Translate

09 julho 2010

FIM DE EXPEDIENTE

Extraído de Tiras Nacionais

NÃO INCIDE IMPOSTO DE RENDA SOBRE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL OU MATERIAL

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou a tese, em recurso repetitivo, de que o pagamento de indenização não é renda e, por isso, não incide imposto de renda (IR) sobre valores recebidos em razão de dano moral. O relator do recurso, ministro Luiz Fux, explicou que, como a quantia tem natureza jurídica de indenização, não há qualquer acréscimo patrimonial.


O julgamento foi feito pelo rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil (CPC). Assim, todos os demais processos sobre o mesmo tema, que tiveram o andamento suspenso nos tribunais de segunda instância desde o destaque deste recurso para julgamento na Primeira Seção, devem ser resolvidos com a aplicação do entendimento exposto pelo STJ.

A intenção do procedimento é reduzir o volume de demandas vindas dos tribunais de Justiça dos estados e dos tribunais regionais federais cujas teses já tenham posição pacífica junto ao STJ, mas que continuam a chegar ao Tribunal, em Brasília.

Ao analisar o caso, o ministro Luiz Fux esclareceu que, na hipótese, tratava-se de indenização por dano moral decorrente de reclamação trabalhista. De acordo com o ministro, se a reposição patrimonial goza da não incidência de IR, a indenização para reparação imaterial [como é o dano moral] deve se submeter ao mesmo regime.

O relator do recurso ainda explicou que a ausência da incidência não depende da natureza do dano a ser reparado. “Qualquer espécie de dano (material, moral puro ou impuro, por ato legal ou ilegal) indenizado, o valor concretizado como ressarcimento está livre da incidência de imposto de renda”.

Resp 1152764
Fonte: STJ

A SEGURANÇA PÚBLICA E A SOCIEDADE




Archimedes Marques
Delegado de Policia no Estado de Sergipe. Pós-Graduado em Gestão Estratégica de Segurança Publica pela Universidade. Federal de Sergipe



Um dos problemas que mais aflige a todos no Brasil de hoje é - sem sombra de dúvidas - a questão da segurança pública, que deixa a desejar aos anseios da população, pois em todos os lugares a violência e a criminalidade crescem em proporções imensuráveis e de maneira incontrolável pelo poder público.

Aos olhos do povo, parece ser a Polícia a única responsável pela segurança da sociedade, quando em verdade tem essa instituição somente a função mais árdua de todas, vez que atua na linha de frente em prevenção ao crime ou na garimpagem de criminosos e na execução das leis penais, a fim de torná-las efetivas ao exigir o cumprimento das regras sociais e solucionar os seus conflitos.

Durante muito tempo a problemática da segurança pública foi vista apenas como questão de ordem absoluta da Polícia, regida e orquestrada pelos governos estadual e federal, sem participação alguma de qualquer segmento da sociedade.

Agora que a epidemia da insegurança se alastrou por todo o Brasil a própria sociedade se mostra preocupada com o problema e até já comunga com o preceito constitucional de que a segurança pública é responsabilidade de todos, e com isso já se formam movimentos diversos que objetivam maior interatividade com a Polícia para uma conseqüente união de forças de combate ao crime.

As associações de moradores e os conselhos de segurança dos Estados, bem como as diversas organizações não governamentais já se conscientizam e devem se fortalecer cada vez mais no sentido de ajudar a Polícia na sua árdua missão de combater o mal e resgatar a ordem ferida.

Entretanto, essa necessária e importante interação ainda aparece de maneira emperrada, pois existe a tradição arraigada no seio de grande parte da sociedade em generalizar, colocando-se com regra, ao invés da exceção, que a Polícia é ineficiente e criminosa, que todo policial é ignorante, arbitrário, violento e irresponsável, quando em verdade, de uma maneira geral, tais entendimentos não passam de pensamentos ilógicos e insensatos, vez que é dever e obrigação de todos os nossos componentes, acima de tudo, valorar e guardar as leis do país e, em assim sendo, não é uma minoria desvirtuada que deve superar a grande maioria dos nossos valorosos policiais que trabalham com amor a causa.

Aliados a tais pensamentos insensatos que menosprezam as nossas classes, os governos ao longo dos tempos pouco investiram ou investem nas suas Polícias. A segurança pública sempre foi esquecida e sucateada através dos anos. As Polícias sempre foram relegadas ao segundo plano, principalmente no que tange à valorização profissional dos nossos membros. Com raras exceções, poucas conquistas foram alcançadas pelas classes policiais em alguns Estados da federação.

Ora, a eficiência do trabalho policial está intimamente ligada ao bom relacionamento entre cidadãos e policiais. Um deve ver e sentir o outro no valor da amizade, como elemento de apoio, de confiança nos seus recíprocos atos. Os policiais dependem da iniciativa e da cooperação das pessoas e estas dependem da proteção dos policiais.

Infelizmente, diversos fatores levaram ao crescimento no âmago do povo de um sentimento pejorativo em desfavor dos policiais, fazendo com que a sociedade tema a Policia ao invés de respeitá-la e tê-la como aliada para o bem geral da nação brasileira.

Torna-se necessária a mudança dessas concepções errôneas para que haja uma maior união e interatividade entre o povo e a sua Polícia. Para que haja confiança do cidadão nas ações da Polícia. Para que a sociedade tenha a Polícia como sua amiga, como sua aliada no combate ao crime e no cumprimento das leis. Para que a própria sociedade reconheça e se engaje na nossa luta pelo resgate da dignidade perdida, relacionada principalmente a salários condizentes com a importância da árdua missão policial e então estimular ainda mais o bom profissional, pois só assim teremos uma segurança pública mais real, mais eficaz e satisfatória aos anseios da própria população.


Artigo enviado pelo Autor.

"SERIAL KILLER PROCESSUAL" NÃO PASSOU DE FACTÓIDE CRIADO PELA OAB

O estardalhaço feito pelo OAB em torno de um suposto "serial killer processual" não passou de mais um factóide lançado para ocupar espaço na mídia, além de precipitado julgamento sobre uma atitude da justiça federal da Paraíba.

Veja abaixo porque não deu em nada:

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu, na quarta-feira passada (30/06), pela legalidade da Portaria Conjunta 001/2005 da 7ª Vara Especial Federal da Seção Judiciária da Paraíba. A portaria define os casos em que pedidos de antecipação da tutela jurisdicional ou de medida cautelar serão analisados pelos juízes da vara. Por maioria, os conselheiros seguiram o voto do conselheiro Walter Nunes, que negou o pedido feito pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e para OAB – seção da Paraíba, no Procedimento de Controle Administrativo (PCA 00031515220102000000).


No PCA, a OAB defendia a anulação dos efeitos da portaria por considerá-la uma medida irregular, que limita o acesso à jurisdição, configurando abuso de poder. Segundo Walter Nunes, não foi identificado nenhum tipo de irregularidade na portaria da 7ª Vara Especial Federal da Paraíba. Ficou decidido que o CNJ recomendará a revogação da Portaria.


Walter Nunes, que foi seguido por outros quatro conselheiros, divergiu da posição apresentada pelo relator do PCA, conselheiro Jorge Hélio Chaves de Oliveira, que acatou parcialmente o pedido da OAB defendendo a ilegalidade da portaria e a determinação para que fosse desconstituída. Jorge Hélio foi acompanhado por outros dois conselheiros.

Fonte: CNJ

08 julho 2010

TJRS JULGA DISPUTA JUDICIAL SOBRE PROPRIEDADE DE CACHORRO

Uma mulher e uma funcionária de um Pet Shop de Santo Ângelo discutiram na 9ª Câmara Cível do TJRS a propriedade de um cachorro da raça Yorkshire Terrier, com um ano e meio à época dos fatos. A mulher afirmava que teria permitido que a funcionária ficasse com o animal para procriá-lo e que cuidasse dele enquanto estivesse fora da cidade. Já a funcionária dizia que o animal havia sido doado a ela, pois era maltratado pela empregada da dona.

Segundo a proprietária, o cachorro conhecido como Xeren foi adquirido em 19/08/04 e era tratado na clínica veterinária onde trabalhava a demandada, que teria pedido o cão emprestado com o objetivo de procriá-lo. No final do mês de outubro de 2006, ausentou-se da cidade em razão dos problemas de saúde de sua mãe. Ao retornar, foi informada de que a funcionária não mais trabalhava na pet. O estado de saúde de sua mãe piorou e ela teve de afastar-se novamente de Santo Ângelo. Em 2007, quando conseguiu normalizar a situação familiar, disse à funcionária que queria o cão de volta. Esta conduziu-o até a sua residência, mas 12 dias depois, pediu-o novamente emprestado. A proprietária negou afirmando que sua mãe sentia falta do animal. A funcionária, então, registrou boletim de ocorrência policial, onde afirmava que Xeren lhe havia sido doado e que a mulher praticou crime de apropriação indébita. Em 5/09/07, foi expedido mandado judicial de busca e apreensão.

Em primeira instância, foi determinada a devolução de Xeren à primeira proprietária. A sentença negou ainda o pedido de indenização por danos morais sofridos, pois tanto a autora quanto a demandada enfrentaram dissabores com o acontecido, pois é certo que ambas conviveram por um bom tempo com o aludido cachorro e, por isso, acabaram se afeiçoando a ele. Além disso, o lapso temporal transcorrido (mais de um ano) entre a data em que a requerente deixou o cão com a ré, o regresso daquela a Santo Ângelo e o pedido de devolução do animal, contribuíram para que a demandada passasse a acreditar que ficaria com o animal em questão. A decisão foi proferida pela Pretora Nina Rosa Andres, da 3ª Vara Cível, da Comarca de Santo Ângelo.

A funcionária recorreu pedindo a reforma da sentença, sustentando que o cão não poderia ficar trocando de proprietários, pois é provido de sentimento e apego ao ser humano que o cuida e lhe dá carinho. Alegou que o animal corria sério risco de não se adaptar à antiga proprietária, podendo vir a sofrer problemas de saúde pela tristeza e ausência de sua atual companhia, o que, inclusive, poderia levá-lo a morte. Afirmou que a autora não tinha condições de cuidar e amparar com amor e atenção necessários o cão.

Já a primeira proprietária recorreu pleiteando indenização por danos morais sofridos pela invasão de policiais fortemente armados em sua residência durante operação de busca e apreensão. Conforme ela, o ato ilícito ficou caracterizado pela imputação de crime falso, expedição de mandado e tempo que ficou privada da presença do cachorro.

Apelação Cível

Com relação à ofensa devido à busca e apreensão, o Desembargador Tasso Caubi Soares Delabary entendeu que foi regularmente processada em inquérito policial, assim como a ordem de busca foi examinada e deferida judicialmente com base nos indícios até então coligidos. Considerou também que a prova não informava que os agentes excederam os meios para o cumprimento da ordem, tanto que o acesso à residência foi franqueado pela autora que permitiu o ingresso dos mesmos.

Além disso, para o magistrado, uma pessoa que se diz apegada ao animal de estimação e estabelece com o cão uma relação de companhia não pode permitir que o mesmo fique tanto tempo com outra pessoa. Ele observou ainda que o período de procriação é muito reduzido em relação ao tempo em que o cachorro ficou na companhia da funcionária e que os problemas de saúde alegados não são suficientes para justificar mais de um ano longe do animal.

Tudo indica, assim, que efetivamente, houve a inversão da propriedade sobre o animal, mediante a transferência de posse do cão à demandada, ora recorrente, concluiu o Desembargador. Salientou ainda que a propriedade das coisas móveis adquire-se pela tradição e posse.

Sob esse entendimento, o magistrado votou pelo reconhecimento do direito da funcionária da pet sobre Xeren, cuja propriedade foi obtida por ato de liberalidade promovido pela parte autora, mantendo, assim, o animal em poder da demandada.

Os Desembargadores Íris Helena Medeiros Nogueira e Mário Crespo Brum acompanharam o voto do relator.

Apelação Cível nº 70034788737

Fonte: TJRS, via Newsletter Magister

Nota do blog:

Por essa e outras questões de igual jaez que a justiça vive emperrada. O brasileiro parece que tomou gosto excessivo pela litigância judicial.

OS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA - 3

Parte 3-Final



Humberto Theodoro Júnior

Advogado; Professor Titular Aposentado da Faculdade de Direito da UFMG; Desembargador Aposentado do TJMG; Membro da Academia de Direito de Minas Gerais, do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, do Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, do Instituto Brasileiro de Direito Processual, do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual e da International Association of Procedural Law.

16 Tutela de Urgência (Medidas Cautelares e Antecipatórias)

Ao juiz presidente do Juizado Especial da Fazenda Pública é conferido o poder de deferir, de ofício ou a requerimento das partes, medidas cautelares e antecipatórias no curso do processo, para evitar dano de difícil ou incerta reparação (art. 3º da Lei nº 12.153). Observar-se-á, na espécie, a disciplina geral do CPC (art. 273) e a especial que dispõe sobre medidas cautelares e tutela antecipada contra a Fazenda Pública (Leis ns. 8.437/92 e 9.494/97).

17 Recursos nos Juizados Especiais da Fazenda Pública

Salvo no caso de medidas cautelares e antecipatórias, não cabe recurso contra decisões interlocutórias, no sistema processual da Lei nº 12.153 (art. 4º). Quando recorrível, a decisão interlocutória desafiará agravo de instrumento (16), observado o procedimento previsto no CPC para essa modalidade recursal.

As sentenças nos Juizados Especiais da Fazenda Pública são recorríveis (Lei nº 10.259/01, art. 4º), mas não ensejam apelação para o Tribunal de Justiça. Tampouco se há de cogitar de recurso especial para o STJ, quando a causa for submetida ao segundo grau interno dos Juizados (17). Pode caber, no entanto, recurso extraordinário para o STF do que restar decidido, não pelo juiz singular, mas pelas turmas recursais internas do juizado (art. 21).

São irrecorríveis as sentenças do Juizado Especial que homologarem a conciliação ou o laudo arbitral (Lei nº 9.099, art. 41) (18).

O recurso no caso em que seja manejável contra a sentença é endereçado à Turma Recursal integrante do Sistema dos Juizados Especiais, a qual se compõe de juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, na forma prevista na legislação local, com mandato de dois anos. O recrutamento, de preferência, será feito entre os juízes integrados ao sistema dos Juizados Especiais (19). O prazo de interposição do recurso é de 10 dias (Lei nº 9.099, art. 42).

Há permissão expressa, também, para o cabimento dos embargos de declaração, tanto em face das sentenças dos juízes de primeiro grau, como dos acórdãos das Turmas Recursais (Lei nº 9.099, art. 48).

É do acórdão da Turma Recursal, e não diretamente da sentença, que se poderá cogitar do recurso extraordinário para o STF, em caso de ofensa à CF, desde que configurada a "repercussão geral" (CF, art. 102, III e § 3º).

Em qualquer caso, não se permite recorrer, nos Juizados Especiais, sem a representação por advogado, ainda que o processo tenha se desenvolvido até a sentença sem o patrocínio técnico (Lei nº 9.099, art. 41, § 2º) (20).

O recurso, nos Juizados Especiais, se a parte não estiver amparada pela assistência judiciária gratuita, estará sujeito a preparo. Este, entretanto, não é prévio como no CPC, podendo ser feito nas 48 horas seguintes à interposição, independentemente de intimação e sob pena de deserção (Lei nº 9.099, art. 42, § 1º).

18 Uniformização de Jurisprudência nos Juizados Especiais da Fazenda Pública

Prevê a Lei nº 12.153/09 o incidente de uniformização de jurisprudência, que poderá ser provocado por pedido da parte interessada, quando ocorrer "divergência entre decisões proferidas por Turmas Recursais sobre questões de direito material" (arts. 18, caput) (21). Divergências no campo do procedimento não justificam o incidente, muito embora se deva reconhecer que os abusos autoritários sejam tão graves no plano processual como no plano material.

O julgamento do incidente será feito em reunião conjunta das Turmas em conflito, sob a presidência de um desembargador indicado pelo Tribunal de Justiça da unidade federativa a que pertençam ambas as Turmas (art. 18, § 1º). Se os juízes tiverem sede em cidades diversas, a reunião das Turmas poderá ser feita por meio eletrônico (art. 18, § 2º).

Quando as Turmas divergentes pertencerem a Estados diversos, ou quando a divergência envolver decisão em contrariedade com súmula do STJ, o pedido de uniformização será por este julgado (art. 18, § 3º).

O STJ será também convocado a manifestar-se, a pedido da parte, quando a solução adotada pelas Turmas locais de Uniformização contrariar súmula daquela Corte Superior (art. 19, caput). A interferência do STJ, dessa maneira, não se baseia em divergência com sua jurisprudência dominante, mas tão somente se dará quando a contrariedade atingir entendimento já sumulado.

Em suma: o STJ é o competente para conhecer diretamente do pedido de uniformização em duas situações: (I) quando o dissídio se verificar entre Turmas Recursais de Estados diferentes; e (II) quando uma Turma Recursal proferir decisão contrária a súmula do STJ. Fora daí, as próprias Turmas conflitantes haverão de resolver a divergência, nos moldes do § 1º do art. 18 da Lei nº 12.153 (isto é, em reunião conjunta, presidida por desembargador designado pelo Tribunal de Justiça a que ambas se vinculam).

Muito embora a Lei nº 12.153 somente preveja a uniformização direta pelo STJ nos casos de acórdão local contrário a entendimento sumulado, aquela Corte baixou a Resolução nº 12, de 14.12.09, apoiada em decisão de STF, para permitir que divergências com jurisprudência não sumulada possam ser apreciadas pelo STJ por meio de reclamação. Assim, o que não se consegue pela via do pedido de uniformização se torna alcançável por intermédio do remédio constitucional da reclamação, o que, como é óbvio, somente se tornou possível por meio de uma interpretação ampliativa do referido instituto( 22).

19 Causas Repetitivas

Configurada a situação de múltiplas causas em torno de questões idênticas àquelas já submetidas à uniformização do STJ, os pedidos subsequentes ficarão retidos nos autos, aguardando o pronunciamento do STJ (art. 19, § 1º).

No STJ observar-se-ão as seguintes medidas:

a) "Se necessário, o relator pedirá informações ao Presidente da Turma Recursal ou Presidente da Turma de Uniformização e, nos casos previstos em lei, ouvirá o Ministério Público, no prazo de 5 (cinco) dias" (art. 19, § 3º);

b) "Decorridos os prazos referidos nos §§ 3º e 4º, o relator incluirá o pedido em pauta na sessão, com preferência sobre todos os demais feitos, ressalvados os processos com réus presos, os habeas corpus e os mandados de segurança" (art. 19, § 5º);

c) "Publicado o acórdão respectivo, os pedidos retidos referidos no § 1º serão apreciados pelas Turmas Recursais, que poderão exercer juízo de retratação ou os declararão prejudicados, se veicularem tese não acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça" (art. 19, § 6º).

O Projeto aprovado no Congresso permitia a intervenção de amicus curiae no incidente de uniformização (§ 4º do art. 19), mas o dispositivo foi vetado pelo Presidente da República (23).

20 Medidas de Urgência

O relator, nos casos de uniformização presididos pelo TJ ou pelo STJ, poderá conceder, de ofício ou a requerimento do interessado, medida liminar de suspensão dos processos, dentro dos quais se estabeleceu a controvérsia. Os fundamentos da medida de urgência serão (I) a plausibilidade do direito invocado e (II) o fundado receio de dano de difícil reparação (art. 19, § 2º).

21 Cumprimento da Sentença

Há regras especiais na Lei nº 12.153, que disciplinam o cumprimento da sentença ou do acordo, nos processos dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, fazendo a necessária diferenciação entre a efetivação das obrigações de fazer, não fazer, entregar coisa certa e de prestar quantia certa (arts. 12 e 13).

22 Obrigações de Fazer, Não Fazer ou de Entrega de Coisa

O cumprimento do acordo ou da sentença, com trânsito em julgado, que imponham obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa certa, será efetuado mediante ofício do juiz à autoridade citada para a causa, com cópia da sentença ou do acordo (art. 12 da Lei nº 12.153).

23 Obrigações de Quantia Certa

O cumprimento de sentença relativo à obrigação de pagar quantia certa, dar-se-á após o respectivo trânsito em julgado, observados os procedimentos traçados pelo art. 13 da Lei nº 12.153:

a) Se a obrigação for de pequeno valor (CF, art. 100, § 3º), a execução dar-se-á mediante requisição judicial, feita em ofício à autoridade que foi inicialmente citada para a causa, independentemente de precatório. O pagamento deverá ser realizado no prazo máximo de sessenta dias (art. 13, I).

Se a requisição judicial for desatendida, o juiz imediatamente "determinará o sequestro do numerário suficiente ao cumprimento da decisão" (art. 13, § 1º, da Lei nº 12.153). Não há nem mesmo necessidade de prévia audiência da Fazenda Pública devedora, como deixa claro o referido dispositivo legal.

b) Sendo o montante superior àquele definido como de pequeno valor, o cumprimento da sentença dar-se-á por meio de precatório (art. 13, II).

São estatuídas, ainda, pela Lei nº 12.153, as seguintes regras a serem observadas na execução das sentenças relativas a obrigações de quantia certa:

a) "As obrigações definidas como de pequeno valor a serem pagas independentemente de precatório terão como limite o que for estabelecido na lei do respectivo ente da Federação" (art. 13, § 2º);

b) "Até que se dê a publicação das leis de que trata o § 2º, os valores serão:

I - 40 (quarenta) salários mínimos, quanto aos Estados e ao Distrito Federal;

II - 30 (trinta) salários mínimos, quanto aos Municípios" (art. 13, § 3º);

c) "São vedados o fracionamento, a repartição ou a quebra do valor da execução, de modo que o pagamento se faça, em parte, na forma estabelecida no inciso I do caput e, em parte, mediante expedição de precatório, bem como a expedição de precatório complementar ou suplementar do valor pago" (art. 13, § 4º);

d) "Se o valor da execução ultrapassar o estabelecido para pagamento independentemente do precatório, o pagamento far-se-á, sempre, por meio do precatório, sendo facultada à parte exequente a renúncia ao crédito do valor excedente, para que possa optar pelo pagamento do saldo sem o precatório" (art. 13, § 5º);

e) "O saque do valor depositado poderá ser feito pela parte autora, pessoalmente, em qualquer agência do banco depositário, independentemente de alvará" (art. 13, § 6º);

f) "O saque por meio de procurador somente poderá ser feito na agência destinatária do depósito, mediante procuração específica, com firma reconhecida, da qual constem o valor originalmente depositado e sua procedência" (art. 13, § 7º).

24 Direito Intertemporal

A Lei nº 12.153/09 não criou os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito da Justiça Estadual. Estatuiu as regras para o respectivo funcionamento, quando tais juizados vierem a ser criados pela União e pelos Estados, através de suas leis de organização judiciária (24).

Fixou-se, além disso, um prazo de vacatio legis de seis meses para que as disposições da Lei nº 12.153 entrassem em vigor (art. 28), dentro do qual é de se esperar que a criação dos Juizados Especiais venha realmente a ocorrer por ato de quem tem competência para tanto; ou pelo menos que o processo de criação seja iniciado, já que o art. 22 da Lei nº 12.153 assinala um prazo geral de até dois anos de sua vigência para que a referida instalação esteja concluída.

Mesmo depois de concretamente instalados os referidos juizados, sua competência será imediata apenas para os processos ajuizados durante seu efetivo funcionamento. Embora se atribua caráter absoluto à competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, o art. 24 da Lei nº 12.153/09 veda o deslocamento das demandas aforadas perante o juízo comum da Fazenda Pública, antes da instalação do novo Juizado.

Notas do Autor:
16 ALVIM, J. E. Carreira, op. cit., p. 96. "O art. 4º da Lei nº 12.153/09 consagra a irrecorribilidade das interlocutórias como regra. Prevê que apenas serão recorríveis: a sentença; interlocutórias que (i) antecipem os efeitos da tutela; (ii) defiram providências cautelares" (AMILCAR. Advogado. Curitiba. Juizados Especiais da Fazenda Pública, Processo Civil. Disponível em: . Acesso em: 12.01.10).
17 "Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais." (STJ, Súmula nº 203)
18 Não sendo admissível recurso nem ação rescisória, os atos homologados que estiverem contaminados por motivo de nulidade ou anulabilidade terão de desafiar a invalidação pelas vias ordinárias da querela nullitatis, para não se consagrar "o absurdo de se admitir decisões viciadas e absolutamente inimpugnáveis" (CÂMARA, Alexandre Feitas, op. cit., p. 143-144).
19 Lei nº 12.153/09, art. 17: "§ 1º A designação dos juízes das Turmas Recursais obedecerá aos critérios de antiguidade e merecimento. § 2º Não será permitida a recondução, salvo quando não houver outro juiz na sede da Turma Recursal".
20 Não se estende ao grau de recurso "a capacidade postulatória atribuída às partes nos processos cujo valor não ultrapasse vinte salários mínimos" (CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit., p. 144).
21 O prazo e as formalidades do incidente serão tratados na legislação local de que cogita o art. 1º da Lei nº 12.153 e na regulamentação prevista no art. 20 da mesma lei. Subsidiariamente, observar-se-á a Lei nº 10.259/01, que já contém disciplina de sistema similar de uniformização para o âmbito da Justiça Federal.
22 STF, Pleno, ED no RE 571.572/BA, ac. 26.08.09, Relª Minª Ellen Gracie, DJe 27.11.09 - Acórdão na íntegra publicado nesta Revista, às páginas 93/104.
23 Razões do veto: "Ao permitir a intervenção de qualquer pessoa, ainda que não seja parte do processo, o dispositivo cria espécie sui generis de intervenção de terceiros, incompatível com os princípios essenciais aos Juizados Especiais, como a celeridade e a simplicidade" (DOU 23.12.09).
24 "Os Juizados Especiais da Fazenda Pública, órgãos da justiça comum e integrantes do Sistema dos Juizados Especiais, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência" (Lei nº 12.153/09, art. 1º).

Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil nº 34 - Jan/Fev de 2010 e reproduzido no CD Magister 32, abr/maio/2010, de onde foi extraído.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO DIVULGA SEIS PRIMEIRA SÚMULAS

O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Antonio Carlos Viana Santos, determinou oficialmente a divulgação das seis súmulas aprovadas na última sessão do Órgão Especial do TJSP, realizada na semana passada.

As súmulas foram sugeridas pela Turma Especial da Subseção I da Seção de Direito Privado. Esta é a primeira vez que o Tribunal de Justiça editou súmulas em seus mais de 130 anos de existência.

Súmulas nada mais são do que o resumo de decisões reiteradas do Tribunal sobre determinado tema. Uniformizam a jurisprudência e facilitam o julgamento das questões pacificadas.

Estas primeiras seis súmulas, bem como as que estão próximas de serem apreciadas pelas Turmas Especiais das outras duas Subseções, constituem um passo muito importante no sentido da modernização com vistas a acelerar o julgamento da grande quantidade de recursos do seu acervo. A experiência que agora está sendo colocada em prática pelo TJSP não é inédita, tendo sido bem sucedida e eficiente, principalmente nos Tribunais Superiores.

O novo Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo, acertadamente, simplificou o caminho da uniformização da jurisprudência. Criou as Turmas Especiais e concedeu-lhes a faculdade de propor, diretamente ao Órgão Especial, a edição de súmulas.

A presidência da Seção de Direito Privado reuniu-se no início do ano com as três Subseções e formou as Comissões de Estudo e Jurisprudência (CEJ), cuja principal finalidade é a de estudar os temas passíveis de uniformização e fornecer às Turmas Especiais os enunciados capazes de se transformarem em súmulas conforme proposta ao Órgão Especial.

As três Subseções, pelas suas CEJs, já encaminharam às respectivas Turmas Especiais os enunciados que podem se transformar em súmulas. As da Subseção I já foram aprovadas pelo Órgão Especial e as Subseções II e III já estão com sessões das Turmas Especiais designadas para a mesma finalidade.

O impacto da edição de súmulas pelo TJSP será medido a partir do final do segundo semestre deste ano, quando se espera que os relatores possam acelerar os julgamentos das matérias sumuladas, bem como que Seção tenha conseguido se estruturar para auxiliar na preparação de votos envolvendo matérias sumuladas.

É importante ressaltar que a edição de súmulas não é uma medida com resultado de curto prazo, mas a médio e longo prazo.

O sucesso da medida dependerá da sua divulgação e adoção pelos juízes de primeiro grau e, em especial, da conscientização dos relatores de que temas sumulados dispensam fundamentação que vá além daquela necessária a mostrar que a controvérsia se insere na matéria resolvida pela súmula. Se os juízes adotarem as súmulas o Tribunal poderá negar seguimento monocraticamente aos recursos que se voltem contra a matéria sumulada. Nesse caso, não sendo despropositado pensar que o recurso interposto contra matéria sumulada revele litigância de má-fé.

Veja a íntegra das súmulas

Súmula 1: O compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem.

Súmula 2: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.

Súmula 3: Reconhecido que o compromissário comprador tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção.

Súmula 4: É cabível liminar em ação de imissão de posse, mesmo em se tratando de imóvel objeto de arrematação com base no Decreto-Lei nº 70/66.

Súmula 5: Na ação de imissão de posse de imóvel arrematado pelo credor hipotecário e novamente alienado, não cabe, por ser matéria estranha ao autor, a discussão sobre a execução extrajudicial e a relação contratual antes existente entre o primitivo adquirente e o credor hipotecário.

Súmula 6: Os alimentos são sempre devidos a partir da citação, mesmo que fixados em ação revisional, quer majorados ou reduzidos, respeitado o princípio da irrepetibilidade.

Fonte: TJSP, via Newsletter Magister

Nota do blog:
 
Pelo andar da carruagem, muito em breve não se precisará mais consultar leis nem doutrinadores, mas apenas as súmulas dos tribunais para fundamentar as decisões e delas nem recursos serão aceitos. Enquadrou na súmula, fim de processo.  

07 julho 2010

FIM DE EXPEDIENTE

Extraído de Tiras Nacionais


Apesar de todos os pesares é preciso reconhecer que pelo menos o Dieguito, ao contrário de Dunga, realmente mudou o futebol argentino.
Não teve catimba, não teve provocações, não teve violência. O time se comportou muito bem, ganhando ou perdendo e, apesar da goleada sofrida e de toda a tristeza que o abateu manteve a linha, abraçou e beijou os jogadores como sempre e cumprimentou os adversários. Não xingou, não esbravejou nem se descontrolou. Deu de dez a zero em Dunga.   

LEI GAÚCHA CONTRA BULLYNG É PRIMEIRA NO BRASIL

O Rio Grande do Sul é o primeiro Estado no país a ter uma lei para combater o bullying escolar, a humilhação perante colegas por motivo de intolerância.

Já sancionada pela governadora Yeda Crusius (PSDB), a lei obriga escolas públicas e privadas a desenvolver ações permanentes de prevenção a atos de intimidação entre estudantes e de identificação rápida de casos de bullying.

O objetivo da norma é fazer com que as escolas passem a investigar e registrar os casos. A lei considera bullying desde xingamentos até agressões e destruição proposital de pertences da vítima. Não estão previstas punições.

A nova lei foi criada depois de um caso de grande repercussão: a morte do adolescente Matheus Dalvit, vítima de bullying, em maio. Segundo a polícia, a vítima tinha 15 anos e costumava ser hostilizada na escola por estar acima do peso.

O adolescente foi morto com um tiro quando esperava um ônibus, depois da aula, em Porto Alegre. Dois colegas, também menores de idade, foram responsabilizados pelo crime.

Quem pratica bullying pode ser enquadrado penalmente por crimes de intolerância ou por delitos já tipificados no Código Penal, como lesão corporal.

Fonte: Folha OnLine, via Newsletter Magister

OS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA - 2

Parte 2/3



Humberto Theodoro Júnior
Advogado; Professor Titular Aposentado da Faculdade de Direito da UFMG; Desembargador Aposentado do TJMG; Membro da Academia de Direito de Minas Gerais, do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, do Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, do Instituto Brasileiro de Direito Processual, do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual e da International Association of Procedural Law.

6 Competência do Órgão Judicante

Cabe aos Juizados Especiais da Fazenda Pública, respeitadas as regras gerais definidoras da competência de foro, "processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos" (Lei nº 12.153, art. 2º, caput), inclusive aquelas pertinentes às respectivas autarquias, fundações e empresas públicas (idem, art. 5º, II).

Excluem-se, porém, dessa competência, as seguintes causas, nos termos do § 1º do citado art. 2º, todas havidas como de maior complexidade e, portanto, não compatíveis com o procedimento sumaríssimo dos Juizados Especiais:

"I - as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos (6);

II - as causas sobre bens imóveis dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas;

III - as causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções disciplinares aplicadas a militares."

Se a pretensão versar sobre obrigações vincendas, "para fins de competência do Juizado Especial, a soma de 12 (doze) parcelas vincendas e de eventuais parcelas vencidas não poderá exceder o valor referido no caput deste artigo", ou seja, 60 (sessenta) salários mínimos (art. 2º, § 2º).

A proposta legislativa do Deputado Antônio Carlos Valadares destacou que, além dos conflitos entre a Administração e seus servidores, o Juizado Especial da Fazenda Pública será de grande serventia nos pequenos conflitos gerados por impugnações de lançamentos fiscais, como os de IPTU (antes, naturalmente, do ajuizamento da execução fiscal), de cassação ou anulação de multas de trânsito e atos de postura municipal, entre outras demandas, que dificilmente se compatibilizariam com o ônus e custos da justiça ordinária. Aliás, é bom lembrar que a Lei nº 10.259, no campo dos Juizados Especiais Federais, já ressalvava a competência daqueles entes judiciais para conhecer das ações de cancelamento ou anulação dos atos administrativos relacionados com os lançamentos fiscais (art. 3º, § 1º, III) ( 7).

O Projeto aprovado no Congresso previa que ocorrendo litisconsórcio ativo para o limite de sessenta salários, determinado pelo caput e pelo § 2º do art. 2º, seria considerado individualmente por autor (§ 3º). O dispositivo, entretanto, foi objeto de veto presidencial. Considerou-se que grandes litisconsórcios, envolvendo problemas de grupo numeroso de litigantes gerariam complexidade procedimental incompatível com a singeleza e celeridade própria dos Juizados Especiais (8). Assim, os pedidos formulados pelos diversos autores consorciados haverão de ser somados e somente prevalecerá a competência do Juizado Especial se o total não ultrapassar sessenta salários mínimos.

Na verdade, embora o art. 2º cuide basicamente do pequeno valor da causa como o critério geral a observar na definição da competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, a exclusão, ratione materiae, feita em seu § 1º, demonstra que se trata não só de um juízo de pequenas causas, mas também de causas de menor complexidade, devendo as duas condicionantes serem observadas cumulativamente.

7 Legitimação

Conforme dispõe o art. 5º da Lei nº 12.153, que não discrimina entre pessoas físicas e pessoas jurídicas, podem ser partes no Juizado Especial da Fazenda Pública:

"I - como autores, as pessoas físicas e as microempresas e empresas de pequeno porte, assim definidas na LC 123/06 (9);

II - como réus, os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e os Municípios, bem como autarquias, fundações e empresas públicas a eles vinculadas."

Sobre a intervenção de terceiros, observar-se-á o art. 10 da Lei nº 9.099/95, ou seja, apenas o litisconsórcio se apresenta possível no Juizado Especial da Fazenda Pública (10). Quaisquer outras figuras interventivas são excluídas por representarem aumento de complexidade procedimental incompatível com a singeleza que deve prevalecer nos Juizados Especiais.

Quanto ao litisconsórcio, pode ocorrer tanto no polo ativo como no passivo, "tendo em vista que, em princípio, a multiplicidade de sujeitos no polo ativo ou passivo da demanda não reflete na simplicidade, informalidade e celeridade dos Juizados Especiais Cíveis", inclusive quando se trata dos Juizados Especiais Federais (11) e dos Juizados Especiais da Fazenda Pública.

Estabelecido eventual litisconsórcio passivo entre entidades previstas na Lei nº 12.153 e outras previstas na Lei nº 10.259, a competência será do Juizado Especial Federal, e não do Juizado Especial Estadual, dada a exclusividade absoluta da competência da Justiça Federal para julgar todas as causas em que sejam partes a União, entidade autárquica ou empresa pública federal (CF, art. 109, I).

8 Ministério Público

Não há previsão de intervenção do MP no procedimento dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Apenas no incidente de Uniformização de Jurisprudência, o relator, se necessário, ouvirá o MP, no prazo de 5 dias (art. 19, § 3º).

9 Representação das Partes

Sobre a representação das partes no Juizado Especial da Fazenda Pública prevalecem, em princípio, as regras traçadas pelo art. 9º da Lei nº 9.099/95, e pelo art. 10 da Lei nº 10.259/01, quanto aos sujeitos ativos.

Quanto às pessoas jurídicas demandadas, deverão atuar por meio de seus representantes judiciais (CPC, art. 12), aos quais se reconhece o poder de conciliar, transigir ou desistir, nos processos dos Juizados Especiais, nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação (Lei nº 12.153, art. 8º).

Permite o sistema do Juizado Especial, tanto na Justiça Estadual (Lei nº 9.099/95, art. 9º, § 4º) como na Justiça Federal (Lei nº 10.259/01, art. 10) a representação da parte, mediante designação por escrito, por meio de advogado ou não. A regra, porém, não se refere ao exercício do jus postulandi, já que esse é privativo, por lei, do advogado regularmente inscrito na OAB. A representação por leigo é aquela do preposto, cuja atuação se circunscreve à audiência de conciliação, de modo que os poderes conferidos não vão além dos atos negociais de transação, se o representante não for advogado.

Essa preposição processual depende de outorga de poderes específicos para transigir e pode ser conferida a qualquer pessoa de confiança da parte, independentemente de manter, ou não, vínculo empregatício com o outorgante (12).

10 A Presença do Advogado nos Juizados Especiais da Fazenda Pública

A primeira legislação sobre a matéria, a que instituiu os Juizados Especiais Cíveis na Justiça Estadual (Lei nº 9.099/95), previa que o autor estaria autorizado a postular sem a assistência de advogado em causas de valor até 20 salários mínimos, não naquelas que superassem tal limite (art. 9º). Já a Lei nº 10.259/01, que criou os Juizados Especiais Federais, dispensou a presença do advogado, qualquer que fosse o valor da pretensão do autor, desde que compatível com a competência especial do Juizado (art. 10).

A Lei nº 12.153/09 não tem dispositivo referente à matéria, mas manda aplicar subsidiariamente tanto a Lei nº 9.099 como a Lei nº 10.259. Uma vez que a Lei dos Juizados Especiais Federais é mais recente que a dos Juizados Cíveis Estaduais, a participação de advogado nos processos dos novos Juizados Especiais da Fazenda Pública deve-se reger pela Lei nº 10.259, e não pela Lei nº 9.099. Não é só pelo critério cronológico, por si suficiente para dirimir o problema, mas sobretudo pelo critério da similitude (analogia) que se deve dar prevalência à regra traçada para o Juizado Especial Federal. O objeto da Lei nº 12.153 está muito mais próximo do da Lei nº 10.259 do que do da Lei nº 9.099.

Logo, é facultativa a assistência do autor por advogado nos Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito da Justiça Estadual (13).

11 Atos de Comunicação Processual e Prazos

As citações e intimações, nos procedimentos dos Juizados Especiais da Fazenda Pública realizar-se-ão segundo as regras do CPC (Lei nº 12.153, art. 6º). Quer isto dizer que, quanto às intimações dos atos processuais, prevalecerá a regra do que, havendo órgão oficial encarregado da divulgação de tais atos, o procurador da Fazenda estadual ou municipal não será intimado pessoalmente, mas mediante publicação na imprensa (CPC, art. 236). A citação, porém, deverá ser feita com a antecedência mínima de 30 dias da audiência de conciliação (art. 7º).

Os prazos da Fazenda Pública são os mesmos da contraparte. Não prevalecem no Juizado Especial os prazos diferenciados previstos no CPC para as pessoas jurídicas de direito público (art. 7º).

O emprego de meios eletrônicos para as intimações é autorizado pelo art. 8º, § 2º, da Lei nº 10.259, cuja disciplina se aplica também aos Juizados Especiais da Fazenda Pública.

12 Petição Inicial, Citação e Resposta

A petição inicial pode ser formulada oralmente ou por escrito, observadas as regras do art. 14 da Lei nº 9.099/95.

O demandado é citado para comparecer a uma audiência de conciliação, onde deverá, se for o caso, oferecer sua contestação. Em regra, o autor deve ser cientificado da data da audiência no próprio ato do ajuizamento da causa. Se isto não ocorrer, terá de ser intimado consoante as regras comuns do CPC.

A resposta do demandado pode ser, tal como a inicial, formulada por escrito ou por via oral. Nela são admissíveis pedidos contrapostos, independentemente de reconvenção (Lei nº 9.099, art. 17, parágrafo único).

As exceções de suspeição e impedimento seguem as regras comuns do CPC.

13 Audiência de Conciliação

Ao receber a inicial, o Juizado, por seu órgão competente, designará audiência de conciliação, determinando a citação da pessoa jurídica de direito público, em seu representante judicial, de modo que entre o ato citatório e a audiência permeie um prazo de no mínimo trinta dias (Lei nº 12.153, art. 7º).

Quanto ao poder de transigir do representante da Fazenda Pública demandada será aquele conferido pela legislação a que se acha vinculado (14).

Não ocorrendo acordo, o demandado produzirá sua resposta na própria audiência de conciliação, ocasião em que se designará outra audiência para instrução e julgamento, se necessária. É de se julgar imediatamente a causa, ou dentro do menor prazo possível, se não houver provas a produzir que justifiquem a audiência de instrução e julgamento.

14 Instrução Probatória

É dever da entidade ré "fornecer ao Juizado a documentação de que disponha para o esclarecimento da causa, apresentando-a até a instalação da audiência de conciliação" (Lei nº 12.153, art. 9º). Se não o fizer espontaneamente, poderá ser compelida por ordem judicial, deliberada de ofício ou a requerimento do autor.

A prova documental do autor deverá ser produzida com a inicial (CPC, arts. 283 e 396) ou até a audiência de conciliação (Lei nº 9.099, art. 33).

Quanto à prova testemunhal, a Lei nº 12.153 prevê que sua coleta caberá ao juiz que preside a audiência de instrução e julgamento (art. 16, § 2º). Na audiência de conciliação, a lei permite que também o conciliador ouça as partes e testemunhas (art. 16, § 1º). Se esses depoimentos forem julgados suficientes, o juiz dispensará novos testemunhos, desde que não haja impugnação das partes (art. 16, § 2º, in fine).

Dispõe, ainda, o art. 10 da Lei nº 12.153, a propósito da perícia, que o juiz, reconhecendo sua necessidade para a conciliação ou para o julgamento da causa, nomeará pessoa habilitada, encarregando-a de apresentar o laudo até cinco dias antes da audiência. Como se vê, a lei autoriza o juiz a ordenar a perícia até mesmo antes da audiência de conciliação, embora o normal seja fazê-lo dentro daquela audiência e depois de frustrada a tentativa de solução conciliatória. De qualquer maneira, o laudo sempre deverá ser apresentado antes da audiência, seja ela de conciliação ou de instrução e julgamento.

A Lei nº 12.153 evita falar em prova pericial, referindo-se apenas a exame técnico por pessoa habilitada, e não faz menção alguma à possibilidade de as partes formularem quesitos e indicar assistentes técnicos. Certamente o fez para evitar que o procedimento do CPC fosse transplantado para o Juizado Especial da Fazenda Pública, de forma rotineira, o que contrariaria sua índole sumaríssima e informal. Não se pode, entretanto, em nome do contraditório e ampla defesa, recusar às partes o direito de quesitos esclarecedores e a apresentação de parecer técnico obtido extrajudicialmente, quando o esclarecimento da verdade o exigir, a exemplo do que a Lei nº 10.259, art. 12, § 2º, permite, em determinadas hipóteses, nos Juizados Especiais Federais.

15 Sentença e Reexame Necessário

O aperfeiçoamento da decisão da causa depende, no Juizado Especial, de pronunciamento do juiz togado. Mesmo quando a Lei nº 9.099/95, confere poderes ao juiz leigo para redigir a sentença no processo em que a instrução for por ele presidida, esse ato decisório não produz, por si só, o efeito imediato de uma verdadeira sentença. Terá, para tanto, que ser homologado pelo juiz togado, o qual poderá recusar a homologação e proferir outra sentença, em lugar daquela preparada pelo juiz leigo (Lei nº 9.099, art. 40).

Em outros termos, ou a sentença é originariamente prolatada pelo juiz togado ou, sendo preparado pelo juiz leigo, haverá de aperfeiçoar-se pela homologação do juiz togado. A sentença do juiz leigo, portanto, "é sempre ad referendum do juiz togado" (15), a quem a lei reserva a última palavra no julgamento da causa.

Nas causas decididas nos procedimentos do Juizado Especial da Fazenda Pública, mesmo sendo sucumbente o ente público, não há reexame necessário (Lei nº 12.153, art. 11).

Notas do Autor:
6 O fato de o inciso II se referir apenas às demandas sobre direitos "coletivos ou difusos" como excluídas da competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública não importa inclusão das ações coletivas sobre direitos individuais homogêneos na esfera de competência daqueles juizados. Em primeiro lugar porque a ação exercitável perante o Juizado Especial em questão somente pode ter como autor pessoa física, microempresa ou empresa de pequeno porte (Lei nº 12.153, art. 5º, I), entidades que não se legitimam a propor ações coletivas em defesa de direitos individuais homogêneos (CDC, art. 82). Segundo, porque as ações coletivas, quaisquer que sejam elas, revestem-se de complexidade não compatível com o procedimento simples e célere dos Juizados Especiais, razão pela qual não se pode reconhecer como cabíveis naqueles juizados senão as ações singulares.
7 Segundo a Lei nº 12.153, nos Juizados Especiais da Fazenda Pública "será possível ajuizar demandas contra estados e municípios e discutir cobranças de ICMS, IPTU e IPVA, além de multas de trânsito ou ambiental. O valor da causa, no entanto, não pode ultrapassar 60 salários mínimos - em torno de R$ 30 mil" (Adriana Aguiar. Juizados receberão processos tributários. Disponível em: . Acesso em: 12.01.10).
8 As razões do veto ao § 3º do art. 2º foram as seguintes: "Ao estabelecer que o valor da causa será considerado individualmente, por autor, o dispositivo insere nas competências dos Juizados Especiais ações de maior complexidade e, consequentemente, incompatíveis com os princípios da oralidade e da simplicidade, entre outros previstos na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995" (DOU 23.12.09).
9 A Lei nº 12.153 não exige que o autor pessoa física seja maior e capaz. O incapaz, portanto, pode pleitear no Juizado Especial da Fazenda Pública, desde que adequadamente representado.
10 "Todas as espécies de litisconsórcio podem se manifestar nos processos que tramitam nos JEC. O art. 10, in fine, da Lei nº 9.099/95 afirma expressamente ser admissível nesse microssistema processual o litisconsórcio, sem distinção quanto à espécie. Pode, assim, haver litisconsórcio ativo (entre pessoas naturais capazes, microempresas ou empresas de pequeno porte, apenas), passivo ou misto. O litisconsórcio pode ser necessário ou facultativo, unitário ou simples, originário ou ulterior" (CÂMARA, Alexandre Freitas, op. cit., p. 71).
11 FIGUEIRA Jr., Joel Dias. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais. São Paulo: RT, 2006. p. 135.
12 Lei nº 9.099/95, art. 9º, § 4º, com a redação da Lei nº 12.137/09.
13 FERREIRA, Júlio César Cerdeira. Juizados Especiais da Fazenda Pública. Rápidas considerações. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2373, 30 dez. 2009. Disponível em: . Acesso em: 12.01.10.
14 Lei nº 12.153/09: "Os representantes judiciais dos réus presentes à audiência poderão conciliar, transigir ou desistir nos processos da competência dos Juizados Especiais, nos termos e nas hipóteses previstas na lei do respectivo ente da Federação" (art. 8º).
15 FIGUEIRA Jr., Joel Dias, op. cit., p. 251.

Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil nº 34 - Jan/Fev de 2010 e reproduzido no CD Magister 32, abr/maio/2010, de onde foi extraído.

ADVOGADO CATARINENSE OBTÉM INSCRIÇÃO NA OAB SEM EXAME DE ORDEM

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção de Santa Catarina, terá que aceitar a inscrição de um profissional que não apresentou provas de haver concluído, com aproveitamento, o estágio previsto no estatuto da categoria. O advogado já vinha atuando na profissão graças a uma decisão provisória da Justiça.

O Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/94) diz que o estagiário inscrito na OAB “fica dispensado do exame de ordem, desde que comprove, em até dois anos da promulgação desta lei, o exercício e resultado do estágio profissional ou a conclusão, com aproveitamento, do estágio de prática forense e organização judiciária, realizado junto à respectiva faculdade, na forma da legislação em vigor”.

A seccional catarinense da OAB cancelou a inscrição do advogado por entender que ele não havia preenchido os requisitos da lei. Inconformado, o profissional foi à Justiça e conseguiu anular a decisão, obtendo ainda a antecipação de tutela para poder continuar trabalhando. Ao julgar apelação da OAB, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região considerou que "a exigência se restringe à comprovação da realização do estágio profissional, não sendo necessário demonstrar a aprovação em exame final".

Em recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), a OAB-SC sustentou que a comprovação do aproveitamento no estágio deveria ter sido feita segundo as normas de uma resolução sua e de um convênio firmado com a universidade: “Verifica-se, do seu histórico escolar, que o recorrido não preencheu os requisitos do convênio, ou seja, não havia cumprido os semestres curriculares, bem como não há comprovação de que tenha se submetido a exame final de estágio.”

A Primeira Turma do STJ, em decisão unânime, não conheceu da controvérsia levantada pela OAB-SC. “O que se tem, na essência, é uma questão relativa a descumprimento de resolução e de convênio e de falta de prova. Não há uma típica questão envolvendo ofensa direta a lei federal”, afirmou o relator do recurso, ministro Teori Albino Zavascki, para afastar a competência do STJ. Com isso, prevalece a decisão do tribunal de segunda instância, a favor do profissional.

Vide Resp 862959

Fonte: STJ

06 julho 2010

FIM DE EXPEDIENTE - Conto

O SACRISTÃO



Somerset Maugham*


Houvera um batizado aquela tarde, na igreja de São Pedro, e Albert Edward Foreman ainda estava com sua batina de sacristão. Ele reservava sua melhor indumentária do cargo para casamentos e funerais, e a que usava naquele momento era a segunda melhor. Gostava de usar a batina, por ser um digno símbolo das suas funções, e se sentia insuficientemente vestido sem ela. Cuidava do traje com todo carinho, e durante os dezesseis anos no cargo tivera uma série delas, mas nunca fora capaz de jogá-las fora quando desgastadas pelo uso, guardando-as embrulhadas em papel marrom nas gavetas inferiores do guarda-roupa.

Estava esperando apenas o vigário sair, para poder arrumar tudo, trancar a igreja e ir para casa. O vigário passou para o presbitério, fez uma genuflexão diante do altar e começou a caminhar numa das alas de bancos.

— “Que será que ele está procurando? — pensou. — Ele devia perceber que eu tenho de ir para casa tomar o meu chá”.

O vigário era um homem de seus quarenta anos, rosto corado e enérgico, que assumira o cargo recentemente. Albert ainda lamentava a perda do antecessor, um sacerdote da velha escola que pregava seus sermões monotonamente, com voz argêntea, e freqüentemente jantava com seus paroquianos mais aristocráticos. Gostava das coisas assim, não como esse novo vigário, que queria dar palpite em tudo. Mas Albert era tolerante, e nunca se agastava.

A Igreja de São Pedro era muito bem localizada, com paroquianos muito distintos. O novo vigário estivera antes junto a paroquianos de outro nível social, e era natural que demorasse um pouco a se adaptar aos novos.

— “Mudanças assim contundem as pessoas — pensava Albert, — mas ele acabará aprendendo”.

Quando o vigário se aproximou de Albert a ponto de poder falar-lhe no tom de voz baixo adequado ao lugar sagrado, parou e o chamou.

— Foreman, venha comigo à sacristia, que eu preciso conversar um pouco com você.

— Pois não, senhor.

Enquanto caminhavam juntos, Albert comentou:

— Bonito batizado, senhor. E foi muito interessante como a criança parou de chorar exatamente quando o senhor a tomou nos braços.

— Já notei que isso acontece com freqüência. De fato eu consegui boa prática em lidar com bebês.

Albert ficou um tanto surpreso ao encontrar na sacristia os dois conselheiros da paróquia, que ele não vira entrar. Cumprimentou-os cortesmente. Eles ocupavam o conselho há muito tempo, quase tanto quanto o dele como sacristão. Estavam sentados atrás de uma grande mesa, e o vigário ocupou a cadeira vaga entre os dois. Albert sentou-se do outro lado da mesa, enquanto procurava, com certa intranqüilidade, descobrir o que podia ter acontecido. Lembrava-se de quando o organista criou uma encrenca, e dos aborrecimentos que os três tiveram para acertar as coisas. Numa igreja como a de São Pedro não se podiam admitir escândalos. O vigário tinha um ar de benevolência, mas os outros estavam um tanto a contra-gosto.

— “Ele os deve ter repreendido — pensou o sacristão. — Parece que ele os convenceu a fazer alguma coisa, mas não estão gostando nem um pouco”.

— Foreman — começou abruptamente o vigário, — temos algo bem desagradável a comunicar-lhe. Você está aqui há bastante tempo, e estamos de acordo em que vem desempenhando a contento as suas funções — os outros dois assentiram, com uma inclinação da cabeça. — Mas uma informação surpreendente chegou ao meu conhecimento: você não sabe ler nem escrever.

— O vigário anterior sabia disso — replicou Albert sem nenhum embaraço. — Ele me disse que isso não tinha importância, e que para o gosto dele já havia educação em excesso no mundo.

— Isto é a coisa mais espantosa que eu já ouvi — replicou um dos conselheiros. — Quer dizer que você foi sacristão desta igreja dezesseis anos, sem saber ler nem escrever?

— Eu comecei a trabalhar aos doze anos, senhor. O cozinheiro do meu primeiro emprego tentou ensinar-me, mas parece que eu não tinha embocadura para o negócio. E daí para diante, sempre mexendo com uma coisa e outra, não me sobrava tempo. De fato eu nem queria, pois estou cansado de ver essa gente perdendo tempo em ler, quando podia estar fazendo alguma coisa útil.

— Mas você não se interessa em ler os jornais? Nunca quis escrever uma carta?

— Não, senhor. Vivo muito bem sem isso. De uns tempos para cá os jornais trazem fotografias, e assim eu fico sabendo o que acontece por aí. Além disso, a minha mulher é instruída, e escreve todas as cartas de que eu preciso. Não sou nenhum imprestável por isso.

Os dois conselheiros olhavam para o vigário, um tanto perturbados, e depois baixaram os olhos para a mesa.

— Bem, Foreman. Eu discuti o assunto com os conselheiros, e eles concordaram em que numa igreja do porte da nossa não é admissível um sacristão analfabeto. Quero que você compreenda, Foreman, que não tenho nenhuma reclamação contra você, pois tenho em alto conceito o seu caráter e a sua capacidade, além disso você desempenha bem suas funções. Mas não temos o direito de arriscar-nos a que algum acidente possa ocorrer devido à sua lamentável ignorância. É por motivo de prudência, e também por princípio.

— Você não conseguiria aprender, Foreman? — perguntou um dos conselheiros.

— Não, senhor. É muito tarde para isso. Se eu não consegui quando era criança, acho pouco provável que consiga enfiar as letras na cabeça agora.

— Não queremos agir com brutalidade, Foreman, mas os conselheiros e eu já decidimos dar-lhe três meses de prazo. Se até lá você não conseguir, teremos de dispensá-lo.

— Lamento, senhor, mas isso será perda de tempo. Burro velho não pega marcha. Vivi muitos anos sem saber ler e escrever, e modéstia à parte desempenhei bem o meu papel sem isso. Mesmo que eu tivesse condições para aprender agora, não me interessaria nem um pouco.

— Neste caso, Foreman, lamento dizer-lhe que o dispensamos.

— Sim, senhor. Com prazer eu entregarei meu cargo tão logo o senhor contrate um substituto.

Depois que se despediu dos três e fechou atrás de si a porta da sacristia, Albert relaxou o ar de serena dignidade com que suportara o golpe, e seus lábios se contraíram. Pendurou a batina no armário, vestiu o sobretudo e saiu da igreja pensativo. Não tomou o caminho de casa, onde o esperava o seu chá. De coração oprimido, caminhou lentamente, sem saber de momento o que fazer da vida. Não lhe passava pela cabeça voltar à função de mordomo, depois de ser o dono de si mesmo por tanto tempo, pois quem de fato administrava aquela igreja era ele. Tinha economizado bastante, mas não o suficiente para viver sem trabalhar, e além disso a vida estava cada dia mais cara.

Nunca pensara que viria a enfrentar esse problema. Afinal de contas, os sacristães da Igreja de São Pedro eram vitalícios, tanto quanto os Papas. Pensara até nas elogiosas referências que o vigário faria, no sermão seguinte à sua morte, sobre a dedicação e o caráter exemplar do falecido sacristão Albert Edward Foreman. E suspirou profundamente.

Albert não fumava nem bebia. Ou melhor, não em termos tão absolutos. Tomava uma cerveja no jantar, algumas vezes, e fumava um cigarro quando se sentia preocupado ou cansado. Era bem o caso, naquele momento, e como não costumava trazê-los consigo, começou a olhar de um lado e outro daquela rua movimentada, à procura de uma tabacaria. Havia por ali lojas de todos os tipos, mas nenhuma tabacaria. Foi até o fim da rua, e nada.

— “Que coisa estranha!” — pensou.

Para não haver dúvidas, voltou ao início da rua: nenhuma tabacaria.

— “Não é possível que eu seja o único homem, em toda esta rua, que de vez em quando quer dar uma tragada. E acho que um comerciante poderia ter bom lucro com uma loja dessas aqui”.

Albert tomou o caminho de casa, e ia pensando:

— “Estranho, como as idéias ocorrem quando a gente menos espera”.

Em casa, enquanto tomava o chá, a mulher comentou:

— Você está silencioso hoje, Albert.

— Estou pensando.

Examinou os vários aspectos do assunto, e no dia seguinte voltou àquela rua. Encontrou facilmente uma loja adequada, alugou-a, e um mês depois despedia-se do emprego na igreja, iniciando suas novas atividades de comerciante de tabaco e jornaleiro. A mulher o censurou pela queda de status, mas ele argumentou que se deve dançar conforme a música, e que agora ele ia dar a César o que é de César.

Albert saiu-se muito bem. Tão bem que depois de um ano resolveu montar outra loja, a ser confiada a um gerente. Procurou uma rua nas mesmas condições, que também não tivesse tabacaria, e a abasteceu convenientemente. Novo sucesso.

Ocorreu-lhe então que, se podia administrar duas, podia administrar meia-dúzia. E começou a andar pela cidade, à procura de ruas movimentadas desprovidas de tabacarias. Em dez anos, as lojas dele já eram nada menos que dez. Toda Segunda-feira ele as percorria, recolhia a renda e depositava num banco.

Um dia, quando fazia esses depósitos habituais, o funcionário do banco o avisou de que o gerente queria conversar com ele. Foi conduzido a uma sala, onde o gerente o recebeu sorridente:

— Sr. Foreman, gostaria de conversar sobre o seu saldo conosco. O senhor sabe exatamente o montante?

— Não em todos os centavos, mas tenho uma idéia bastante aproximada.

— Sem contar o que o senhor depositou hoje, é um pouco mais de trinta mil libras. É uma quantia muito alta para ficar simplesmente depositada, e eu acho que o senhor poderia lucrar bastante investindo-a.

— Não quero correr riscos, senhor, e prefiro tê-la garantida no banco.

— O senhor não precisa preocupar-se. Forneceremos para sua escolha uma lista de investimentos seguros, com lastro em ouro, que lhe trarão rendimento maior do que o banco pode oferecer.

— Nunca entendi de ações e títulos, e terei de deixar as aplicações para o senhor decidir.

— Não há problema. Tomaremos todas as providências necessárias. Basta o senhor assinar os papéis quando voltar ao banco.

— Está bem, mas como é que eu vou saber o que é que estarei assinando?

— Basta ler o texto dos próprios documentos.

— Acontece, senhor, que isso eu não posso fazer. Pode parecer estranho, mas não sei ler nem escrever, só sei assinar meu nome. E mesmo isso, só porque fui obrigado, quando entrei no ramo de negócios.

O gerente levou um susto tão grande, que saltou da cadeira.

— Isto é a coisa mais extraordinária que eu já ouvi!

— Mas é como eu lhe estou dizendo. Só tive a oportunidade de aprender quando já era bem idoso, e aí eu decidi não tentar. Uma espécie de obstinação.

O gerente olhava-o fixamente, como se fosse um monstro pré-histórico.

— Quer dizer que o senhor montou todo esse seu negócio e juntou uma fortuna de trinta mil libras sem saber ler nem escrever? Santo Deus! Imagino então o que o senhor teria conseguido, se soubesse.

Foreman deu uma gargalhada, e respondeu:

— Isso eu posso lhe dizer, direitinho: Seria sacristão na igreja de São Pedro.

(Somerset Maugham, Collected short stories – Penguin Books, Harmondsworth, 1971)

Extraído do blog Contos bem contados.

*William Somerset Maugham foi um famoso romancista e dramaturgo britânico que nasceu em Paris em 1874 e faleceu em 1965 em Saint-Jean-Cap-Ferrat e era filho de um advogado da embaixada britânica em Paris.

PLANO DE SAÚDE NÃO PODE NEGAR TRATAMENTO A AIDÉTICO

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)  ao julgarResp 650400, reconheceu o direito de um beneficiário a ter todos os gastos com o tratamento da doença pagos pela Amil (Assistência Médica Internacional Ltda.). considerando inválida a cláusula contratual que exclui o tratamento da Aids (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) dos planos de saúde.

O beneficiário contraiu o vírus HIV, sigla em inglês para “Human Immunodeficiency Vírus”, e tentava conseguir que o plano de saúde custeasse seu tratamento. Mas ele faleceu antes da decisão da primeira instância. A ação continuou em razão do espólio do beneficiário.

A sentença julgou improcedente o pedido e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve essa decisão. O tribunal paulista concluiu que, na “data em que incluído o paciente no plano de assistência médica da ré (Amil), 27/4/1990 (...), o contrato já estabelecia exclusão de cobertura para tratamento dos aidéticos”. De acordo com o TJSP, o fato de o beneficiário ser advogado dava a ele condições de determinar o significado e o alcance da cláusula contratual.

No STJ, o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, ressaltou que o entendimento consolidado do Tribunal é de que é abusiva a cláusula que afasta o tratamento de doenças infectocontagiosas de notificação compulsória, a exemplo da Aids. O ministro ainda destacou que a Lei n. 9.656/1998 instituiu a obrigatoriedade do tratamento de enfermidades listadas na classificação estatística internacional de doenças e que a Aids encontra-se nessa relação. Por isso, o ministro aceitou o pedido do espólio do beneficiário.

Aldir Passarinho Junior declarou nula a cláusula contratual que excluía o tratamento da Aids e condenou a Amil a pagar todos os valores gastos e devidos no tratamento de saúde do beneficiário. Em decisão unânime, os ministros da Quarta Turma acompanharam o voto do relator.

Informações do STJ

OS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA - 1

Parte 1/3



Humberto Theodoro Júnior

Advogado; Professor Titular Aposentado da Faculdade de Direito da UFMG; Desembargador Aposentado do TJMG; Membro da Academia de Direito de Minas Gerais, do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, do Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, do Instituto Brasileiro de Direito Processual, do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual e da International Association of Procedural Law.


RESUMO: A Lei nº 12.153/09 determinou a criação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, como órgãos da Justiça Comum e integrantes do sistema já existente dos Juizados Especiais e, subsidiariamente, são regidos pelas disposições do CPC, da Lei nº 9.099/95 e da Lei nº 10.259/01. Como critério geral a observar na definição da competência do Juizado Especial da Fazenda Pública está basicamente o pequeno valor da causa, mas se trata não só de um juízo de pequenas causas, mas também de causas de menor complexidade, devendo as duas condicionantes serem observadas cumulativamente. O Juizado Especial da Fazenda Pública será presidido por um juiz togado, auxiliado por conciliadores e juízes leigos. A presença destes decorre de uma programação constitucional traçada com o nítido propósito de realizar uma justiça coexistencial, onde a tônica se dê sobre a conciliação, a economia processual e a informalidade. Contudo, a sentença do juiz leigo é sempre ad referendum do juiz togado, a quem a lei reserva a última palavra no julgamento da causa. Sendo que, salvo no caso de medidas cautelares e antecipatórias, não cabe recurso contra decisões interlocutórias. Quando recorrível, a decisão interlocutória desafiará agravo de instrumento, observado o procedimento previsto no CPC para essa modalidade recursal. Há regras especiais na Lei nº 12.153, que disciplinam o cumprimento da sentença ou do acordo, nos processos dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, fazendo a necessária diferenciação entre a efetivação das obrigações de fazer, não fazer, entregar coisa certa e de prestar quantia certa (arts. 12 e 13).

PALAVRAS-CHAVE: Juiz Leigo. Advogado. Competência. Obrigação de Fazer. Súmula Vinculante.

1 Introdução

Ao traçar as regras de organização do Poder Judiciário, a Constituição de 1988 determinou que a União e os Estados deveriam criar Juizados Especiais providos de juízes togados e leigos, com competência para "a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade" (art. 98, I). No próprio dispositivo constitucional, ficou determinado que o procedimento a observar nesses Juizados Especiais teria de ser oral, sumaríssimo e desvinculado da hierarquia recursal dos tribunais comuns de segundo grau, cabendo à lei disciplinar as hipóteses de transação e recursos cujo julgamento se daria por turmas de juízes de primeiro grau.

A instituição dos Juizados Especiais, portanto, haveria de se efetivar por meio da legislação infraconstitucional de organização judiciária, de iniciativa da União, no caso da Justiça Federal e Territórios, e de lei estadual, no caso da Justiça dos Estados. Quanto ao processo, porém, somente a lei federal poderia discipliná-lo, em virtude da reserva de competência legislativa prevista no art. 22, I, da CF.

A implantação desses novos órgãos judiciais tem sido feita paulatinamente, a partir da Lei nº 9.099/95, a que se seguiram as Leis ns. 10.259/01 e 12.153/09, tendo todas elas cumprido a missão de regular o processo de prestação jurisdicional dos Juizados Especiais, seja no âmbito das Justiças Estaduais, seja da Justiça Federal. Esta última lei federal completou o ciclo normativo necessário à instalação de mecanismos judiciários idealizados constitucionalmente para facilitar e simplificar o tratamento, na Justiça, das causas menos complexas e de menor valor.

A justificativa para o estabelecimento de uma justiça especial para as causas de pequeno valor e de menor complexidade foi a de que os custos e as dificuldades técnicas do processamento perante a justiça comum provocavam o afastamento de numerosos litígios do acesso à tutela jurisdicional, gerando uma litigiosidade contida não compatível com a garantia de tutela ampla e irrestrita assegurada pela CF (art. 5º, XXXV). Daí a necessidade de criar órgãos e procedimentos desburocratizados e orientados por princípios de singeleza e economia, para que nenhum titular de direitos e interesses legítimos continuasse à margem da garantia fundamental de acesso à justiça.

A primeira lei processual a disciplinar a atuação dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), guardando fidelidade ao norteamento constitucional, cumpriu a tarefa de proclamar os princípios informativos do processo específico sob cuja regência operariam os novos órgãos jurisdicionais. De acordo com seu art. 2º, o processo em questão "orientar-se-á pelos critérios da (I) oralidade, (II) simplicidade, (III) informalidade, (IV) economia processual e (V) celeridade, buscando, sempre que possível, (VI) a conciliação ou a transação".

O ideal, nos Juizados Especiais, é que a palavra falada seja mais usada que a escrita; que a controvérsia seja, sempre que possível, solucionada numa única audiência; que o formalismo seja completamente abandonado, sem prejuízo, é claro, do direito ao contraditório e defesa; que o sistema seja sempre operado de forma a produzir "o máximo de vantagem com o mínimo de dispêndio e energias"; que o processo demore "o mínimo possível", sem prejuízo do equilíbrio entre "os valores da justiça e da celeridade"; que haja uma constante busca da "autocomposição", realizando, sempre que possível, a "justiça coexistencial" tão valorizada por Cappelletti, a qual, na ótica de Alexandre Freitas Câmara, "é essencial para que se obtenha, através da jurisdição, a pacificação social, escopo magno do Estado Democrático" (1).

2 A Instituição dos Juizados Especiais da Fazenda Pública

Com base no art. 98, I, da CF, a Lei nº 12.153/09 determinou a criação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, como órgãos da Justiça Comum e integrantes do sistema já existente dos Juizados Especiais (art. 1º, caput). Com isso, o sistema dos Juizados Especiais dos Estados e do Distrito Federal passou a ser formado por (a) Juizados Especiais Cíveis; (b) Juizados Especiais Criminais e (c) Juizados Especiais da Fazenda Pública (art. 1º, parágrafo único).

Antes da Lei nº 12.153 já existia, no âmbito da União, o Juizado Especial Federal, instituído e regulado pela Lei nº 10.259/01, como órgão da Justiça Federal, com competência para processar, conciliar e julgar causas atribuídas àquela Justiça de valor até sessenta salários mínimos (art. 3º, caput).

A Fazenda Pública estadual e municipal, que estava fora do sistema de Juizados Especiais, passou a nele figurar a partir da Lei nº 12.153/09 (DOU de 23.12.09), com vigência programada para 6 meses após sua publicação.

Diversamente do que ocorre com os Juizados Especiais Federais, onde não se cogita da atuação dos juízes leigos, os Juizados Especiais da Fazenda Pública instituídos pela Lei nº 12.153/09 funcionam com o concurso de juízes togados, juízes leigos e conciliadores, tal como os demais órgãos judicantes que integram o sistema local de Juizados Especiais no âmbito da Justiça dos Estados (art. 15) (2).

3 Disciplina Legal

Regem-se os Juizados Especiais da Fazenda Pública especificamente pela Lei nº 12.153/09. Subsidiariamente, aplicam-se também as disposições do CPC, da Lei nº 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais e Criminais) e da Lei nº 10.259/01 (Lei dos Juizados Especiais Federais), naquilo que, naturalmente, não conflitar com a disciplina traçada pela lei específica.

Pela comunhão de princípios informativos, pela adoção de procedimento sumaríssimo basicamente igual, e pela própria remissão legal feita entre os três diplomas normativos, deve-se reconhecer que todos eles formam uma unidade institucional, isto é, um só estatuto, qual seja, o estatuto legal dos Juizados Especiais brasileiros. Não havendo, portanto, conflito entre regras explícitas, os dispositivos de quaisquer das três leis podem ser aplicados nos procedimentos de qualquer um dos diferentes Juizados.

Além disso, prevê a Lei nº 12.153 que os TJ, o STJ e o STF, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando os procedimentos a serem adotados para o processamento e o julgamento do pedido de uniformização de jurisprudência e do recurso extraordinário, em relação aos casos julgados pelos Juizados Especiais da Fazenda Pública (art. 20).

4 Competência Absoluta

Não vigora para os Juizados da Fazenda Pública a liberdade de opção das partes entre eles e a justiça ordinária. "No foro onde estiver instalado o Juizado Especial da Fazenda Pública, a sua competência é absoluta" (Lei nº 12.153, art. 2º, § 4º) (3), diversamente do regime de livre escolha adotado pela Lei nº 9.099, art. 3º, § 3º, para ingresso da parte na justiça comum ou nos juizados especiais cíveis dos Estados.

A competência absoluta in casu vigora, no entanto, apenas para as causas ajuizadas depois da instalação do juizado especial, de modo que são vedadas as transferências de demandas aforadas anteriormente perante as varas da justiça ordinária (art. 24). Não se aplica, portanto, a regra geral do art. 87 do CPC, que, nos casos de competência em razão da matéria, manda prevalecer sobre os processos em curso a inovação legal superveniente.

A Lei nº 12.153, por outro lado, permite aos Tribunais de Justiça a implantação dos Juizados Especiais com competência temporariamente menor do que a prevista em seu art. 2º. Essa limitação, porém, só deverá prevalecer até cinco anos a partir da entrada em vigor da Lei nº 12.153. A justificativa para a medida será a "necessidade da organização dos serviços judiciários e administrativos" (art. 23). Os Juizados Especiais da Fazenda Pública, porém, deverão ser instalados pelos Tribunais de Justiça no prazo de 2 anos a contar da vigência da Lei nº 12.153 (art. 22).

5 Composição do Órgão Judicante

O Juizado Especial da Fazenda Pública será presidido por um juiz togado, auxiliado por conciliadores e juízes leigos. As respectivas atribuições são as previstas nos arts. 22, 37 e 40 da Lei nº 9.099/95. A presença de conciliadores e juízes leigos não é uma criação do legislador infraconstitucional, decorre de uma programação constitucional (CF, art. 98, I) traçada com o nítido propósito de realizar, por meio dos Juizados Especiais, uma justiça coexistencial, onde a tônica se dê sobre a conciliação, a economia processual e a informalidade. A presença de juízes leigos tende a dinamizar o procedimento, visto que, por obra de gestão da Justiça, a figura clássica e solitária do juiz togado pode desdobrar-se em numerosos juízes não togados dentro do mesmo juízo, cuja quantidade poderá variar sempre em função do volume de causas existentes. Além disso, a presença e a circulação de juízes oriundos do povo permite a internalização no sistema dos Juizados Especiais, de critérios menos frios do que os rigidamente seguidos na Justiça ordinária, facilitando a aproximação dos litigantes para as soluções consensuais e permitindo que as sentenças, quando não obtido o acordo, sejam mais próximas da experiência da vida e dos sentimentos gerais da comunidade (4).

Pena é que, nesses anos iniciais de implantação dos Juizados Especiais, pouca ênfase tem sido dada à integração dos juízes leigos em seus quadros funcionais.

A designação dos conciliadores e juízes leigos far-se-á na forma da legislação dos Estados e do Distrito Federal (Lei nº 12.153, art. 15), observado o seguinte regime:

a) Os conciliadores e juízes leigos são qualificados legalmente como "auxiliares da justiça" (art. 15, § 1º);

b) Os conciliadores não precisam ser, necessariamente, advogados, mas deverão, de preferência, ser recrutados entre bacharéis em direito (§ 1º);

c) Os juízes leigos deverão ser advogados com mais de dois anos de experiência (§ 1º, in fine);

d) Os juízes leigos ficarão impedidos de exercer a advocacia, não em sua plenitude, mas apenas perante os Juizados Especiais da Fazenda Pública, em todo o território nacional, enquanto no desempenho de suas funções (§ 2º);

e) A condução da audiência de conciliação é feita pelo conciliador, sob supervisão do juiz (art. 16), que tanto poderá ser um juiz togado como leigo (Lei nº 9.099/95, arts. 21 e 22);

f) A função do juiz leigo é a prevista na Lei nº 9.099/95 (5).

Notas do Autor:
1 CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 10-25.
2 Embora a Lei nº 10.259/01 não faça qualquer menção à figura do juiz leigo na composição do Juizado Especial Federal, Joel Dias Figueira Júnior é de opinião que não há óbice legal à sua adoção, bastando, para tanto, recorrer à aplicação subsidiária da Lei nº 9.099/95 (Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais. São Paulo: RT, 2006. p. 106-107). Deve-se lembrar, ainda, que a presença de juízes leigos nos Juizados Especiais, qualquer que seja a justiça que venham a integrar, corresponde a um desígnio de origem constitucional (CF, art. 98, I), que não convém ao legislador ordinário desprezar ou ignorar. A verdade, porém, é que nos quase dez anos de operação dos Juizados Especiais Federais não se tem notícia de movimento algum no sentido de dotá-los de juízes leigos.
3 "A competência se diz absoluta quando não pode ser modificada pela vontade das partes, ao contrário da relativa que admite essa modificação" (ALVIM, J. E. Carreira. Juizados Especiais Federais. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 22). Assim, "nos termos do § 3º do art. 3º da Lei nº 10.259/01, no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta, o que significa que não tem o autor, como nos Juizados Especiais Estaduais, o direito de optar pela vara federal comum" (idem, p. 21). O mesmo ocorre em relação aos Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito da Justiça Estadual, visto que a Lei nº 12.153/09, em seu art. 2º, § 4º, adota o mesmo critério de competência absoluta preconizado pela Lei nº 10.259/01 para a Justiça Federal.
4 Para o Deputado Gilberto Nascimento Flávio Dino, "tais atores [conciliadores e juízes leigos] simbolizam a participação popular na administração da justiça, uma das singularidades do Estado Democrático de Direito. A eficiência de sua atuação já restou comprovada pela experiência dos Juizados Especiais Cíveis" (Câmara aprova criação de juizados especiais da Fazenda Pública. Disponível em: . Acesso em: 11.01.10).
5 O juiz leigo pode presidir a audiência, tanto de conciliação como de instrução e julgamento (Lei nº 9.099, arts. 21 e 22). Tendo dirigido a instrução, caberá ao juiz leigo proferir a sentença, a qual será imediatamente submetida ao juiz togado, "que poderá homologá-la, proferir outra em substituição ou, antes de se manifestar, determinar a realização de atos probatórios indispensáveis" (Lei nº 9.099, art. 40). O ato decisório do juiz leigo, portanto, é apenas um esboço de sentença, já que sua eficácia dependerá de homologação do juiz togado.

Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil nº 34 - Jan/Fev de 2010 e reproduzido no CD Magister 32, abr/maio/2010, de onde foi extraído.