargada havia se pronunciado.

De outra parte, o artigo 49 da lei dos juizados especiais estabelece que os embargos devem ser interpostos no prazo de 5(cinco) dias, contados da ciência da decisão.

A Sra. Secretária do Colegiado Recursal assinala em certidão de fls. 92, que os embargos são intempestivos.

Com efeito, tendo sido publicado o acórdão no Diário da Justiça de 16/03/2005, o prazo de cinco dias para interposição de embargos expirou. Como se vê a fls. 77, os embargos foram protocolados em 29/03/2005, totalmente fora do prazo legal.

Mas, não é só.

Revendo os autos, verifico que a ilustre advogada do autor, subscritora da petição de embargos foi constituída através de instrumento de procuração de fls. 13, datado de 05/02/2004, com poderes “ad judicia”, podendo substabelecer com ou sem reservas os poderes contidos na cláusula “extra” previstos na Lei nº 8906/94.

Entretanto, em 14/07/2004, a referida causídica substabeleceu SEM RESERVAS, (substabelecimento de fls.58), os poderes recebidos do autor, transferindo-os para sua colega, a qual interpôs o recurso inominado perante este Colegiado.

Publicado o acórdão, retorna a advogada inicial, atravessando petição de fls. 77/79, à qual acostou cópia de petição dirigida por sua colega ao Juiz do 1º Juizado Especial Cível da Serra, onde tramitou o processo em primeiro grau de jurisdição, alegando que “renuncia ao mandato representado pelo instrumento de substabelecimento e que, a partir de tal data, 14/12/2004, o autor continuará sendo assistido pela douta causídica constante no instrumento procuratório” (fls. 13). Pleiteou devolução de prazo atribuindo culpa ao cartório do juízo monocrático.

A mesma advogada ingressa com embargos totalmente fora do prazo e, ainda, atravessa nova petição a fls. 93/97, pedindo reconsideração da decisão.

Bem se vê que a Dra. Advogada procura tumultuar o feito, não se sabendo se por incompetência ou por esperteza ou por ambas as hipóteses.

O certo é que as doutoras advogadas sabiam que o processo se encontrava no Colegiado e foram interpor petição no juízo originário, guardando “trunfo” para eventual derrota.

Ademais, houve substabelecimento. Sabe-se que o substabelecimento pode ser com ou sem reservas de poderes.

No magistério de Cláudio Martins (Teoria e prática dos atos notariais) substabelecer é "substituir, sub-rogar, transferir, pôr em lugar de outrem, nomear como substituto".

No substabelecimento com reserva de poderes, o que antes era mandatário outorga seus poderes para um terceiro, podendo atuar junto com ele, ou com a prerrogativa de reassumir a conduta de mandatário a qualquer momento.

Contudo, o substabelecimento SEM RESERVAS de poderes pode ser conceituado como verdadeira renúncia do poder de representação, uma vez que o outorgante desvincula-se de vez do contrato, passando definitivamente todos os seus poderes ao novo mandatário.

E tanto é assim que o Código de Ética da OAB, que regulamenta o exercício da profissão do Advogado, prescreve no artigo 24, § 1º, “verbis”: “O substabelecimento do mandato sem reservas de poderes exige o prévio e inequívoco conhecimento do cliente.”

Não consta que a Dra. advogada tenha cumprido tal dever ético.

O mandante ou constituinte não pode se tornar um joguete nas mãos do advogado, vez que o mandato é contrato essencialmente de confiança que se estabelece entre mandante ou constituinte e mandatário ou procurador.

A advogada que recebeu substabelecimento SEM RESERVAS DE PODERES não poderia “renunciar” em juízo e sim perante o cliente, observando o disposto no artigo 45 do CPC.

Enfim, jamais repristinar os poderes que lhe foram transferidos pela advogada que recebeu a procuração, a qual não mais detém qualquer poder para representar o mandante.

Autorizo, outrossim, a Sra. Secretária a não mais receber qualquer petição nestes autos pelas doutoras advogadas, vez que considero o autor sem qualquer representação nos autos.

Uma porque substabeleceu os poderes sem reservas, outra porque renunciou os poderes que lhe foram confiados.

Em face do exposto, não conheço dos embargos e determino que se extraiam cópias deste voto e das peças nele referidas e se remetam por ofício ao digno Presidente da OAB/ES para conhecimento e providências que entender cabíveis.

É como voto.

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