O blog publica às sextas-feiras
decisões da Primeira Turma do Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de
Vitória, no biênio 2004/2006, período em que tive a honra de integrar aquele
dinâmico sodalício. Não há compromisso de publicação da integralidade dos
julgados nem com a identificação das partes, vez que interessa apenas revelar
alguns temas interessantes que são debatidos no cotidiano dos Juizados
Especiais, os quais inegavelmente deram uma nova dinâmica ao judiciário
brasileiro. E de tal sorte que cada vez mais são ampliadas suas competências.
Pelo andar da carruagem, em breve o que era especial passará a ser comum, o que
faz alguns preverem em futuro próximo o sepultamento das varas cíveis comuns,
onde ou se consegue um provimento cautelar ou antecipatório ou não se vê
resultado concreto em pelo menos longos anos de litígio.
Hoje o caso versa sobre crise
processual em execução de título judicial e sua resolução por via mandamental,
como segue:
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 0183/05
ACÓRDÃO
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL QUE NO
CURSO DA EXECUÇÃO MAJOROU SIGNIFICATIVAMENTE O VALOR DO DÉBITO. INVERSÃO
TUMULTUÁRIA DO PROCESSO. ORDEM CONCEDIDA.
1 INICIADA A EXECUÇÃO DE TÍTULO
JUDICIAL, PERFECTIBILIZADA A PENHORA E
OPOSTOS EMBARGOS DO DEVEDOR, INCONCEBÍVEL AS SUCESSIVAS MAJORAÇÕES DO VALOR DO
DÉBITO, PENA DE SE ETERNIZAR O CONFLITO.
2. MESMO EM SEDE DE JUIZADOS
ESPECIAIS PREVALECEM OS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS, SOBRETUDO AQUELES DECORRENTES
DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DO AMPLO DIREITO DE DEFESA, ASSEGURADOS
CONSTITUCIONALMENTE.
3.- ORDEM CONCEDIDA PARA DECLARAR
A NULIDADE DA DECISÃO QUE ELEVOU O ‘QUANTUM DEBEATUR” E DETERMINOU NOVA PENHORA
EM DINHEIRO NO CURSO DA EXECUÇÃO, DETERMINANDO O REGULAR PROCESSAMENTO DOS
EMBARGOS DO DEVEDOR NO DOUTO JUÍZO DE ORIGEM, CULMINANDO COM SEU JULGAMENTO
COMO ENTENDER DE DIREITO.
Vistos, relatados e discutidos
estes autos, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal do Colegiado Recursal
dos Juizados Especiais de Vitória,ES, à unanimidade, conceder a ordem exorada,
termos do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.
Vitória, ES, de dezembro de 2005.
R E L A T Ó R I O
A operadora de plano de saúde,
devidamente individualizada e representada por sua ilustrada patrona, impetrou
o presente “mandamus” contra decisão do Exmo.Sr. Juiz de Direito do 1º Juizado
Especial Cível de Vitória, proferida a fls. 204/206 nos autos do processo nº 2639/1994
que, reconsiderando duas decisões anteriores de outros magistrados no mesmo
processo determinou a expedição de mandado de penhora e avaliação no valor de
R$ 19.707,30, a ser cumprido com o bloqueio da conta bancária da executada.
Através da decisão de fls.
121/123, deferi a medida liminar requerida, suspendendo a decisão objurgada até
final julgamento da presente ação mandamental.Regularmente citado o litisconsorte (fls. 125), o mesmo quedou silente, consoante certidão de fls.135.
Requisitadas as informações, prestou-as o ilustrado magistrado que atualmente preside o Juizado a fls. 130/132, transcrevendo parte da decisão impugnada e informando que estancou a marcha processual aguardando a decisão deste Colegiado.
A Dra. Promotora de Justiça que funciona perante esta Turma emitiu parecer a fls. 136/138 e, com base nos fundamentos contidos na decisão questionada, opinou pela denegação da segurança pleiteada.
É o relatório.
V O T O
Ao proferir decisão concedendo a
medida liminar assentei os seguintes fundamentos, que transcrevo, vez que nada
se modificou com as informações prestadas:
“Examinando-se os autos e cópias do
processo de execução que tramita perante a douta autoridade coatora, verifica-se “prima facie” que há
evidente tumulto processual, com diversas decisões conflitantes, como se
demonstra:
Percebe-se que pela r. decisão de fls.
171, lavrada em 04.03.2004, foi acolhido o cálculo de fls. 154/155, fixada a
execução em R$ 6.655,37.
Regularmente intimado da decisão, o
exeqüente ingressou com petição “a título de esclarecimento”, alegando que na
verdade seu crédito é de R$ 12.764,31, requerendo fosse determinada a executada
o pagamento de tal valor.
Mediante nova decisão a fls. 175, outra
magistrada, manteve aquela decisão determinando expedição de mandado de penhora
e avaliação, que foi devidamente cumprido (fls. 178/verso).
O embargado responde aos embargos a fls.
192/198, requerendo sejam julgados improcedentes os embargos e condenando a embargante
a pagar o valor de R$ 6.655,37 que é o valor principal, acrescido dos juros e
correção monetária que totaliza o valor de R$ 12.764,31, mais custas
processuais e honorários advocatícios de 20%.
O ato impugnado atropelou o regular
andamento do feito e estabelece nova crise processual, além de impor prejuízo
financeiro à impetrante, inexistindo, ainda, recurso que possa obstá-la, razão
da cabida da medida excepcional, consoante tranqüila jurisprudência pátria,
valendo, por mera ilustração, o julgado abaixo:
MANDADO
DE SEGURANÇA - DECISÃO JUDICIAL - PRESSUPOSTOS.
É cabível mandado de segurança contra decisão judicial de que não caiba recurso com efeito suspensivo, desde que tenha sido interposto, a tempo e modo, o recurso próprio, e se do ato impugnado resultar a possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação, ou, ainda, no caso de evidente ilegalidade do ato (TRF-5ª R. - Ac. unân. do T. Pleno julg. em 20-2-91 - MS 2.172-PB - Rel. Juiz Hugo Machado - Adv.: José Martins da Silva; in ADCOAS 134863).”
É cabível mandado de segurança contra decisão judicial de que não caiba recurso com efeito suspensivo, desde que tenha sido interposto, a tempo e modo, o recurso próprio, e se do ato impugnado resultar a possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação, ou, ainda, no caso de evidente ilegalidade do ato (TRF-5ª R. - Ac. unân. do T. Pleno julg. em 20-2-91 - MS 2.172-PB - Rel. Juiz Hugo Machado - Adv.: José Martins da Silva; in ADCOAS 134863).”
Pelo que
ficou acima ajustado ressalta claramente que o processo de execução em exame se
desenvolveu de forma anômala, sem observância do procedimento legalmente
previsto no CPC e na LJE, ferindo o devido processo legal.
A
propósito vale lembrar a passagem do voto proferido pelo MM Juiz JOÃO BATISTA
TEIXEIRA no processo 20040360004148DVJ DF, da Segunda Turma Recursal dos
Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Distrito Federal, que aqui cabe como
uma luva:
“2. SOB
O PRISMA DO CONCEITO TRAZIDO PELO INCISO LXIX DO ARTIGO 5º DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, E DO PRINCÍPIO INSTITUÍDO NO INCISO LIV DO MESMO ARTIGO DA CARTA
MAGNA, E DO DISPOSTO NO ARTIGO 52 DA LEI 9.099/95, PODE-SE AFIRMAR QUE TODO
CIDADÃO TEM DIREITO LÍQUIDO E CERTO A VER RESPEITADAS AS NORMAS PROCEDIMENTAIS
RELATIVAS AO PROCESSO. 3. NA HIPÓTESE DE EXECUÇÃO FUNDADA EM TÍTULO EXECUTIVO
JUDICIAL, PROCESSADA PERANTE OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, O RITO PROCEDIMENTAL
A SER SEGUIDO É O QUE CONSTA DO ARTIGO 52.”
Ora, uma
vez definido o valor da execução e interpostos embargos do devedor incabível a
atualização do “quantum”, pena de eternização do processo executório.
Em face
do exposto, concedo a ordem exorada para o fim de declarar a nulidade dos atos
praticados após estabilizada a execução com a decisão de fls. 171, ratificada a
fls. 175 e, uma vez opostos embargos do devedor, que foram oportunamente
impugnados, retornem os autos ao douto juízo de origem para regular
processamento dos embargos e afinal decida tais embargos como entender de
direito.
É como voto.