O blog publica às sextas-feiras
decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de
Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele
dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos
julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar
alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados
Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário
brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências.
Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que
faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns,
onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê
resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.
Hoje o caso tratado refere-se ao desconto decorrente do
pagamento antecipado de contrato de financiamento bancário, como segue:
EMENTA: RECURSO INOMINADO.FINANCIAMENTO BANCÁRIO.
1.-PRELIMINAR DE CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA
DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA, VEZ QUE O PEDIDO ATENDE AOS REQUISITOS ESSENCIAIS,
BEM COMO O PROVIMENTO JUDICIAL OBSERVOU O PRAZO PRESCRICIONAL LEGAL.
2.O MUTUÁRIO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO FAZ
JUS A DESCONTO NO PAGAMENTO ANTECIPADO DE PRESTAÇÕES, A TEOR DO DISPOSTO NO
ART. 52 DO CDC E ART. 7º DA RESOLUÇÃO Nº 2878 DO BANCO CENTRAL DO BRASIL, AINDA
QUE NÃO PREVISTO EM CONTRATO.
3.- RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM
os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal dos Juizados
Especiais, à unanimidade, conhecer do recurso para rejeitar a preliminar
argüida e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator, que
deste passa a fazer parte integrante.
RELATÓRIO
O
autor ajustou financiamento de um veículo com o Banco recorrente e, tendo
quitado integralmente as parcelas restantes e não obtendo o desconto devido,
requereu a devolução a que alega fazer jus no valor de R$ 1.721,72 devidamente
corrigidos.
A
r. sentença de fls. 35/36 julgou procedente, em parte, o pedido contido na
exordial. Assim, condenou o réu ao pagamento da importância de R$ 1.563,72,
referente ao pedido de restituição em razão do deságio pelo pagamento
antecipado. Contudo, em relação à restituição da taxa no importe de R$ 149,00,
não mereceu prosperar a pretensão autoral.
Inconformado,
o banco-requerido interpôs recurso de fls. 41/54, pugnando pela extinção do
processo sem julgamento do mérito ou a reforma da sentença, uma vez que
perfeitamente válidas as obrigações contratuais firmadas entre as partes, sob
pena de locupletamento indevido do recorrido, como medida de justiça.
Em
contra-razões de fls. 57/59 o recorrido pleiteou seja rejeitado o recurso,
negando-se-lhe provimento, em todos os seus termos, por ser de inteira e
merecida justiça.
É
o relatório.
*
V
O T O
Considerando
presentes os pressupostos de admissibilidade, especialmente diante da certidão
de fls 41, conheço do recurso.
*
PRELIMINAR
DE CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR.
O
recorrente alega a carência de ação por falta de interesse de agir, eis que não
se justifica, após expirado o prazo contratual, a revisão das cláusulas contratuais
e o valor supostamente pago a maior seja devolvido ao autor.
Entretanto,
verifica-se a total inconsistência das alegações.
No caso
em exame, evidente se torna o interesse de agir do recorrido, bem como a
necessidade de buscar seu direito mediante a intervenção do Estado-Juiz, como
forma civilizada e democrática para dirimir a controvérsia, vez que a
recorrente se nega a reconhecer o direito por ele invocado de restituição do
valor pago a mais em razão da quitação antecipada do financiamento do
automóvel.
A
inércia do autor durante a vigência do contrato não o impede de questionar as
cláusulas que entende abusivas, bem como fazer valeu seu direito, desde que
respeitado o prazo prescricional legal.
Assim sendo, rejeito a preliminar argüida.
*
M É R I T O
Analisando os autos, os elementos
e os documentos acostados, constato que o banco recorrente se limita a dizer
que procedeu aos descontos legais sem, contudo, infirmar os cálculos realizados
pelo PROCON.
O recorrente em momento
algum diz que tais cálculos realizados pelo PROCON estão errados, bem como não
justificou a cobrança realizada, limitando-se pura e simplesmente em afirmar
que procedeu aos descontos de forma regular, ressaltando a existência do
vínculo jurídico entre as partes.
Assevera o recorrido que
pagou a importância de R$ 3.790,00 quando deveria pagar R$ 3.158,97, de acordo
com os cálculos apresentados a fls. 06. Ora, razão assiste ao autor, pois,
tendo antecipado o pagamento das prestações, evidente que o banco não poderia
deixar de proceder ao desconto, sob pena de incorrer em enriquecimento sem
causa, o que é vedado pelo ordenamento jurídico.
Daí a coerência de
considerar-se correto o cálculo elaborado pelo PROCON, com a consequente
devolução, em dobro, da importância paga a maior, uma vez que em momento algum
houve qualquer justificativa por parte do recorrente acerca do valor cobrado a
mais, de acordo com art. 52, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, que
dispõe:
Art.
52 do CDC – No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de
crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre
outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:
§ 2º
- É assegurada ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou
parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos.
Por outro lado, ao cobrar
quantia indevida, cumpre-lhe restituir em dobro, conforme dispõe o parágrafo
único do art. 42 do CDC:
Art.
42 do CDC – Na cobrança de débitos o consumidor não será exposto a
ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo
único – O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do
indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de
correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Por esses fundamentos, nego provimento ao recurso, condenando o recorrente no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, na conformidade disposto no artigo 55, caput, segundaparte, da Lei nº 9.099/1995.
É como voto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário